O Titanic é a melhor metáfora do Brasil

Ele serve de paradigma para a sociedade brasileira porque nada simboliza com mais fidedignidade a divisão de classes que um navio, que vai do porão aos “decks” superiores elitizados



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Se o Titanic, que foi para o fundo do mar há 100 anos, é a maior metáfora do mundo (Veríssimo), é algo discutível. Já que é a melhor metáfora para o Brasil, parece não haver dúvida. Com uma explicação: o Titanic afundou e já se acabou; o Brasil, com a aparência enganosa de potência mundial (6ª economia do mundo), vai se expandindo economicamente mas, ao mesmo tempo, se exaurindo diariamente com as suas contradições e mazelas, destacando-se o seu pecado original praticado  pela exploração escravagista, com todas as nefastas consequências daí decorrentes, tais como as desigualdades sociais, econômicas e culturais, as discriminações, o autoritarismo, a marginalização de grandes parcelas da população, a violência estrutural, individual e institucional etc.

O Titanic serve de paradigma para a sociedade brasileira porque nada simboliza com mais fidedignidade a divisão de classes que um navio, que vai do porão aos "decks" superiores elitizados. No porão do nosso País, se encontram os excluídos, marginalizados, os descartáveis ou elimináveis.

Aqui ainda não aprendemos – e é por isso que muito sofremos com o medo e a insegurança – que os moradores dos porões detêm o domínio do casco do navio social e planetário, que é único para todos. Sempre que eles "furam" esse casco, naturalmente o risco e a desgraça atingem todos, ou seja, pobres e ricos, pretos e brancos, elite e senzala, pouco importante sua posição dentro do navio. Que o digam os moradores dos grandes centros urbanos (que de urbano tem muito pouco), sendo disso um exemplo paradigmático o luxuoso bairro do Morumbi, na capital de São Paulo, que vive às turras com seus vizinhos pobres, de nada tendo adiantado a construção de uma muralha divisória dos territórios.

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Viver em bairros ricos, mas cercados de miseráveis e marginalizados pela sociedade, é a mesma coisa que estar na primeira classe do "Titanic" durante o seu naufrágio. Quem está nos porões vai "furando" diariamente o casco do navio social (violência, roubos, furtos etc.), porque não conta com muitas alternativas. A cada "furo", mais arrepiada fica a elite escravagista, que reage, por meio da sua polícia, sempre com mais violência. E violência, como sabemos, só gera violência.

Há pouco tempo, falando telepaticamente com um chefe indígena da tribo Tupi, um sobrevivente e historiador dos genocídios portugueses, ele me disse o seguinte: "Enquanto os que comandam o Brasil não admitirem que todos somos seres humanos, que jamais podem ser tratados e reduzidos a coisas ou insetos; enquanto não pedirem desculpas e se reconciliarem com os discriminados, nós não desenterraremos desta terra brasilis a maldição que rogamos em 1500 contra esses exploradores escravagistas, que vivem num dos mais belos paraísos naturais do mundo, mas sem nenhuma tranquilidade nem segurança, ou seja, sem plena civilização".

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O pecado original do escravagismo continua sangrando nosso País que ainda não decifrou o enigma da escolha entre a barbárie ou a civilização?

Luiz Flávio Gomes é professor, jurista e membro da Comissão de Reforma do Novo Código Penal

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