A morte do super-homem
Uma das imagens que vem e teimam em não ir embora é o sorriso debochado e malicioso do meu pai, sempre insinuando que escondia uma carta na manga, puro blefe... Seus humores, o bom e o mau humor fazem falta e eu nem sabia que fariam falta
Sempre tive certeza que meu pai era imortal, afinal ele não era um homem comum, era o super-homem.
Meu pai o mais forte inteligente e bonito do mundo.
Mas a morte, inescapável e tão incômoda, etapa da nossa existência que nos confere humanidade, o levou recentemente.
Não imaginei que esse momento chegaria, mas chegou.
É um momento que não termina, pois a partir dos nossos corações, surgem imagens até então esquecidas, definitivas e definidoras de nossas vidas, imagens que trazem o ontem de volta e afastam as dores do hoje.
Uma das imagens que vem e teimam em não ir embora é o sorriso debochado e malicioso do meu pai, sempre insinuando que escondia uma carta na manga, puro blefe... Seus humores, o bom e o mau humor fazem falta e eu nem sabia que fariam falta.
Meu pai era o próprio paradoxo, contrariava os princípios básicos e gerais que costumam orientar o pensamento do homem médio, desafiava a opinião consabida, a crença ordinária e compartilhada pela maioria. Aliás, a opinião da maioria nunca interessou a ele, ele buscava ouvir aqueles que ninguém ouve ou vê.
Pontepretano apaixonado me levou ao Majestoso a primeira e muitas outras vezes; nos legou muitas histórias e com ele vivi aventuras e desventuras, algumas impublicáveis, apesar de memoráveis; pontepretano, socialista, democrata, polemista, patriota e muito generoso; admirador do Papa João XXIII e amigo do Cônego Milton Santana.
Agradeço a Deus pelo meu pai, eu não escolheria outro, pois ele foi o melhor de todos, especialmente porque jamais lhe faltou humanidade e os relatos emocionados de seus amigos são prova inequívoca disso.
Meu pai era um sonhador. Talvez por isso eu acredite que é de suma importância sonhar. Não é possível uma família sem o sonho. Numa família, quando se perde a capacidade de sonhar, os filhos não crescem, o amor não cresce, a vida debilita-se e apaga-se. Esse talvez seja outro grande legado.
Ele sonhava com o futuro, amava minha mãe - a quem ele chamava carinhosamente de Tuti -, sonhava com seus pais e avós, pois foram eles que fizeram a vida alcançá-lo e ele que amava a vida apresentou-se à morte com dignidade e coragem, a coragem daqueles que transcenderam a esperança, daqueles que creem.
Meu pai nunca perdeu a capacidade de sonhar, ele nos hipnotizava quando falava dos seus sonhos e das possibilidades infinitas.
Do meu pai ouvi o seguinte: as relações da família devem ser baseadas no amor, pois são o matrimônio, a paternidade, o ser filho ou irmão são a essência formativa da validade das nossas vidas, essas relações formam o tecido básico de uma sociedade humana e conferem coesão e consistência.
Ouvi dele também que devemos renegar uma visão materialista do mundo, pois a nossa vida não reduz o homem ao estéril utilitarismo, mas oferece-lhe um canal para a realização dos seus desejos mais profundos. A família, em suas múltiplas configurações atuais, engajada no sonho e nas ações éticas é o portal para a transformação do individuo e da sociedade.
Li em algum lugar que ser pai é fazer-se de super-homem, mesmo quando se tem o coração todo engasgado e a voz tremula, pois ser pai é fazer de conta que nada nos desperta receio nem nos encolhe sempre que espantamos o medo para bem longe de quem nos ama, esse foi meu Pai, Rogério José Maciel.
Pedro Benedito Maciel Neto, advogado, sócio da MACIEL NETO ADVOCACIA, Presidente do Conselho de Administração da SANASA e Secretário Municipal de Habitação – pedromaciel@macielneto.adv.br
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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