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    Gilvandro Filho

    Jornalista e compositor/letrista, tendo passado por veículos como Jornal do Commercio, O Globo e Jornal do Brasil, pela revista Veja e pela TV Globo, onde foi comentarista político. Ganhou três Prêmios Esso. Possui dois livros publicados: Bodas de Frevo e “Onde Está meu filho?”

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    E Bolsonaro, sem Trump e com uma nova América Latina?

    "No norte, o dono de um tipo de discurso centrado no ódio e na violência, viu ruir sua condição de presidente da maior potência ocidental. Por aqui, do lado de baixo do equador, outro projeto de reeleição periga ir para o brejo", escreve Gilvandro Filho, do Jornalistas pela Democracia

    (Foto: Reuters)

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    Por Gilvandro Filho, do Jornalistas pela Democracia - Depois da “maratona de Nevada”, em que o mundo todo passou quatro dias em frente à TV esperando a definição da eleição presidencial americana, a impressão que se tem é de que o mundo acorda de um pesadelo. Não há nada, dentro o que poderia acontecer com uma hipotética reeleição de Donald Trump, que fosse alvissareiro. Do combate à Covid-19 ao preconceito crônico que parte do mundo passou a espelhar, vindo dos Estados Unidos e refletido em países amigos do presidente alaranjado que teve, neste sábado, através do anúncio dos votos do Estado da Pensilvânia, o seu mandato mandado solenemente às favas.

    Não que o planeta esteja, a partir de agora, prestes a se tornar o melhor dos mundos. A vitória de Joe Binden não significa a redenção da espécie humana, muito menos abre portas, necessariamente, para novos tempos em termos de avanços sociais, liberdades democráticas em nível global ou coisas do gênero. Binden nunca acenou com tratamento politicamente digno com a Venezuela ou com o fechamento de Guantanamo, por exemplo. O resultado das urnas americanas não salva o mundo de nada. A não ser de tudo de sombrio e tenebroso que um novo mandato de Trump poderia expelir sobre o planeta. Aí, sim, foi uma vitória da Humanidade.

    Falamos da saída de cena de um presidente autoritário, arrogante, mal educado, preconceituoso, que trata com absoluto desprezo a razão e a ciência, que levou o seu país a uma das piores tragédias sanitárias de todos os tempos, que trata seus desafetos como párias miseráveis. Falamos do final de linha constrangedor de um presidente que, derrotado impiedosamente em sua tentativa de se reeleger, já avisou que venderá caro a sua saída da cadeira presidencial, numa demonstração patética da falta de mínimas condições para conviver numa democracia, muito menos de querer falar em nome dela.

    É a esse presidente, não propriamente aos Estados Unidos, que o presidente do Brasil devota um servilismo que não encontra precedente na política externa brasileira. Ou “era” a esse presidente, para usar o tempo de verbo que o mundo, hoje, se esbalda ao adotar. A derrota de Trump, com toda certeza, abrirá caminho para mudanças no mundo e, de forma muito particular, na América Latina. Já estão aí para contar a História a Argentina, a Bolívia, o Chile. Ao mesmo tempo, trata-se de um evento eleitoral que tira do governo de Jair Bolsonaro o seu mais aconchegante ninho político. O fantasma da esquerda na América do Sul, sem a sombra de Trump lá na parte de cima do continente, torna-se mais aterrador para o presidente brasileiro, a partir de agora.

    É natural se falar, doravante, em isolamento do mandatário brasileiro. Mesmo que consiga vir a flertar com uma linha mais pragmática em relação ao governo Binden, o que seria o caminho mais lógico, Bolsonaro tem Trump e sua linha de pensamento e conduta como que entranhados em sua alma. Afinal, os dois presidentes são muito amigos, como garante o deputado federal e filho Eduardo Bolsonaro, o que um dia sonhou em ser embaixador do Brasil nos Estados Unidos – nos EUA de Trump, que começou a murchar hoje.

    Bolsonaro foi eleito em circunstâncias parecidas com as que elegeram Trump. A bandeira das notícias falsas, acusações sem provas e ameaças até de extermínio físico tremulou, altaneira, nas campanhas dos dois (cada uma em seu tempo). A força dada ao renascimento de uma extrema-direita irascível e tosca teve, de ambos, o combustível necessário para formar uma força política centrada no ódio e na violência. Os dois agrediram a lógica e ciência no combate à Covid-19, desenhando da doença e disseminando remédios ineficazes, como a cloroquina, permitindo que a doença se espalhasse, devastadora, nos dois países. Tanto um quanto outro mantém uma oposição amazônica à proteção da natureza. Sem falar no componente religioso/ideológico que faz dos dois presidentes personagens de um mundo atrasado e extemporâneo, dividido os “homens de bem” cristãos e o globalismo ateu, entre patriotas e comunistas.

    No norte, o dono desse tipo de discurso e das promessas de uma ação política ainda mais retrógrada e perigosa viu ruir sua condição de presidente da maior potência ocidental. Por aqui, do lado de baixo do equador, outro projeto de reeleição periga ir para o brejo daqui a dois anos sem a sombra do seu topetudo protetor e à luz de uma nova tendência política que começa a varrer a América Latina.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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