Rodrigues Alves não morreu de gripe espanhola
"Dois jornalistas que eu admiro muito – Elio Gaspari e Ruy Castro – divergiram, há algumas semanas acerca da doença que impediu Rodrigues Alves, já presidente eleito, de assumir a presidência da República pela segunda vez, em 1918, em plena gripe espanhola", diz Alex Solnik, do Jornalistas pela Democracia. "Resolvi dar um mergulho na coleção de jornais da Biblioteca Nacional"
Por Alex Solnik, do Jornalistas pela Democracia
Dois jornalistas que eu admiro muito – Elio Gaspari e Ruy Castro – divergiram, há algumas semanas acerca da doença que impediu Rodrigues Alves, já presidente eleito, de assumir a presidência da República pela segunda vez, em 1918, em plena gripe espanhola, em razão do que o país foi governado por um sujeito tido à época como matusquela.
Para dirimir essa dúvida e conhecer e entender um pouco mais aquele período tão sombrio e tão perturbador quanto esse pelo qual estamos passando, resolvi dar um mergulho na coleção de jornais da Biblioteca Nacional, tendo encontrado no diário “A Noite” a cobertura mais completa, do início ao fim, daquela pandemia, que foi chamada pela imprensa de “gripe espanhola”, “Peste de Dakar” ou “Mal de Seidl”.
A primeira notícia, de 23 de setembro de 1918, relata ocorrência em Dakar, no Senegal, com militares da marinha brasileira a caminho da guerra na Europa:
“A desgraça que abateu sobre a divisão brasileira de guerra” informa a manchete.
“A impressão é de profunda dor causada pelo desaparecimento, de uma maneira tão imprevisível, de tantas existências em flor”.
“Primeiro-tenente Eugenio Muniz Freire; Segundos –Tenentes engenheiros maquinistas Raul de Mattos Costa e Cesar Seabra Muniz; sub-oficial Álvaro Luiz Fernandes; Segundo-Tenente engenheiro maquinista Oldemar Ramos e capitão tenente médico Pedro Monteiro Godim Jr.”.
“As providências para evitar que a peste irrompa no Rio”.
A manchete do dia seguinte é: “É preciso afastar o perigo que nos ameaça”.
No dia 28 de setembro o jornal informa a chegada ao porto do Rio de Janeiro do vapor “Corcovado”, com 35 passageiros que ficaram doentes a bordo depois de embarcarem em Dakar.
No dia 2 de outubro a notícia é a chegada do vapor “Alepo”, de bandeira inglesa, com três doentes a bordo.
O principal assunto da edição de 7 de outubro é a entrevista com Delfim Moreira, vice-presidente eleito cuja posse está marcada para 15 de novembro e que tem chance de ser o próximo presidente, já que o titular, Rodrigues Alves, não está com boa saúde.
“Lá no Rio tem se dado curso a boatos malévolos com relação à sua pessoa” diz o jornalista “e resolvemos vir aqui tentar qualquer declaração de V. Ex. no sentido de desfazê-los”.
“Não vale a pena. A imprensa não devia aceitar essas coisas. Ora – continuou S. Ex. sorrindo (o que não era seu feitio) – dizem que eu estou louco. Veja o senhor que absurdo! Não há na minha família nenhum louco”!
8/10: A principal reportagem se chama “A epidemia na Vila Militar”. “Há 249 enfermos”. “Cento e tantos gripados no Hospital do Exército”.
9/10: “Quase todos os corpos da 3ª região estão atacados. Há gripados em todos os corpos da terceira divisão do Exército. 392 estão no hospital”.
“A epidemia tem caráter benigno”.
10/10: “Novos e numerosos casos nesta capital”. “De ontem para hoje elevou-se o número de casos no Hospital Central do Exército. No total, 494 gripados. Nenhum caso fatal”.
O Dr. Garfield de Almeida, diretor do Hospital S. Sebastião comunica que “no dia 4 deram entrada quatro doentes desembarcados do vapor inglês ‘Alepo’. Entre os dias 6 e 8 entraram 12 doentes, sendo nove moradores desta cidade”.
11/10: “A epidemia alastra-se por toda a cidade, mas com caráter benigno, principalmente nos quartéis, fábricas e casas de habitação coletiva e entre choferes, motorneiros e carroceiros”.
12/10: “Um horror a bordo do ‘Highland Loch’”. “Novos e numerosos casos registrados hoje. Nenhum caso fatal”.
13/10: Morre aluno do Colégio Militar, Mauro Soares, aos 13 anos.
14/10: “A vida na cidade perturbada”. “Há milhares de casos”. “Poucos fatais”.
“Faltaram hoje ao serviço centenas de empregados de bancos, estando os trabalhos anormalisados com a ausência de seus funcionários”.
“Nos estabelecimentos comerciais as baixas têm sido grandes, havendo-se até registrado o fechamento de alguns por falta de empregados, como também de patrões”.
15/10: A manchete em letras garrafais resume-se a uma palavra: “O Mal”.
“A população apreensiva. É desolador o aspecto da cidade. Estabelecimentos que se fecham. Escolas, teatros, cinemas, fábricas. As ruas apresentam muito menor movimento. Vai aumentando sempre o número dos ‘espanholados”. “Os casos fatais vão também aumentando e alguns de marcha rápida”.
16/10: A doença recebe nova definição: “A Pandemia”.
“Ainda um dia calamitoso”.
“Os clínicos não podem atender a todos os chamados”.
17/10: “A Pandemia”.
“A cidade toma um alento”.
“O mal propaga-se pelo interior”.
18/10: “A epidemia”.
“A vida da cidade continua anormalisada”.
“Não se sabe mais por onde anda a alma da cidade, desaparecida das ruas, ermas e tristes. O que se vê é um transeunte que vai aspirando seu frasquinho de sal; alguns bondes com meia dúzia de passageiros, os galões de algum caixão de defunto que se equilibra na cabeça de um carregador”.
“Carlos Seidl pede demissão da Saúde Pública”. (Não havia ministério da Saúde, era cargo equivalente ao de ministro).
19/10: “O governo determina novas providências”.
“O governo decretou feriado de 19 a 22 de outubro”.
“Com o fechamento geral, em virtude do decreto de ontem, o movimento foi quase nulo”.
“Falta absoluta de pão”.
“As galinhas desaparecem do mercado”.
20/10: “O número de óbitos aumentou ontem e bastante”.
“Permanece a situação de pânico”.
“O grande flagelo faz novas vítimas”.
“A horrível dificuldade para comprar-se um frango”.
“Insepulto há quatro dias”.
“Com medo de morrer passou a navalha no pescoço”.
21/10: “O flagelo continua fazendo vítimas”.
“Se não piorou, também não melhorou”.
“Espera-se com uma passividade ‘fakiriana’ que a febre, quando não tiver mais ninguém para atacar ou matar, se retire espontaneamente”.
“O Sr. Bulhões, chefe do Comissariado, requisita leite condensado e canela”.
22/10: “A população só confia na bondade da Divina Providência”.
24/10: “A cidade apresenta hoje um aspecto mais animador”. “Nos subúrbios o obituário ainda é grande”. “A epidemia declina? Parece que sim”.
25/10: “A população continua a ser dizimada”. “Ainda hoje muito avultado o número de óbitos”.
26/10: “Ainda é muito séria a situação epidêmica”. (Dr. Carlos Chagas, novo chefe da Saúde Pública).
27/10: “A peste continua a ceifar centenas de vítimas diárias”.
“Chovem reclamações contra a distribuição das galinhas”.
A coluna “Ecos e Novidades”, à página 2, informa que “não morreu nenhum senador, nenhum magistrado, não morreu nenhum velho conhecido. Rodrigues Alves e Rui Barbosa restabeleceram-se depressa. É uma doença que ataca e mata as pessoas de menos de 40 anos de idade”.
Na secção de classificados este anúncio sob o título “Lutos”:
“Ternos para luto sob medida em 24 horas. Enviam-se amostras e contramestres a domicílio. Rua do Ourives, 35”.
28/10: “A epidemia diminui o número de casos fatais”. “O movimento na cidade foi quase normal”. “Os cinemas começam a se reabrir”.
29/10: “A cidade convalesce... agora é evitar a recaída”. “O furacão ainda não passou”. “As casas comerciais fizeram hoje seus primeiros negócios desde de 15 dias de paralisação completa”.
30/10: “Diminui o número de casos novos”.
31/10: “Ensaios clínicos para cura da peste”.
01/11: “Acentua-se o declínio da peste”.
“Impressões da Santa Casa. Alta a doentes que se arrastam. Uma menina morre de sede. A repulsão do povo pelo hospital macabro”.
02/11: “Nunca o dia dos mortos foi tão propriamente um dia dos mortos como o de hoje”.
Considerações do Dr. Dr. Julio Novaes sobre “a doença dos moços”:
“É preciso proibir as reuniões e aglomerações”.
“Os velhos ficam poupados quase sempre”.
“Apenas 22 casos novos”.
03/11: “Somente 17 casos novos”.
“O atual surto é uma consequência da guerra” (Dr. H. Aragão, do Instituto Oswaldo Cruz).
“Durante dois ou três meses o índice epidêmico e a letalidade no Rio permanecerão acima do normal” (Dr. Carlos Chagas).
04/11: “Um único caso novo”!
“Gripados que enlouquecem. O nacional Joaquim Leite, morador à rua do Mirante, em Santa Cruz, foi atacado há dias pela gripe. Na madrugada de hoje, devido ao excesso de febre, enlouqueceu”.
“A cidade voltou ao normal”.
05/11: “O declínio da epidemia”.
“O número de óbitos diários diminui de 101 nas últimas 48 horas e o total de sepultamentos decresce 40%”. (Ministério do Interior).
“É preciso evitar a invasão do cólera”.
06/11: “A cidade normalisa-se”.
“Libertando-se da ação nefasta da epidemia”.
07/11: “O aspecto da cidade já é quase completamente normal”.
“O medo e as angústias já passaram a não ser para quem tem um ente querido de cama”.
08/11: “Defendamo-nos contra o cólera”.
“Quantas mortes pela epidemia no Rio”?
14/11: “Que o sr. Rodrigues Alves não tomará posse amanhã é um fato; que o seu estado é gravíssimo é um boato que toma corpo”.
19/11: “O furacão da desgraça desabou sobre S. Paulo”. “Muitas casas comerciais fechadas por causa da gripe”. “Morre muito mais gente do que se diz”. “Diziam que só na Força Pública num só dia faleceram 400 praças devido a uma injeção de experiência do Dr. Vital Brasil, mas era boato; morreram 24”.
21/11: A metade superior da capa está ocupada por dezenas de fotos sob o título “As principais vítimas da gripe”. O texto explica: “Com os nossos serviços desorganizados e com a redução do número de páginas a que fomos forçados tornou-se impossível fazer acompanhar de retratos notícias da morte de todas as pessoas conhecidas vítimas da epidemia”.
“A influenza espanhola ainda não está extinta, nem poderia estar”.
24/11: “Foi solene a missa em ação de graças pelo restabelecimento do sr. Senador Paulo de Frontin. O senador compareceu ao ato”.
08/12: “A mortalidade da gripe nos dias calamitosos de outubro. Só 14.104 óbitos”?
“Lamentável desordem dos serviços de registro”.
“É indubitável que ainda são muitos os nossos casos de gripe”.
“Provável recrudescimento do mal”.
10/12: O presidente eleito Rodrigues Alves sai de seu casarão de Guaratinguetá (SP) e chega, de trem, ao Rio.
“Os médicos disseram que eu viesse para cá onde melhor me fortaleceria com esses lindos passeios” diz ele ao jornal.
Mas não há data marcada para sua posse. Delfim Moreira segue no poder.
03/01/1919: “Mais vão se acentuando boatos em torno da crise política criada pelo estado de saúde precário do sr. Conselheiro Rodrigues Alves. Resolução em 48 hs. Renúncia”? A família nega visita de médicos e o chama de “futuro presidente”.
04/01: “O eterno segredo”.
“O palacete mais célebre atualmente no Brasil”. Foto do Palacete da Rua Vergueiro, residência de Rodrigues Alves no Rio.
“Falar ao conselheiro? Impossível. Altos figurões não o conseguem”.
“Quando acabará isto”?
15/01: “O sr. Rodrigues Alves piora”. “É acometido de nova e mais grave crise”. “A crise da doença se acentua. É igual àquela que sofreu há seis anos”.
16/01: “O termo de uma grande existência”. Rodrigues Alves morre aos 70 anos.
28/01: “Cuidado com ela”. “O mal pode voltar”. “Matou seis milhões no mundo nas últimas 12 semanas”.
“A espanhola mata mais que a guerra”.Rodrigues Alves não morreu de gripe espanhola
Dois jornalistas que eu admiro muito – Elio Gaspari e Ruy Castro – divergiram, há algumas semanas acerca da doença que impediu Rodrigues Alves, já presidente eleito, de assumir a presidência da República pela segunda vez, em 1918, em plena gripe espanhola, em razão do que o país foi governado por um sujeito tido à época como matusquela.
Para dirimir essa dúvida e conhecer e entender um pouco mais aquele período tão sombrio e tão perturbador quanto esse pelo qual estamos passando, resolvi dar um mergulho na coleção de jornais da Biblioteca Nacional, tendo encontrado no diário “A Noite” a cobertura mais completa, do início ao fim, daquela pandemia, que foi chamada pela imprensa de “gripe espanhola”, “Peste de Dakar” ou “Mal de Seidl”.
A primeira notícia, de 23 de setembro de 1918, relata ocorrência em Dakar, no Senegal, com militares da marinha brasileira a caminho da guerra na Europa:
“A desgraça que abateu sobre a divisão brasileira de guerra” informa a manchete.
“A impressão é de profunda dor causada pelo desaparecimento, de uma maneira tão imprevisível, de tantas existências em flor”.
“Primeiro-tenente Eugenio Muniz Freire; Segundos –Tenentes engenheiros maquinistas Raul de Mattos Costa e Cesar Seabra Muniz; sub-oficial Álvaro Luiz Fernandes; Segundo-Tenente engenheiro maquinista Oldemar Ramos e capitão tenente médico Pedro Monteiro Godim Jr.”.
“As providências para evitar que a peste irrompa no Rio”.
A manchete do dia seguinte é: “É preciso afastar o perigo que nos ameaça”.
No dia 28 de setembro o jornal informa a chegada ao porto do Rio de Janeiro do vapor “Corcovado”, com 35 passageiros que ficaram doentes a bordo depois de embarcarem em Dakar.
No dia 2 de outubro a notícia é a chegada do vapor “Alepo”, de bandeira inglesa, com três doentes a bordo.
O principal assunto da edição de 7 de outubro é a entrevista com Delfim Moreira, vice-presidente eleito cuja posse está marcada para 15 de novembro e que tem chance de ser o próximo presidente, já que o titular, Rodrigues Alves, não está com boa saúde.
“Lá no Rio tem se dado curso a boatos malévolos com relação à sua pessoa” diz o jornalista “e resolvemos vir aqui tentar qualquer declaração de V. Ex. no sentido de desfazê-los”.
“Não vale a pena. A imprensa não devia aceitar essas coisas. Ora – continuou S. Ex. sorrindo (o que não era seu feitio) – dizem que eu estou louco. Veja o senhor que absurdo! Não há na minha família nenhum louco”!
8/10: A principal reportagem se chama “A epidemia na Vila Militar”. “Há 249 enfermos”. “Cento e tantos gripados no Hospital do Exército”.
9/10: “Quase todos os corpos da 3ª região estão atacados. Há gripados em todos os corpos da terceira divisão do Exército. 392 estão no hospital”.
“A epidemia tem caráter benigno”.
10/10: “Novos e numerosos casos nesta capital”. “De ontem para hoje elevou-se o número de casos no Hospital Central do Exército. No total, 494 gripados. Nenhum caso fatal”.
O Dr. Garfield de Almeida, diretor do Hospital S. Sebastião comunica que “no dia 4 deram entrada quatro doentes desembarcados do vapor inglês ‘Alepo’. Entre os dias 6 e 8 entraram 12 doentes, sendo nove moradores desta cidade”.
11/10: “A epidemia alastra-se por toda a cidade, mas com caráter benigno, principalmente nos quartéis, fábricas e casas de habitação coletiva e entre choferes, motorneiros e carroceiros”.
12/10: “Um horror a bordo do ‘Highland Loch’”. “Novos e numerosos casos registrados hoje. Nenhum caso fatal”.
13/10: Morre aluno do Colégio Militar, Mauro Soares, aos 13 anos.
14/10: “A vida na cidade perturbada”. “Há milhares de casos”. “Poucos fatais”.
“Faltaram hoje ao serviço centenas de empregados de bancos, estando os trabalhos anormalisados com a ausência de seus funcionários”.
“Nos estabelecimentos comerciais as baixas têm sido grandes, havendo-se até registrado o fechamento de alguns por falta de empregados, como também de patrões”.
15/10: A manchete em letras garrafais resume-se a uma palavra: “O Mal”.
“A população apreensiva. É desolador o aspecto da cidade. Estabelecimentos que se fecham. Escolas, teatros, cinemas, fábricas. As ruas apresentam muito menor movimento. Vai aumentando sempre o número dos ‘espanholados”. “Os casos fatais vão também aumentando e alguns de marcha rápida”.
16/10: A doença recebe nova definição: “A Pandemia”.
“Ainda um dia calamitoso”.
“Os clínicos não podem atender a todos os chamados”.
17/10: “A Pandemia”.
“A cidade toma um alento”.
“O mal propaga-se pelo interior”.
18/10: “A epidemia”.
“A vida da cidade continua anormalisada”.
“Não se sabe mais por onde anda a alma da cidade, desaparecida das ruas, ermas e tristes. O que se vê é um transeunte que vai aspirando seu frasquinho de sal; alguns bondes com meia dúzia de passageiros, os galões de algum caixão de defunto que se equilibra na cabeça de um carregador”.
“Carlos Seidl pede demissão da Saúde Pública”. (Não havia ministério da Saúde, era cargo equivalente ao de ministro).
19/10: “O governo determina novas providências”.
“O governo decretou feriado de 19 a 22 de outubro”.
“Com o fechamento geral, em virtude do decreto de ontem, o movimento foi quase nulo”.
“Falta absoluta de pão”.
“As galinhas desaparecem do mercado”.
20/10: “O número de óbitos aumentou ontem e bastante”.
“Permanece a situação de pânico”.
“O grande flagelo faz novas vítimas”.
“A horrível dificuldade para comprar-se um frango”.
“Insepulto há quatro dias”.
“Com medo de morrer passou a navalha no pescoço”.
21/10: “O flagelo continua fazendo vítimas”.
“Se não piorou, também não melhorou”.
“Espera-se com uma passividade ‘fakiriana’ que a febre, quando não tiver mais ninguém para atacar ou matar, se retire espontaneamente”.
“O Sr. Bulhões, chefe do Comissariado, requisita leite condensado e canela”.
22/10: “A população só confia na bondade da Divina Providência”.
24/10: “A cidade apresenta hoje um aspecto mais animador”. “Nos subúrbios o obituário ainda é grande”. “A epidemia declina? Parece que sim”.
25/10: “A população continua a ser dizimada”. “Ainda hoje muito avultado o número de óbitos”.
26/10: “Ainda é muito séria a situação epidêmica”. (Dr. Carlos Chagas, novo chefe da Saúde Pública).
27/10: “A peste continua a ceifar centenas de vítimas diárias”.
“Chovem reclamações contra a distribuição das galinhas”.
A coluna “Ecos e Novidades”, à página 2, informa que “não morreu nenhum senador, nenhum magistrado, não morreu nenhum velho conhecido. Rodrigues Alves e Rui Barbosa restabeleceram-se depressa. É uma doença que ataca e mata as pessoas de menos de 40 anos de idade”.
Na secção de classificados este anúncio sob o título “Lutos”:
“Ternos para luto sob medida em 24 horas. Enviam-se amostras e contramestres a domicílio. Rua do Ourives, 35”.
28/10: “A epidemia diminui o número de casos fatais”. “O movimento na cidade foi quase normal”. “Os cinemas começam a se reabrir”.
29/10: “A cidade convalesce... agora é evitar a recaída”. “O furacão ainda não passou”. “As casas comerciais fizeram hoje seus primeiros negócios desde de 15 dias de paralisação completa”.
30/10: “Diminui o número de casos novos”.
31/10: “Ensaios clínicos para cura da peste”.
01/11: “Acentua-se o declínio da peste”.
“Impressões da Santa Casa. Alta a doentes que se arrastam. Uma menina morre de sede. A repulsão do povo pelo hospital macabro”.
02/11: “Nunca o dia dos mortos foi tão propriamente um dia dos mortos mo o de hoje”.
Considerações do Dr. Dr. Julio Novaes sobre “a doença dos moços”:
“É preciso proibir as reuniões e aglomerações”.
“Os velhos ficam poupados quase sempre”.
“Apenas 22 casos novos”.
03/11: “Somente 17 casos novos”.
“O atual surto é uma consequência da guerra” (Dr. H. Aragão, do Instituto Oswaldo Cruz).
Durante dois ou três meses o índice epidêmico e a letalidade no Rio permanecerão acima do normal” (Dr. Carlos Chagas).
04/11: “Um único caso novo”!
“Gripados que enlouquecem. O nacional Joaquim Leite, morador à rua do Mirante, em Santa Cruz, foi atacado há dias pela gripe. Na madrugada de hoje, devido ao excesso de febre, enlouqueceu”.
“A cidade voltou ao normal”.
05/11: “O declínio da epidemia”.
“O número de óbitos diários diminui de 101 nas últimas 48 horas e o total de sepultamentos decresce 40%”. (Ministério do Interior).
“É preciso evitar a invasão do cólera”.
06/11: “A cidade normalisa-se”.
“Libertando-se da ação nefasta da epidemia”.
07/11: “O aspecto da cidade já é quase completamente normal”.
“O medo e as angústias já passaram a não ser para quem tem um ente querido de cama”.
08/11: “Defendamo-nos contra o cólera”.
“Quantas mortes pela epidemia no Rio”?
14/11: “Que o sr. Rodrigues Alves não tomará posse amanhã é um fato; que o seu estado é gravíssimo é um boato que toma corpo”.
19/11: “O furacão da desgraça desabou sobre S. Paulo”. “Muitas casas comerciais fechadas por causa da gripe”. “Morre muito mais gente do que se diz”. “Diziam que só na Força Pública num só dia faleceram 400 praças devido a uma injeção de experiência do Dr. Vital Brasil, mas era boato; morreram 24”.
21/11: A metade superior da capa está ocupada por dezenas de fotos sob o título “As principais vítimas da gripe”. O texto explica: “Com os nossos serviços desorganizados e com a redução do número de páginas a que fomos forçados tornou-se impossível fazer acompanhar de retratos notícias da morte de todas as pessoas conhecidas vítimas da epidemia”.
“A influenza espanhola ainda não está extinta, nem poderia estar”.
24/11: “Foi solene a missa em ação de graças pelo restabelecimento do sr. Senador Paulo de Frontin. O senador compareceu ao ato”.
08/12: “A mortalidade da gripe nos dias calamitosos de outubro. Só 14.104 óbitos”?
“Lamentável desordem dos serviços de registro”.
“É indubitável que ainda são muitos os nossos casos de gripe”.
“Provável recrudescimento do mal”.
10/12: O presidente eleito Rodrigues Alves sai de seu casarão de Guaratinguetá (SP) e chega, de trem, ao Rio.
“Os médicos disseram que eu viesse para cá onde melhor me fortaleceria com esses lindos passeios” diz ele ao jornal.
Mas não há data marcada para sua posse. Delfim Moreira segue no poder.
03/01/1919: “Mais vão se acentuando boatos em torno da crise política criada pelo estado de saúde precário do sr. Conselheiro Rodrigues Alves. Resolução em 48 hs. Renúncia”? A família nega visita de médicos e o chama de “futuro presidente”.
04/01: “O eterno segredo”.
“O palacete mais célebre atualmente no Brasil”. Foto do Palacete da Rua Vergueiro, residência de Rodrigues Alves no Rio.
“Falar ao conselheiro? Impossível. Altos figurões não o conseguem”.
“Quando acabará isto”?
15/01: “O sr. Rodrigues Alves piora”. “É acometido de nova e mais grave crise”. “A crise da doença se acentua. É igual àquela que sofreu há seis anos”.
16/01: “O termo de uma grande existência”. Rodrigues Alves morre aos 70 anos.
28/01: “Cuidado com ela”. “O mal pode voltar”. “Matou seis milhões no mundo nas últimas 12 semanas”.
“A espanhola mata mais que a guerra”.
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* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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