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Ronaldo Lima Lins

Escritor e professor emérito da Faculdade de Letras da UFRJ

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A democracia posta em questão

Nota-se que a extrema direita ascende, se não pela força, pelo voto

(Foto: OSWALDO CORNETI/FOTOS PÚBLICAS)

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Nas sociedades ocidentais, o sistema democrático não se impôs sem tropeços. Em idas e vindas dos efeitos da Revolução Francesa, no século XIX, a natureza dos tumultos se revelou de tal monta que Alexis de Tocqueville, teórico, neto de Malesherbes, homem notável que se ofereceu para defender a família monárquica caída em desgraça, parou para pensar. Era um indivíduo de grande saber. Não se conformava com as ideias repisadas que tentavam se impor nos debates de então. Para melhor compreender o mundo, partiu para os Estados Unidos e voltou com a convicção segundo a qual a democracia representava o futuro para a Europa e o restante das nações. Ele notou que os norte-americanos escolhiam com frequência os piores nomes entre os candidatos. No entanto, nada atrapalhava na medida em que o povo tomava conta de si mesmo e promovia as medidas convenientes. 

Nos dias que correm o regime democrático entrou nos nossos costumes e se prestigiou. É como escolher a liberdade contra a opressão. No entanto, num panorama sobre o que está ocorrendo, nota-se que a extrema direita ascende, se não pela força, pelo voto. A França, num pleito que se efetua em dois turnos, correu riscos. Extremistas do partido de Le Pen obtiveram apoio e ganharam no primeiro turno. Ameaçavam alcançar maioria no parlamento. No Brasil, o fenômeno Bolsonaro, por incrível que pareça, anima setores da comunidade, não obstante os desatinos que provocou em seu mandato, para não falar nas crises de grosseria com que tratava os negócios do Estado. Apresentando-se às urnas, na última vez, perdeu por pouco. É verdade que abusou dos dinheiros do tesouro nacional e se fortaleceu com isso. Que no momento enfrente acusações em processos judiciais não lhe tira a pecha de perigoso, capaz de recorrer a qualquer coisa para permanecer no poder. Na retórica em ação, muda-se o perfil dos fatos para justificar atitudes que, não obstante, ficaram em nossa memória como lamentáveis. 

Amantes da paz se inquietam vendo pipocar no planeta o crescimento das agremiações de silhueta nazista, na Alemanha, na Hungria, na Itália ou no Brasil, nas áreas da região sul. Não é o apocalipse, mas as preocupações prosperam e as análises se acomodam mal com as versões aventadas para caracterizar o fenômeno. 

 Afinal, desde os gregos se sabe que não existem regimes perfeitos. A República, defendendo com fervor a livre discussão se manifesta talvez como um meio que melhor traduz anseios da alma humana. No nosso caso, ao contrário das observações de Tocqueville, a péssima qualidade dos parlamentares escolhidos para nos representar acrescenta angústia quando mais necessitávamos de serenidade.

 Efeito Bolsonaro? Sem dúvida. A truculência viu que pode chegar lá e se acomodar nas situações. Mas também é possível que não, que tais perversões indiquem uma dor da maturidade em busca de identidade. Trata-se de uma aposta.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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