Águas de fevereiro
"Falta plano de habitação, saúde e escola. Mas isso estamos cansados de falar. Temos que mudar o rumo dessa conversa agora nas eleições", escreve
Por Miguel Paiva, do Jornalistas pela Democracia
A notícia era urgente. Brasília havia sido invadida pelas águas vindas de todo o Brasil. Águas de Minas, da Bahia, de São Paulo e de Petrópolis. O marrom da lama cobria todo o verde dos gramados de Brasilia. Os carros não conseguiam rodar, os prédios do governo começavam a ser tomados pela água e pelos detritos.
Estranhamente as pessoas conseguiram escapar. Não houve feridos entre a população, mas a lama subiu até o segundo andar do Palácio do Planalto. O presidente teve que se refugiar sobre a cadeira de sua mesa, seus filhos sobre o sofá e sua mulher não estava. Os ministros e políticos da base foram todos surpreendidos numa reunião secreta e ficaram isolados.
Foi aí que eu acordei. O sonho me deixou meio atordoado. Liguei o celular para ver se aquilo se confirmava e o que encontrei foi lama e chuva, mas em Petrópolis, em Minas, São Paulo e Bahia. Em Brasilia, na área governamental, nada. O presidente continuava sua saga de beligerância e ignorância, seus filhos continuavam ausentes de suas responsabilidades e ministros e políticos da base ocupando suas cadeiras enxutas e seguras no governo brasileiro.
Brasilia sofre mais com a seca do que com a chuva. Claro que não desejamos enchentes pra ninguém e meu sonho mostrava isso, mas também não desejamos o descaso e o desprezo do governo com essas tragédias anunciadas. Todo ano a coisa se repete e as verbas extras prometidas causam um efeito restrito porque o problema não são as verbas. Elas existem. A questão é que nunca são usadas. Por um passe de mágica os gestores públicos conseguem desviar esse dinheiro como se desviam o curso de um rio e acaba inundando toda uma cidade. Falta fiscalização, participação do estado no desenvolvimento das populações.
Falta plano de habitação, saúde e escola. Mas isso estamos cansados de falar. Temos que mudar o rumo dessa conversa agora nas eleições. Temos que poder reclamar da ausência do estado para um governo que de fato ouve. Pode não fazer tudo o que é preciso, mas pelo menos ouve. Este não ouve nem quem diz, se é que existe, que vai dar merda essa ou aquela decisão. A farofada do Bozo, a viagem à Rússia, o irmão húngaro ditador e, por aí vai, só lembrando das mais recentes.
A questão é que isso não pode continuar se repetindo. Desde criança que somos vítimas da fúria das águas e agora mais ainda por conta do aumento da temperatura, pelas queimadas e pela poluição.
Vivemos num país tropical onde chove. Chove sempre e muito e a chuva precisa ser levada em consideração em qualquer projeto de governo. Assim como as doenças, a violência e a pobreza. Morrer numa enchente por conta do descaso como um dos responsáveis é muito grave. É como ir para as ruas e sair matando as pessoas que estavam sossegadas tentando sobreviver. É preciso encarar essas tragédias desta maneira ou então morreremos também disso, todos, porque a chuva mata quem estiver pela frente,
em casa, no ônibus, na loja ou no mercado. Aqui na minha casa, de classe média carioca, ontem tive que colocar comportas no portão. A minha rua virou um rio. Mais uma vez esperamos que Petrópolis seja um exemplo, não só para evitar futuras tragédias, mas por exemplo, o que já ajudaria, para de pagar a taxa que a família real cobra e o governo aceita. Ainda somos um império, é isso? Império da pobreza e da falta de seriedade. Chega.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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