A luta de Vini Jr.
A história de Vinícius Júnior no exterior é muito vencedora, mas também escancara o preconceito pelo mundo
Certa vez estive numa mesa com Zico. Está bem. Foi numa redação de jornal, na bancada dos computadores, mas nos cumprimentamos amigavelmente. O galinho de Quintino sempre foi um gentleman. Antes de sair, foi em direção ao banheiro e eu não resisti à tentação de ir também para poder falar que urinei com Deus. Esse era meu ídolo do futebol. Foi o ídolo de muita gente. Mas além de craque, moralmente ilibado, é branco. E isso faz diferença principalmente em países onde o racismo é explícito. Já fui detratado em muitos lugares no exterior, ou por ser latino ou ser brasileiro.
A história de Vinícius Júnior no exterior é muito vencedora, mas também escancara o preconceito pelo mundo. O ponta-esquerda do Real Madrid e Seleção Brasileira saiu do Flamengo com 16 anos, na época com uma contratação milionária e promessa cumprida de fenômeno do futebol. Saiu da pobreza pelo futebol. Não poderia ser um bom jogador, era necessário ser um craque. Teria que vencer a questão social primeiro. No exterior, novamente teve que quebrar barreiras para não ser engolido por um plantel maravilhoso, teve que ser superior. O 14º título da Liga dos Campeões foi através de seu gol. Assim como Pelé, que teve que ser o atleta do século, Vini precisou se superar para poder passar por cima das dificuldades inerentes de quem vem de uma camada social abaixo dos demais, sendo latino e de origem negra.
O enfrentamento de Vini Jr. atualmente não é com a bola, mas com o racismo escancarado da Europa. A imagem que vem à cabeça é o filme que Pelé fez com Stallone chamado Fuga para a vitória. Tem a cena que Pelé está sentado na grama e ao redor, todos os símbolos nazistas. O ponta-esquerda do Real Madrid, passou o ano enfrentando com a cabeça erguida todas as difamações possíveis de vários estádios racistas. Lutou publicamente, ganhou defensores, mas a luta é desigual. Na hora de premiar, não só o brilhantismo dentro de campo, mas coroar uma luta importante, foi esquecido pela Bola de Ouro. Mas ao longo dos anos, se pegar de 2006 para cá, venceu o voto branco. Foram premiados Cannavaro, Kaká, Cristiano Ronaldo, Messi, Modric e Benzema.
Quem ganhou a Bola de Ouro foi Rodri, que já foi acusado de racismo, com cantos ofensivos na final da Eurocopa. Essa é a cara atual do mundo escancarada para todos. O gesto do Real Madrid de cancelar a ida da comitiva de 50 pessoas para a premiação da Bola de Ouro não é só um belo gesto de apoio e indignação, mas um protesto muito claro de um importante clube contra a organização da Bola de Ouro. O protesto foi de ausência, mas todos não devem se calar diante do racismo.
E cada vez que a extrema direita cresce no mundo, temos um aumento nos discursos extremistas. O próprio racismo tem impulsionado o aumento do neofascismo em vários países da Europa, basta ver os dados de vítimas de violência racista. E toda vez que existem crises econômicas, a tensão mundial cresce e os discursos extremistas também. Vários países estão com inflação, queda no poder de compra, fazendo com que as falas da extrema direita cresçam. Países de todas as estirpes, desde Finlândia, Holanda até Alemanha. A luta não é nova. Podemos lembrar-nos da vitória de Jesse Owens conquistou a primeira medalha de ouro nos 100 metros rasos na Olimpíada de 1936, em plena Alemanha nazista.
Vinícius Jr. foi digno até o fim. Campeão e vencedor moral. Não foi vaiado como o Rodri em pleno tapete vermelho.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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