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    Chris Hedges

    Jornalista vencedor do Pulitzer Prize (maior prêmio do jornalismo nos EUA), foi correspondente estrangeiro do New York Times, trabalhou para o The Dallas Morning News, The Christian Science Monitor e NPR.

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    As Marionetes e os Mestres das Marionetes

    Os procedimentos judiciais contra Assange dão uma falsa legalidade à perseguição do Estado contra o jornalista mais importante e mais corajoso da nossa geração

    (Foto: REUTERS/HENRY NICHOLLS)

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    Chris Hedges

    Este é o discurso de Chris Hedges feito em frente ao Departamento de Justiça dos EUA, em Washington, D.C., em 08.10.22, numa manifestação convocada para revogar o pedido do governo dos EUA para extraditar Julian Assange.

    Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247 

    WASHINGTON, D.C. - Merrick Garland (ministro da justiça dos EUA) e aqueles que trabalham no Departamento de Justiça [dos EUA] são as marionetes, não os mestres das marionetes. Eles são a fachada, a ficção de que a longa perseguição de Julian Assange tem alguma coisa a ver com a justiça. Assim como a Corte Suprema em Londres, eles executam uma elaborada pantomima judicial. Eles debatem, nuances legais misteriosas para distrair o público da farsa Dickensoniana na qual o homem que não cometeu um crime, que não é cidadão dos EUA, pode ser extraditado sob o Ato de Espionagem e sentenciado a passar a vida toda na prisão pelo jornalismo mais corajoso e consequente da nossa geração.

    O motor que impulsiona o linchamento de Julian não está aqui na Avenida Pennsylvania [sede do departamento de justiça dos EUA]. Ele fica em Langley, Virginia, localizado num complexo que nós jamais seremos permitidos de cercar – a Agência Central de Inteligência (CIA) dos EUA. Ela é operada por um estado interno secreto, com o qual nós não podemos contar, na busca louca do império e da exploração cruel.

    Os EUA passaram por um golpe de estado corporativo em câmera lenta. Eles não são mais uma democracia que funciona. Os verdadeiros centros de poder, nos setores corporativos, militares e de segurança nacional, foram humilhados e envergonhados pelo Wikileaks. Os seus crimes de guerra, mentiras e conspirações para esmagar as aspirações democráticas dos vulneráveis e dos pobres e a sua corrupção desenfreada, aqui e no mundo todo, foram desnudadas em milhares de documentos vazados.

    Nós não podemos lutar por Julian a não ser que sejamos claros sobre contra quem nós estamos lutando. Trata-se de algo muito pior que um judiciário corrupto. A classe bilionária, que orquestrou uma desigualdade social que rivaliza com o Egito faraônico, que capturou internamente todas as alavancas do poder e nos tornou a população mais espionada, monitorada, observada e fotografada na história humana. Quando o governo observa você 24 horas por dia, você não pode usar a palavra liberdade. Esta é uma relação entre um mestre e um escravo. Obviamente, há muito tempo que Julian era um alvo, mas quando o Wikileaks publicou o documento conhecido como Vault 7, que expôs as ferramentas de 'hacking' que a CIA usa para monitorar os nossos telefones, televisores e até carros – e o próprio jornalismo – ele foi condenado à crucificação. O objetivo é encerrar quaisquer investigações sobre o funcionamento interno do poder que podem responsabilizar a classe dominante pelos seus crimes, erradicar a opinião pública e substituí-la pelo jargão oferecido à plebe.

    Eu passei duas décadas como correspondente estrangeiro nos limites exteriores do império na América Latina, na África, no Oriente Médio e nos Balcãs. Estou agudamente consciente sobre a selvageria do império, de como as ferramentas brutais de repressão são testadas primeiro naquilo que Frantz Fanon chamou de “os miseráveis da Terra”.  Vigilância por atacado. Tortura. Golpes de Estado. Lugares secretos de tortura. Propaganda obscura. Polícia militarizada. Assassinatos. Guerras. Uma vez que estas ferramentas são aperfeiçoadas nas pessoas de cor e estrangeiras, elas migram de volta à pátria. Ao esvaziar o nosso país de dentro através da desindustrialização, da austeridade, da desregulamentação, da estagnação dos salários, da abolição dos sindicatos, dos gastos massivos com a guerra e a inteligência, de uma recusa a tratar da emergência climática e um boicote virtual dos impostos para os indivíduos mais ricos e as corporações. Estes predadores têm a intenção de nos manter na servidão, vítimas de um neofeudalismo corporativo. E eles aperfeiçoaram os seus instrumentos de controle Orwelliano. A tirania imposta aos outros é imposta a nós também.

    Desde o seu início, a CIA executou assassinatos, golpes de estado, torturas e espionagem e abusos ilegais – incluindo de cidadãos estadunidenses, cujas atividades foram expostas em 1975 pelas audiências do Comitê Church no Senado Federal e nas audiências no Comitê Pike da Câmara de Representantes. Todos estes crimes, especialmente depois dos ataques de 11/09/2001, voltaram com vingança. A CIA é uma organização bandida e paramilitar que não é responsabilizada pelas suas ações, que tem as suas próprias unidades armadas e um programa de drones, esquadrões da morte e um vasto arquipélago de locais secretos de tortura, nos quais vítimas sequestradas são torturadas e desaparecidas.

    Os EUA alocam um orçamento secreto de cerca de US$ bilhões por ano para esconder diversos tipos de projetos clandestinos executados pela Agência Nacional de Segurança [NSA – National Security Agency], a CIA e outras agências de inteligência – geralmente que ficam fora do escrutínio do Congresso. A CIA tem um aparato bem azeitado para sequestrar, torturar e assinar alvos no mundo todo – já que eles tinham montado um sistema de vigilância de vídeo de 24 horas por dia de Julian Assange na embaixada equatoriana em Londres, que é a razão pela qual eles discutiram muito naturalmente o seu sequestro e assassinato. Este é o seu negócio. Depois de examinar os documentos pesadamente censurados que a CIA liberou para o seu comitê, Senador Frank Church definiu a “atividade clandestina” da CIA como “um disfarce semântico para o assassinato, coerção, chantagem, suborno e a difusão de mentiras e o consorciando-se conhecidos torturadores e terroristas internacionais.

    Todos os regimes despóticos mascaram a perseguição feita pelo estado com procedimentos judiciais falsos. Os julgamentos-shows e as troikas na União Soviética de Stalin. Os delirantes juízes nazistas na Alemanha fascista. As manifestações de denúncias na China de Mao. Os crimes estatais são camuflados de falsas legalidades, são farsas judiciais. 

    Se Julian for extraditado e sentenciado e, dadas as tendências tipo-Lubianka [sede da KGB] do Distrito Judicial Leste do estado da Virgínia, o que é uma quase certeza, isto significa que aqueles de nós que publicamos materiais secretos, como eu fiz quando trabalhava para o The New York Times, nos tornaremos criminosos. Isto significa que uma cortina de ferro será estendida para mascarar os abusos de poder. Isto significa que o estado – o qual, através das Medidas Administrativas Especiais (SAMs – Special Administrative Measures), das leis antiterror e o Ato de Espionagem – criou a nossa versão nativa do Artigo 58 de Stalin, pelo qual se pode aprisionar qualquer pessoa, em qualquer lugar do mundo, que ouse cometer o crime de contar a verdade.

    Nós estamos aqui para lutar pelo Julian. Mas, nós também estamos aqui para lutar contra forças subterrâneas poderosas que, ao exigirem a extradição de Julian e o seu aprisionamento vitalício, declararam guerra ao jornalismo.

    Nós estamos aqui para lutar pelo Julian. Mas, nós também estamos aqui para lutar pela restauração do estado de direito e da democracia.

    Nós estamos aqui para lutar pelo Julian. Mas, nós também estamos aqui para desmantelar o estado tipo-Stasi [polícia secreta da Alemanha Oriental] de vigilância por atacado erguida em todo o Ocidente.

    Nós estamos aqui para lutar pelo Julian. Mas, nós também estamos aqui para derrubar – e permitam-me repetir esta palavra, para benefício daqueles no FBI e na Segurança da Pátria [Homeland Security] que vieram aqui para nos monitorar – derrubar o estado corporativo e criar um governo do povo, pelo povo e para o povo, o qual cuide dos melhores entre nós, ao invés de perseguí-los.

    Você pode ver um vídeo do evento aqui. Este discurso está gravado às 3h e 34 minutos do vídeo.

    Você também pode assistir a minha entrevista com o pai de Julian, John Shipton, aqui.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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