
Com Bolsonaro réu, chega mais perto o esperado momento de sua prisão
A marcha da Justiça deve fazer valer, afinal, a lei e virar, quem sabe para sempre, a página dessa extensa crônica golpista
26 de março de 2025. Nesta data, pela primeira vez na história do Brasil, lideranças civis e altos escalões militares, participantes de um golpe de Estado, passaram a ser oficialmente acusados em um processo judicial com chances reais de condenação à prisão.
Nesta data, Jair Bolsonaro passou a ser réu junto a outros sete acusados. Foi o que decidiu, por unanimidade, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal.
Num país tão marcado por intervenções militares ao longo de sua história, chefes militares golpistas foram enviados ao banco dos réus.
Parece a aproximação de um desejo longamente acalentado.
Neste primeiro grupo de oito acusados, considerado "crucial", viraram réus o general Braga Netto (ex-ministro da Casa Civil e da Defesa), o almirante Almir Garnier (ex-comandante da Marinha), o general Paulo Sérgio Nogueira (ex-comandante do Exército e ex-ministro da Defesa), o general Augusto Heleno (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional) e o tenente-coronel Mauro Cid (ex-ajudante de ordens de Bolsonaro). A eles se juntam Alexandre Ramagem (ex-diretor da Abin) e Anderson Torres (ex-ministro da Justiça). Outras levas de acusados, com expressiva presença de hierarcas militares, serão objeto de decisões equivalentes do Supremo no futuro próximo.
A decisão dos ministros da Suprema Corte, ainda inicial, embora seja apenas um princípio, já constitui per se um avanço democrático de relevância simplesmente espetacular.
Ela está escorada em investigações científicas repletas de provas colhidas com excelência pela Polícia Federal, as quais ensejaram denúncia aguda do procurador-geral da República, Paulo Gonet, e um voto cabal do ministro-relator, Alexandre de Moraes, seguido pelo restante dos ministros.
Agora, recebida a denúncia, começa a fase de exame detalhado de provas e audição criteriosa de acusados e testemunhas, assegurado amplo direito de defesa aos réus.
A transformação de Bolsonaro e seus asseclas em réus trouxe de volta à memória, inclusive em vídeo exibido por Moraes durante seu voto, o pesadelo da escalada golpista, fustigada criminosamente por Bolsonaro desde 2021 até o desfecho fatídico em 8 de janeiro de 2023. A denúncia do Ministério Público não recuou diante de fatos escabrosos. Entre as acusações que deverão ser examinadas em detalhes estão incluídos estarrecedores intentos do grupo golpista de assassinato do presidente Lula, do vice Geraldo Alckmin e do próprio relator dos processos, o ministro Alexandre de Moraes.
Não há dúvida de que Bolsonaro, como diz a denúncia lapidar do procurador-chefe, Paulo Gonet, é o chefe da organização criminosa, engendrada para servir a seus desígnios. O Ministério Público indicou intenções, métodos, hierarquias e crimes que incluíam, como se vê, violência e morte de adversários.
O que se queria era golpear um presidente eleito nas urnas e implantar de volta uma ditadura, evidentemente militar. Corroborando a denúncia e o voto de Moraes, a ministra Cármen Lúcia sintetizou de forma notável a intentona e a reação que ela suscita: "A ditadura mata".
Julgar e condenar Bolsonaro exemplarmente constitui uma obrigação irrecusável da Justiça diante da nação. Que venha uma sentença profilática e pedagógica. Um veredito justo trará consigo a força de alterar a crônica secular de golpes que tantas vezes sacudiram o país, desde o período monárquico até muito recentemente.
O julgamento que agora começa também poderá apurar que instâncias foram responsáveis por frustrar a intentona. Uma tal apuração pode também ser valiosa para apontar atitudes exemplares que possam servir como referência democrática no interior das Forças Armadas.
Bolsonaro réu instaura um salto de qualidade na história e na conjuntura. Já se nota que atores políticos e setores da mídia hegemônica se reposicionam para tentar isentar ou mitigar a situação do acusado odioso.
Este propugna uma "anistia" enquanto tenta vender uma ideia como sendo uma banalidade suas ofertas de "exame de dispositivos constitucionais", estado de defesa, de sítio, artigo 142, GLO, feitas aos comandantes militares e ao alto comando do Exército.
A hora se aproxima. O país passou por uma quadra da maior gravidade. Agora, a marcha da Justiça deve fazer valer, afinal, a lei e virar, quem sabe para sempre, a página dessa extensa crônica golpista. Sem anistia, ou seja, com Jair Bolsonaro na cadeia.
