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    Úrsula Vidal

    Jornalista, Secretária de Cultura do Pará e Presidente do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes Estaduais de Cultura

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    Amazônia: tem jeito!

    A Amazônia tem jeito porque a natureza é a solução e nos ensinará o caminho. Ela é sabia e tem sido bem mais que nós esta experiência caminhante sobre a terra que sai da era do tacape para a corrida espacial e continua se comportando de maneira tola, irresponsável e egoísta. Até agora.

    Brasil ameaçado de perder parte da Amazônia (Foto: Foto: Mayke Toscano/Gcom-MT)

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    Amazônia: tem jeito! Úrsula Vidal  Não, nosso desafio não é salvar o planeta. Em bilhões de anos, a terra já passou por 5 hecatombes climáticas e sempre dá seu jeito de manter a vida: esfria, inunda, esquenta e as espécies mais resilientes vão atravessando as eras e batendo cartão no cotidiano da cambiante biodiversidade planetária. 

     Quem está em risco somos nós, bípedes filósofos que adoramos trocar de celular e ainda jogamos latinha de cerveja pela janela do ônibus. Nem todos, evidentemente. Na China, por exemplo - nosso gigante parceiro comercial- , 47% dos consumidores entre 18 e 35 anos decidem suas compras a partir da capacidade de rastreabilidade sócio ambiental dos produtos, segundo pesquisa divulgada pela  ABAG – Associação Brasileira do Agronegócio. Ou seja: não só destinam corretamente seus resíduos sólidos como querem saber de onde vem a carne, o couro e o berro do boi que está na mesa e na vitrine das lojas da moda. E como a Amazônia está sob os olhares atentos do mundo e a política ambiental é hoje ferramenta de acesso aos mercados, é bom enfrentarmos com coragem os desafios colocados para o Brasil e para os Amazônidas.  

    Já entendemos que houve uma mudança de conduta na dinâmica estrutural e simbólica da sustentabilidade. Até algum tempo atrás o compromisso com as boas práticas começava de cima e irrigava para a cadeia produtiva. Agora quem dita a regra do jogo é a ponta: o consumidor.   

    O novo modelo de negócios que já está em curso no mundo vem farejando as rotas de baixo carbono. Começam a perder força no interesse dos grandes investidores do mercado financeiro as atividades produtivas marcadas pelos graves passivos ambientais.  Quem entra em cena com seu charme perfumado de modernidade é a economia circular. Porque é racional e dá lucro. Conceitos como ‘bio economia’ já estão incorporados ao léxico de quem não quer perder o bonde da história, nem o protagonismo na engrenagem que move a economia de grandes países exportadores, como o nosso.  

    Mas pra que o plano dê certo, é preciso levar a sério os protocolos da diplomacia ambiental. Estamos vivendo hoje a maior crise internacional da imagem brasileira da história. Não basta fazer responsavelmente a anamnese do problema, planejar corretamente e aplicar doses significativas de boa vontade política subnacional; é preciso oferecer caminhos para a interlocução internacional. É preciso investimento externo. Se a questão ambiental será a fiadora deste novo modelo de desenvolvimento, então vamos em busca da lição de quem fez o dever de casa direitinho. No auge do ciclo positivo em que chegamos a reduzir em 80% os índices de desmatamento, o Brasil teve resultado comparável ao da Europa inteira. Com as planilhas animadoras embaixo do braço, captamos 1 bilhão de dólares para a agenda da sustentabilidade. Já nossos amigos europeus… Bem, por lá foram captados cerca de 400 bilhões de dólares para que eles dessem o salto quântico que não conseguimos dar. Precisamos embarcar no sonho possível de nossa conversão em territórios de inovação.  

    Porém, nosso desafio não é somente político, mas também de narrativa. Nos últimos 3 meses, ainda de acordo com estudo compartilhado pela ABAG, 200 milhões de pessoas no mundo leram pelo menos 1 notícia negativa em relação ao agro brasileiro. Esta dilaceração do capital político internacional do Brasil já está impactando no ambiente de negócios. Culpa também do fato de que o ‘bom agro’ tem baixa representatividade no Congresso Nacional e nossa política de conservação ambiental vem despencando barranco abaixo. Por isso, tem sentido de urgência recontratar com a sociedade brasileira a agenda ambiental. Garantir apoio efetivo aos territórios da Amazônia, aumentando o capital institucional instalado nos estados. Na Amazônia brasileira  vivem 23 milhões de pessoas. Gente que quer cultivar suas tradições culturais, sua relação com a floresta; gente que quer plantar, criar gado, pescar, produzir, gerar renda. Mas pra que isso ocorra de maneira sustentável é preciso encarar o dragão da barafunda fundiária, encravada neste solo desde os tempos das capitanias hereditárias. No Pará, por exemplo, maior emissor de CO2 da região, o Instituto de Terras – ITERPA tem acumulados na fila de espera mais de 31 mil processos de titulação de terras _ 82% oriundos da agricultura familiar. O desafio do desmatamento (já são 265 mil KM no Pará) e das queimadas (14 mil pontos identificados no Estado) precisa ser encarado de maneira conjunta. Precisamos de aporte rápido e em escala da Policia Federal e da Força Nacional. As imagens de satélite já identificaram que 90% das queimadas estão em São Félix do Xingu, Altamira e Novo Progresso. Um cinturão de ilegalidade que pode ser contido com ações coordenadas, para que não se precipite sobre nós esta crise ambiental gravíssima no próximo período de seca na Amazônia. 

    Mas como a seca não dura pra sempre, tampouco o diluvio de nossos prantos, há boas notícias no horizonte. Esta semana foi aprovado na Câmara dos Deputados o PL do pagamento de Serviços Ambientais, que estava parado desde 2002. Esse ativo é uma potente alavanca para o desenvolvimento da nossa região, que poderá abrir portas e janelas para receber a remuneração pela preservação do estoque florestal. E tá cheio de cliente na fila. O Acordo de Paris colocou no tabuleiro mundial cerca de 33 trilhões de dólares destinados à busca por soluções e compensações ambientais. Só a indústria da aviação vai investir, entre 2022 e 2030, 10 bilhões de dólares em compensações de carbono. A Inglaterra quer zerar suas emissões até 2050; vai de carro elétrico, mudança na matriz energética e disposição para compensar sua pegada onde há crédito de carbono pra vender. E nós estaremos aqui, alegres e organizados levantando a mão altivamente e dizendo: Amazônia, presente! 

    A Amazônia tem jeito porque a natureza é a solução e nos ensinará o caminho. Ela é sabia e tem sido bem mais que nós esta experiência caminhante sobre a terra que sai da era do tacape para a corrida espacial e continua se comportando de maneira tola, irresponsável e egoísta. Até agora. 

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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