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Milton Blay

Formado em Direito e Jornalismo, já passou por veículos como Jovem Pan, Jornal da Tarde, revista Visão, Folha de S.Paulo, rádios Capital, Excelsior (futura CBN), Eldorado, Bandeirantes e TV Democracia, além da Radio France Internationale

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No teatro do absurdo tudo é possível

Milton Blay anota que a Rússia aprovou lei que pune notícia considerada falsa pelas forças armadas com 15 anos de prisão. E pergunta: "E o que é notícia falsa?"

Putin e a guerra na Ucrânia (Foto: Reuters)

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Por Milton Blay

O que quer Vladimir Putin?

Nas primeiras horas do conflito, após o reconhecimento da independência do Donbass e Lugansk (oficialmente respondendo a pedido das autoridades locais), o  "czar" afirmava que o objetivo da invasão das tropas russas era garantir a segurança das duas repúblicas, que, em outras palavras, passavam a integrar a zona de influência moscovita. Elevava-se desta forma de dezenove para vinte e um o número de repúblicas sob as ordens do Kremlin. 

Naquela altura já estava claro, contudo, que o objetivo da guerra, fixado por Putin, não se limitava ao Donbass, Lugansk e regiões periféricas. Ele não precisava de 150 mil homens fortemente armados só para isso. Em seguida, o ditador russo anunciou a desnazificação da Ucrânia. Outra desculpa esfarrapada, pois um nazifascista como Putin, chefe de Estado que mantém relações privilegiadas com a extrema-direita mundial e que segue os preceitos do Duguismo, correspondente ao Olavismo de Bolsonaro, não faria uma guerra para desnazificar o país vizinho. Mesmo porque o principal representante do nazismo na Ucrânia, o batalhão Azov, ultranacionalista, é contra a Rússia da mesma forma que é contra a OTAN e a União Europeia.

Aqueles que acusam o Batalhão de ser apoiado e financiado pelos Estados Unidos, fingem não saber que em outubro de 2019, membros da Câmara dos Representantes dos EUA do Partido Democrata solicitaram que o Batalhão de Azov e dois outros grupos de extrema direita fossem classificados como Organização Terrorista Estrangeira pelo Departamento de Estado dos EUA, citando atos de violência de direita, como os tiroteios na mesquita de Christchurch no início daquele ano. O pedido gerou protestos de apoiadores de Azov na Ucrânia (um dos líderes do Batalhão  seria um nacionalista brasileiro chamado "Frank Horrigan »). Então se a razão da guerra não era de desnazificar a Ucrânia, qual seria ? Provavelmente a tomada de toda a Ucrânia, com a imposição da neutralidade, da desmilitarização e de um novo governo pró-russo.

Chegamos assim perto da verdade, mas era sem contar com a loucura de Vladimir Putin. Sim, porque aparentemente o presidente russo enlouqueceu. Dizem que é por causa do isolamento em que se encontra, o que eu não acredito, pois o problema vem de longa data.  De qualquer maneira, nas últimas horas Putin não teve toda a sua razão, com ações fora de lógica, a não ser que estivesse determinado a provocar uma guerra mundial.

Nesta quarta-feira, dia 2 de março, dois aviões caça Sukhoi Su-25 e outros dois Sukhoi SU-27 da Força Aérea Russa violaram o espaço aéreo sueco. Putin, ao contrário da prática corrente entre dois países, não se desculpou, nem entrou em contato com as autoridades suecas para explicar que houve um engano (desculpa de praxe). Isso leva a crer portanto que a violação do espaço aéreo foi proposital, uma advertência que reforça as palavras ameaçadoras do presidente russo, segundo as quais se a Suécia e a Finlândia abandonarem a neutralidade para ingressar na OTAN, terão a mesma sorte da Ucrânia. 

Na madrugada de 3 para 4 de março, as forças russas atacaram a central nuclear de Zaporizhzhia, a maior da Europa com seis reatores, causando um incêndio no prédio da administração da usina e provocando pânico na população ucraniana e também europeia. Segundo Putin, a operação militar russa segue de acordo com aquilo que havia sido determinado,  o que nos leva à conclusão de que ele não abre mão do terror nuclear.  E que está disposto a correr o risco de um acidente nuclear, sem falar da eventual entrada do poderio atômico russo na guerra.

Com a ocupação da central de Zaporizhzhia, Putin tem entre suas mãos a produção de energia da Ucrânia, situação que deixa as grandes cidades sem eletricidade, sem aquecimento, sem água, além de controlar as vias de acesso e fornecimento de alimentos. Segundo estrategistas ocidentais, Putin cercou as cidades e negociou a abertura de corredores humanitários para a fuga da população civil, o que o deixará com as mãos livres para realizar uma tempestade de bombas, matar o máximo de pessoas e obrigar Zelenski à demissão. Emmanuel Macron, após uma discussão de 1h30 com Putin por telefone, anunciou que o pior está por vir. O massacre será terrível.

Apesar da avassaladora superioridade militar de Moscou, Putin não se preparou para um conflito longo. 

No plano interno, a Duma, a Câmara baixa do Parlamento russo, votou uma lei que não deixa a menor fresta para a verdade. Toda notícia considerada falsa pelo alto comando das forças armadas será sancionada com 15 anos de prisão.  E o que é notícia falsa? Toda e qualquer informação não confirmada ou não emanada das forças russas. A mera utilização da palavra guerra ou invasão entra nessa definição, já que o Kremlin considera que se trata de uma simples  "operação especial".

Ao agir dessa forma, Vladimir Putin quer deixar claro que é o único capitão a bordo e que o futuro da guerra, da Ucrânia e talvez até do mundo, depende dele, e exclusivamente dele.
Os russos, ou provavelmente grande parte deles, estão convencidos de que a invasão da Ucrânia foi necessária e urgente para salvar a Rússia. Sim, porque vários mísseis de grande poder destruidor, inclusive com ogivas nucleares, instalados na Ucrânia, estavam prestes a ser lançados contra Moscou e as principais cidades russas. O ataque era iminente. Essa versão foi contada por  cidadãos russos, convencidos de que Putin os salvou. Eles não se perguntam por que as tropas russas não encontraram nenhum míssel voltado para a Rússia, nem por que essas armas não foram disparadas. Estranho, não é mesmo?  

No mundo das fake news aliás, é preciso salientar que apenas a extrema-direita e parte da extrema-esquerda saudosista apoiam o agressor russo. Dentre eles, alguns grupos que aceitam tudo, absolutamente tudo o que for contra os Estados Unidos, culpados pelo mal do mundo, por todo o mal do mundo. A palavra de ordem destes é "o inimigo do meu inimigo é meu amigo". O que nos leva à situação surreal em que os neonazistas estão mão na mão com os stalinistas. É um dos ensinamentos absurdos deste teatro à la Ionesco. 

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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