Serra completa 70 anos: ame-o ou deixe-o

Favorito na corrida Prefeitura de So Paulo, ex-governador faz aniversrio nesta segunda 19 quando se atira a uma disputa capaz de reergu-lo das cinzas e renovar-lhe o sonho da Presidncia; sem meios termos, ele a encarnao da velha frase da ditadura que combateu

Serra completa 70 anos: ame-o ou deixe-o
Serra completa 70 anos: ame-o ou deixe-o (Foto: Folhapress)


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247 _Marco Damiani – “Vou ser governador ou presidente”. Dita vinte e cinco anos atrás, sem ênfase ou emoção, mas com extrema naturalidade, nos tempos em que era deputado federal constituinte por São Paulo e Fernando Henrique Cardoso ainda não chegara à Presidência da República, a frase de José Serra podia soar como delírio, mas sempre despertou respeito entre os muitos interlocutores que a ouviram. Vinha de um atilado quadro político, que realizara rapidamente, no Brasil pós-anistia, suas primeiras ambições de poder e demonstrara uma surpreendente capacidade de angariar votos. Hoje, ao completar 70 anos de idade nesta segunda-feira 19, já está mais que comprovado que ele não estava blefando.

Mesmo visto como sem carisma pessoal, avesso a arroubos populistas e pouco dado ao corpo a corpo com os eleitores, Serra alcançou não apenas o sonho de governar São Paulo (2007-2010), mas foi secretário de Estado, duas vezes deputado federal, duas vezes ministro, senador e prefeito da maior cidade do País. Ele jamais desistiu, em meio à escalada em zigue-zague, de chegar ao cargo que prometera a si mesmo e ainda lhe falta no currículo. Em 2010, na segunda de suas derrotas nas eleições presidenciais – a primeira fora em 2002 --, muitos acharam que Serra estava apeado definitivamente dos postos mais centrais da politica brasileira, mas em lugar de adeus ele disse um simbólico até breve, e agora mais uma vez cumpre sua própria profecia, voltando a galvanizar as atenções nacionais com sua pré-candidatura a prefeito de São Paulo. Maior favorito, é também o que tem maior rejeição. A exemplo do que vem ocorrendo ao longo de sua carreira, outra vez ele estará entre os que o idolatram e os que o odeiam – afinal, em relação ao inflexível, determinado e ambicioso José Serra não há meios termos. É na base do ame-o ou deixe-o mesmo.

Nos últimos tempos, o número de críticos a ele aumentou. Ter deixado a Prefeitura de São Paulo, em 2006, um ano e dois meses de iniciar o mandato, para concorrer ao governo, e páginas e páginas do livro A Privataria Tucana, do jornalista Amaury Ribeiro Jr., deram munição para que viesse a ser chamado de oportunista e obscuro. No outro prato da balanço, seus admiradores jamais irão se esquecer de sua passagem no Ministério da Saúde, que ele próprio intitula como a melhor gestão que já existiu na pasta, e seu arsenal de conhecimento sobre política econômica e setor público, talvez o mais completo entre os políticos do País. No tocante ao estilo pessoal, quem já não gosta dele critica seu distanciamento do público, com o qual procura evitar um contato maior, mas quem o tem em boa conta vê nisso qualidades de discrição e reserva. Na mídia, alguns jornalistas que ainda conseguem dele longas conversas madrugadas a dentro -- Serra tem a fama, comprovada, de dormir tarde da noite e despachar, quando no poder, em horas inusitadas --, contam com ele como fonte de informações de relevância nacional, mas é certamente maior o cordão dos que acumulam históricos de relacionamento difícil, que geraram, da parte dele, até mesmo pedidos de punições e demissões feitos diretamente a seus patrões. Dentro do PSDB, há quem o aponte como o maior obstáculo à renovação do partido, talvez uma minoria diante dos que veem nele o maior manancial de votos e, portanto, de sobrevivência, da agremiação nos planos municipal, estadual e nacional. Avaliações contraditórias resultantes de uma carreira extensa e intensa.

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Desde cedo ele faz política. Aos 21 anos, foi presidente da União Estadual dos Estudantes (UEE) de São Paulo e, em seguida, às vésperas do golpe militar de 1964, elegeu-se presidente da UNE. Fazia parte da Juventude Universitária Católica (JUC), a esquerda da Igreja, e foi um dos fundadores da Ação Popular (AP), de bandeiras mais radicais. Exilado, teve uma volta clandestina ao País, em 1965, mas precisou retornar ao exterior em razão das perseguições de que foi alvo. Ele escapou por pouco da loucura dos miliares, que detestavam, em especial, líderes estudantis. Com a anistia, em 1979, Serra retornou em definitivo ao Brasil e às suas ligações com as correntes de origem política na Igreja. Chegou já com fama de economista de primeira grandeza. Ex-democrata cristão, o então senador Franco Montoro, eleito pelo MDB, fez dele seu principal quadro técnico. Dos postos primeiro de coordenador do programa de governo e, em seguida, secretário do Planejamento na administração Montoro em São Paulo (1983-1986), Serra mostrou sua face política. No ano final do governo, obteve mais de 200 mil votos para deputado federal e ficou, para sempre, com a fama de trator. Num Estado que praticava uma espécie de voto distrital informal, pelo qual os representantes em Brasília eram eleitos, basicamente, pelos votos de suas regiões de nascimento e maior atuação política, Serra montou um esquema de dezenas de dobradinhas com candidatos fortes a deputado estadual, extraindo votos de centenas de municípios. Muitos se sentiram prejudicados pela estratégia que, afinal, subtraia votos dos candidatos mais tradicionais para jogá-los na cesta do estreante.

O que importava, para Serra, era colocar-se no centro da política paulista e brasileira – e isso, ao custo de muitas inimizades, ele conseguiu. Com seu amigo de exílio Fernando Henrique, fundou o PSDB e foi levado para o governo federal. Como ministro do Planejamento, suas trombadas com o ministro da Fazenda Pedro Malan inviabilizaram sua permanência no cargo. Não fora, porém, abandonado pelo presidente, que mais tarde fez dele seu ministro da Saúde – posto-base para sua primeira tentativa de chegar à Presidência, em 2002.

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Ótimo leitor do quadro político, Serra fez da perda a alavanca para sua candidatura a prefeito de São Paulo, em 2004, e não perdeu a chance, apesar das promessas passadas em cartório, de deixar precocemente a administração municipal em troca de uma fácil vitória para governador, já no primeiro turno de 2006. Dali montou suas baterias para atacar eleitoralmente outra vez a Presidência, mas foi surpreendido pela alta capacidade de Lula em transferir votos para sua candidata Dilma Rousseff e viu-se, pela primeira em anos, sem qualquer mandato eletivo.

O retorno ao piso da política não afetou Serra. Desde o seu até breve, manteve seu partido permanentemente sob tensão em relação à sua volta. A seis dias da data marcada para as prévias tucanas em São Paulo, para as quais não estava inscrito, anunciou que aceitava se candidatar, modificando todo o calendário da agremiação. No próximo dia 25, se a eleição interna finalmente ocorrer, Serra só precisará bater dois adversários partidários que nunca lhe fizeram sombra – o secretário José Aníbal e o deputado Ricardo Trípoli – para reaparecer em triunfo. Já tem, desde logo, o voto declarado do governador Geraldo Alckmin e cerca de 30% das preferências apuradas pelo Instituto Datafolha. Não parece ser desta vez que Serra, como querem os que o odeiam, perderá a parada. E se ganhar, bem ao gosto dos que admiram sua capacidade de trabalho e competência administrativa, todo o quadro político irá experimentar uma estonteante reviravolta. O bicho-papão, então, terá voltado com fome de poder.

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