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    Milton Alves

    Jornalista e sociólogo

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    Guerra Rússia-Ucrânia: a extrema direita que vibra por Putin e a ‘Nova Ordem Internacional’

    "É necessário o esforço para conhecer a motivação de fundo do grupo dominante que ocupou o poder na Rússia por quase três décadas", escreve Milton Alves

    Civis treinam lançamento de coquetéis molotov em Zhytomyr, na Ucrânia01/03/2022 (Foto: REUTERS/Viacheslav Ratynskyi)

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    Por Milton Alves 

    Diz um velho ditado que numa guerra a primeira vítima é a verdade. No atual conflito bélico entre Rússia e Ucrânia, velhas mentiras, meias verdades, fake news e narrativas das partes em confronto são utilizadas como armas de guerra — tudo mais potencializado pelo alcance e a porosidade das redes e mídias sociais.

    Pois bem, um dos argumentos da narrativa de Putin para justificar a agressão à Ucrânia, é o da suposta “desnazificação” do país, governado pela extrema direita, e comandado por Volodymyr Zelensky. É verdade que existem e atuam partidos e milícias nazistas na Ucrânia, porém são forças minoritárias, que não atingiram 5% dos votos nas últimas eleições presidenciais.

    Partidos como o Svobada (União Pan-Ucraniana pela Liberdade) e o Setor Direita não contam com representação no parlamento nacional ucraniano. Há ainda milícias paramilitares que atuam no leste do país e travam combate contra as repúblicas separatistas de Donetsk e Luhansk, pró-Rússia — e o notório Batalhão Azov, que foi incorporado à Guarda Nacional da Ucrânia.

    O argumento de Putin pela “desnazificação” do país vizinho tropeça quando uma mirada mais detida sobre o mosaico de facções políticas-ideológicas que apoiam o seu governo, mostra a sólida presença de forças de extrema direita: conservadores fundamentalistas, ultranacionalistas, pan-eslavistas, monarquistas e nazifascistas. São dezenas de grupos, pequenos partidos e milícias atuando no país e defendendo o ideário putinista de reconstrução da “Grande Rússia” e por uma “Nova Ordem Internacional” . Muitos desses grupos e ativistas também atuam em correntes do partido governante, o Rússia Unida (em russo Единая Россия).

    Após o fim da União Soviética e o trauma de uma selvagem e mafiosa restauração capitalista, ganhou impulso na Federação Russa as teorias ultranacionalistas e pan-eslavistas, que voltaram a ter ampla audiência nas universidades, centros de pesquisas sociais, instituições culturais, na imprensa e na atividade política.

    Nesse contexto, intelectuais como Sergey Karaganov (atualmente presidente honorário do Conselho Russo de Política de Relações Exteriores e Defesa, supervisor acadêmico da Escola de Economia Internacional e Relações Exteriores da Escola Superior de Economia – HSE em Moscou) e Alexander Dugin (filósofo, cientista político, diretor do Centro de Pesquisas sobre o Conservadorismo da Faculdade de Sociologia da Universidade Estatal de Moscou. Fundador do Movimento Internacional Eurasiano e ideólogo do nacional-bolchevismo e da IV Teoria Política) exercem forte influência em camadas superiores do establishment político russo, incluindo a diplomacia e o Exército.

    No quadro atual de radicalização do debate político que divide a esquerda no Brasil e no mundo sobre a guerra russo-ucraniana, é necessário o esforço para conhecer a motivação de fundo do grupo dominante que ocupou o poder na Rússia por quase três décadas. É possível afirmar que Putin é o representante de uma agressiva vocação expansionista e de uma visão reacionária de mundo, de sectárias e perigosas idéias pan-eslavas, portanto, antagônicas de qualquer traço progressivo, anti-imperialista, ou democratizador.

    Conheça um breve perfil de alguns desses grupos que estão atuantes na cena política russa e que fornecem apoio militante ao governo de Putin:

    – Milícias do Grupo Wagner (em russo Группа Вагнера) é uma organização paramilitar neonazista com vinculações no interior das Forças Armadas Russas. No momento, a milícia está engajada em combates nas diversas regiões da Ucrânia e tem bases na Crimeia anexada. Os milicianos da Wagner atuaram na Síria e prestam serviços para governos e empresas no Leste Europeu e na África. A milícia é conhecida por uma atuação de extrema violência contra populações civis.

    – Interbrigadas (em russo: Интербригады) é um movimento criado pelo antigo partido político Nacional Bolchevique. A brigada “A Outra Rússia” participa diretamente do conflito armado no leste da Ucrânia ao lado dos defensores da República Popular de Donetsk e da República Popular de Luhansk

    – Exército Ortodoxo Russo (em russo: Русская православная армия, Russkaya pravoslavnaya armiya) é um grupo militante do Leste da Ucrânia que foi fundado em maio de 2014, como parte da insurgência em Donbass.

    – Batalhão de Unificação e Renascimento Eslavo ou Batalhão Svarozhich – O batalhão foi formado por membros do movimento Rodnovery (fé nativa eslava), no seu auge 1.200 combatentes, que agora fazem parte da Brigada Vostok.

    – Destacamento Jovan Šević (sérvio: одред «Јован Шевић») – grupo integrado por chetniks (os chetniks eram partidários da monarquia e colaboracionistas dos fascistas e nazistas durante a II guerra) sérvio Bratislav Živković, tem 450 combatentes.

    – Unidades de Voluntários da RNU – Inclui voluntários da Unidade Nacional Russa e outras organizações neonazistas.

    Além disso, facções de governos, de partidos e lideranças de extrema direita na Europa – com expressão política, bancadas no parlamento Europeu – simpatizam com muitas das ideias defendidas por Putin, Karaganov e Dugin. Na Hungria, Polônia e República Tcheca; na Áustria (FPÖ-Partido da Liberdade); na Alemanha (AfD) e na França (Reagrupamento Nacional de Marine Le Pen e Reconquête de Erick Zemmour). Nos Estados Unidos, grupos vinculados ao movimento de Steve Bannon, e no Brasil setores do bolsonarismo, simpatizantes do legado do jornalista Olavo de Carvalho e os duguinistas da Nova Resistência.

    Por último, faço minha torcida por um imediato cessar-fogo, o apoio às vítimas e deslocados pela guerra, uma saída negociada, com base nos princípios da autodeterminação dos povos e do direito internacional — sem anexações e sanções.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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