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Denise Assis

Jornalista e mestra em Comunicação pela UFJF. Trabalhou nos principais veículos, tais como: O Globo; Jornal do Brasil; Veja; Isto É e o Dia. Ex-assessora da presidência do BNDES, pesquisadora da Comissão Nacional da Verdade e CEV-Rio, autora de "Propaganda e cinema a serviço do golpe - 1962/1964" , "Imaculada" e "Claudio Guerra: Matar e Queimar".

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José Múcio, o maneiroso

A jornalista Denise Assis mencionou o projeto Calha Norte, que Múcio quer tirar da Defesa e levar para o Desenvolvimento Regional

José Mucio Monteiro. (Foto: Valter Campanato/Agência Brasil)

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O prestimoso ministro da Defesa, José Múcio, não para de nos surpreender. Quando não está dando um pulinho na Praça dos Três Poderes para assistir a um “piquenique”, está fazendo contas de horas de voo das aeronaves da FAB, a fim de saber se estão ou não muito cansadas para prestar serviço ao país, na terra dos Ianomâmis. Nas horas vagas, permita-se momentos de criatividade, como a última ideia que teve, a de transferir para o ministério do Desenvolvimento Regional o “Projeto Calha Norte”, que desde 1985 - ainda no governo Sarney, quando foi criado -, está sob o guarda-chuva das Forças Armadas.

Olhando de fora, distraidamente, até faz sentido. Claro, para que continuarem tocando um programa de guarnição e melhoria das fronteiras, Norte e Nordeste, levando assistência e expansão das unidades militares, iniciado há 39 anos? Melhor se livrarem dessa “amolação”. Mas há mais detalhes nessa história que só as entrelinhas podem revelar. O Calha Norte passou a ser beneficiado por emendas e ser usado para viabilizar obras em redutos eleitorais de parlamentares da região. O lado politiqueiro – e eles detestam isso -, passou a incomodar os militares, no dizer de Múcio. É aí que entram os seus préstimos, tirando do caminho a ingerência política dos recursos administrados pela pasta. Nada de politicagem!

Então ficamos combinados assim. Mas há mais calha nesse norte, do que pode supor a nossa vã filosofia. Acontece que com a pacificação das Farcs, na Colômbia, e a mudança de governo, a rota do tráfico mudou de rumo e veio deslizar pelas águas do rio Solimões. Tomou os portos do Equador, dali ela salta para o Peru e atravessa toda a Amazônia, dominando os presídios de Belém e Natal, que fazem a ponte para a rota da África e Europa. Com a nova “rota do Solimões”, a situação ficou infernal. E quem quer estar metido nesse vespeiro, não é mesmo? Amigo dos amigos, José Múcio – caso consiga a troca -, mata dois coelhos com uma só paulada.

Tira dos militares a responsabilidade de responder por uma área conflagrada pela baixaria do tráfico, ao mesmo tempo beneficia os amigos do Centrão, reduto de origem do ministro do Desenvolvimento Regional. E quem liga para segurança naquelas lonjuras? Nem é preciso dizer que a ideia luminosa recebeu apoio total do meio militar. Quanto ao ministro Waldez Góes, está para lá de ciente e ansioso para que a coisa aconteça. Ele chegou ao cargo de Desenvolvimento Regional por indicação de Davi Alcolumbre (União-AP). Sim, ele mesmo, o ex-presidente do Senado, que não pensa em outra coisa se não voltar ao cargo, sob as bênçãos de Rodrigo Pacheco, o atual presidente do Congresso.

A pasta do ministro Góes tem orçamento de R$ 5,4 bilhões, mas se herdar o Calha Norte, será reforçada por uma enxurrada de recursos. E ao mesmo tempo em que os militares saem da “roubada” de se defrontar com as escaramuças da nova rota do tráfico, Múcio ainda proporciona aos amigos do Centrão a visibilidade que só as verbas públicas dão a quem quer se mostrar para os diletos eleitores.

A notícia circulou com exclusividade em O Globo no final de semana. Não teve, contudo, maiores desdobramentos. Assim, sem marola, a vida de José Múcio segue entre uma entrevista e outra, com algum puxão de orelhas no meio. Nesta semana teve que se ver com o ministro da Casa Civil, Rui Costa, que lhe pediu explicações sobre a “não expedição” de um grupo de ministros às terras Ianomâmis, em aeronaves da FAB. A Defesa não quis emprestar um dos seus aviões para levá-los até a aldeia, com o socorro em alimentos e remédios para as crianças indígenas. Mas, como gratidão é um sentimento que às vezes pode cegar, o ministro segue explicando daqui e dali, as suas atitudes. No fim, tudo acaba em bolero.

Para alguns deputados que costumam negociar com a pasta da Defesa, o programa Calha Norte roda bem e a mudança não será positiva. Mas, há os que veem nele uma oportunidade tão boa quanto a Codevasf, onde vários políticos se aninharam e ecanalizam verbas para os seus redutos eleitorais com facilidade. O Calha Norte, nascido para levar infraestrutura para as áreas de fronteira, hoje está em regiões que nada tem a ver com elas, como o Tocantins, por exemplo.

A mudança, porém, pode ter tudo a ver com a disputa que se avizinha, para a presidência do Senado. Múcio, à base do dois para lá, dois para cá, se for bem-sucedido na manobra, agradaria às três Forças e, ao mesmo tempo, propiciaria a Davi Alcolumbre grande destaque entre os congressistas. Satisfeitos com o novo manancial de verbas, na hora certa serão agradecidos e poderão reconduzi-lo ao cargo. É mesmo muito maneiroso, esse José Múcio.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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