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    Laurez Cerqueira

    Autor, entre outros trabalhos, de Florestan Fernandes - vida e obra; Florestan Fernandes – um mestre radical; e O Outro Lado do Real

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    O Brasil vai às urnas resgatar o projeto de nação democrática e soberana que lhe foi roubado no golpe de 2016

    "O Brasil que vai às urnas se viu no espelho e não gostou do que viu nos últimos anos", avalia o jornalista e escritor Laurez Cerqueira

    Manifestação a favor da democracia e contra Bolsonaro em São Paulo (Foto: REUTERS/Carla Carniel)

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    Por Laurez Cerqueira

    Lula saiu do cárcere, em Curitiba, desmascarou todos os algozes que o condenaram à prisão, a começar pelo ex-juiz Sergio Moro e o procurador Deltan Dallagnol. Caminhou como um peregrino, batendo de porta em porta, chamando todas as pessoas comprometidas com a democracia, com o Estado de direito e a soberania da nação, para derrotar o fascismo, liderado pelo capitão Jair Bolsonaro.

    Lula construiu um dos maiores arcos de forças políticas democráticas da história do Brasil, equivalente ao que se formou na campanha pelas eleições diretas, em 1983.

    Ao pegar o caminho das urnas, lembre-se de que o Brasil foi vítima do golpe de Estado que derrubou a presidenta Dilma, legitimamente eleita, e interditou o mais ousado projeto de nação democrática, soberana, de sua história.

    Lembre-se de que prenderam o ex-presidente Lula, com uso de lawfare, de massacre midiático com requintes de crueldade, e depois o condenarem com base em processos forjados, acusações falsas, sem nenhuma prova, na tentativa de destruí-lo moral e politicamente, para não permitir que ele fosse candidato à presidência da República, em 2018.

    Lembre-se de que elegeram um capitão do exército, tonto, perverso, desprovido de condições morais, de qualificações mínimas para governar o país, responsável pela tragédia da recessão, do desemprego, da inflação, da fome, da morte de mais de 680 mil pessoas, por negacionismo e irresponsabilidade, durante a pandemia.

    Mas, mesmo estropiado, como quem volta de uma guerra, com todo o estrago na saúde física e mental, o Brasil se levanta, acordado do pesadelo, e segue a estrela da esperança, para resgatar o que lhe foi negado no golpe, em 2016, cravar a bandeira da vitória nas urnas e colocar o ex-presidente Lula de volta à presidência da República.

    O expresso que partiu, em 2002, direto da “Capital da Esperança”, para o futuro, com Lula no comando, depois passado para Dilma, em 2011, primeira mulher a pilotar a locomotiva, foi assaltado, em 2016, por conhecidos bandoleiros: gente nativa, gerentes de interesses externos e dos negócios da “elite do atraso” nacional, desde o Brasil colônia.

    A serviço dos gringos, além da interdição do projeto nacional, da subtração de direitos dos trabalhadores e outras piratarias, os bandoleiros queriam mesmo era o tesouro descoberto pela Petrobras, em águas profundas do mar da costa brasileira: nosso precioso petróleo da camada pré-sal.

    O assalto que tirou Dilma da Presidência da República e prendeu Lula foi coisa de cinema. Bastou inventar umas tais “pedaladas fiscais”, um “apartamento triplex”, um “sítio em Atibaia” para justificar os falsos crimes, instalar o ódio no coração do povo com uma avalanche de fake news e mandá-lo para as manifestações com o “estandarte da anti-corrupção”.

    A ação contou com grande elenco de magistrados, parlamentares, de uma “operação de combate à corrupção na Petrobras” urdida por um juiz, alguns procuradores e delegados. Coube à mídia oligárquica o papel de pelourinho, para o lowfare em praça pública.

    A presidenta Dilma, o ex-presidente Lula e o Partido dos Trabalhadores foram açoitados dia e noite, com ódio de classe colonial, por capatazes da imprensa da Casa-Grande. Dilma foi derrubada e Lula preso, para não ser candidato em 2018.

    Os gerentes de interesses externos e a “elite do atraso” não aceitavam o projeto de governo do Partido dos Trabalhadores, que tinha o Estado como indutor do desenvolvimento sustentável com inclusão social, erradicação da pobreza, preservação de direitos e afirmação da soberania nacional, tendo a indústria do petróleo como uma das mais promissoras alavancas do crescimento econômico. Hoje se dizem “modernos”, se tornaram inimigos do Estado.

    Logo no início da viagem, em 2006, quando Lula tocou o apito da locomotiva anunciando que a Petrobras havia descoberto as imensas jazidas, um alvoroço se formou no mercado internacional de petróleo. As gigantes do ramo puseram seus olhos de raio-x sobre o Brasil.

    O governo foi espionado, telefones da Presidência da República hackeados, dois notebooks da Petrobras, com dados sigilosos da empresa, foram furtados, em janeiro de 2008, segundo relatório da investigação da Polícia Federal.

    Apesar disso, o governo Lula não se intimidou. Partiu para o planejamento da exploração das jazidas, construção de siderúrgicas, afim de processar o aço a ser usado na montagem das plataformas e refinarias de petróleo. Com a Petrobras no controle das reservas e da produção, em 2010, a capitalização elevou a empresa ao patamar de quarta maior petroleira do mundo.

    A indústria nacional chegou a produzir 73% dos itens demandados pela construção das plataformas. Em 2014, o Brasil chegou ao menor índice de desemprego registrado pelo IBGE: 4,3%. Pleno emprego. Menor que o da Inglaterra, que foi de 7,2%, no mesmo ano. O PIB do Brasil, que era de US$ 502 trilhões, em 2002, havia saltado para US$ 2.473 trilhões, em 2013. Isso, em plena recuperação do impacto da crise econômica e financeira dos Estados Unidos, de 2008, que abalou o mundo.

    A presidenta Dilma dizia que o petróleo do pré-sal era um “bilhete premiado”, uma fonte poderosa de recursos para financiar o projeto do governo, que tinha a educação como eixo estratégico para superação da desigualdade, da pobreza, e promoção do desenvolvimento.

    Em 2013, Dilma sancionou a lei que destinava 75% dos royalties do petróleo para a Educação e 25% para a Saúde. À medida que crescia a produção, crescia também a arrecadação de royalties. Desde o início do governo Lula, a Educação foi prioridade máxima. Em 2003, o orçamento da Educação era de R$ 33,3 bilhões. Em 2014, mais que triplicou, saltou para R$ 115,7 bilhões. O orçamento dos fundos de apoio à pesquisa era de R$ 4,07 bilhões, em 2000. Em 2015, chegou a R$ 13,97 bilhões.

    Os governos Lula e Dilma criaram 18 universidades federais e 173 campi universitários, espalhados por regiões estratégicas para o desenvolvimento. O acesso ao ensino superior saltou de 505 mil alunos, em 2003, para 932 mil, em 2014. O programa Ciência sem Fronteiras chegou a financiar mais de 100 mil bolsas de estudos de mestrado e doutorado para estudantes brasileiros, nas mais importantes universidades do mundo. Foram criados mais de 360 Institutos Federais de Ensino, para formação de profissionais técnicos.

    O Plano Nacional de Educação – PNE, decenal, previa, além da ampliação dos investimentos, elevar o nível do ensino público com qualificação dos professores, do recrutamento (elevação do nível dos concursos), aumentos salariais gradativos, para equiparação às carreiras de Estado mais bem remuneradas.

    Educação de qualidade e desenvolvimento científico e tecnológico metem medo nos poderosos nativos e das nações centrais, por serem raízes da democracia e da soberania de uma nação.

    Evidentemente, o projeto dos governos do PT é muito mais abrangente, se espalha por todas as áreas. O Programa de Aceleração do Crescimento, por exemplo, superou a casa de R$ 1,5 trilhão em investimentos na infraestrutura de desenvolvimento, entre os anos 2007 e 2014.

    O Brasil que vai às urnas também está assustado com o Brasil que emergiu do passado, dos porões da história, do submundo dos crimes da colonização, das ditaduras, trazido à tona pelo capitão Jair Bolsonaro. A violência latente, arraigada no obscurantismo de parte da população se espalhou nas redes sociais, galopou nas ruas, embrenhou nas famílias.

    O Capitão Capataz encarnou o ódio de classe do senhorio contra a democracia, a legalidade, os pobres e seus direitos, e arrebatou corações e mentes de herdeiros dos bandeirantes, de escravistas, que se identificam com o caráter dele.

    Impossível olhar o Brasil e não ver na paisagem política os conflitos ancestrais emergidos da história nos últimos anos, desenhando o cenário da barbárie. A história do Brasil é vermelho-sangue. O senhorio sempre manteve o poder de classe, a subordinação, com a ração numa mão e o chicote na outra.

    A sombria mentalidade colonial persiste. Patrões e feitores ainda rugem nas empresas, nas famílias, no jornalismo, nas redes sociais, com o mesmo ranço da escravidão, com a mesma violência do senhorio, que, ao longo da nossa história, cortou cabeças, esquartejou, salgou corpos em pedaços, em praças públicas, de quem ousou se rebelar contra a dominação, a exploração, a opressão e a miséria. Os eleitores da base da pirâmide social são sobreviventes da negação da democracia.

    O senhorio se encastelou no topo da pirâmide e resiste à inclusão social e à conquista de direitos elementares dos trabalhadores. O ex-presidente Lula quer apenas que a Constituição seja cumprida, mas o senhorio odeia a Constituição, quer rasgá-la. Imaginou que o Capitão Capataz faria esse serviço, mas ele não conseguiu. As forças políticas do arco de alianças articulado por Lula empunham, bradam a Constituição e se posicionaram em defesa do Estado democrático de direito. Na democracia, os conservadores sempre perdem.

    Nos momentos em que o Brasil adotou modelos de desenvolvimento e políticas de relações internacionais, que o levou a mais independência e soberania, associados a políticas públicas com expansão de direitos e inclusão social, ergueram-se golpes. Os militares têm se comportado, historicamente, como protetores dos interesses do senhorio do topo da pirâmide e do poder econômico das nações centrais. No golpe da proclamação da República, eles não se aliaram aos republicanos abolicionistas, mas aos proprietários das terras, das minas, das empresas e dos bancos que se estabeleceram no país.

    Os golpes sempre foram dados por militares em parceria com gerentes de interesses externos, para realinhar o Brasil aos vínculos econômico-financeiros das nações centrais, impostos por corporações empresariais.

    Sempre foi assim em Pindorama e a história tem os fatos emoldurados e pendurados na parede da memória. Hoje, são articulados pelo judiciário e o parlamento, tendo a mídia como manipuladora da opinião pública. São os golpes sem sangue.

    Para eles, “Ordem e Progresso” significa baixar as cabeças, trabalhar, produzir, consumir, como máquinas. Não questionar e deixar os destinos nas mãos deles. Ou seja, não atrapalhem os piratas, eles querem continuar explorando Pindorama e sua gente.

    O Brasil que vai às urnas se viu no espelho e não gostou do que viu nos últimos anos. Quer de volta o projeto de país que lhe roubaram no golpe de 2016. Quer de volta a decência, a democracia. Não quer a rivalidade, a exclusão, quer solidariedade; não quer ódio, armas, quer amor, educação de qualidade; não quer o obscurantismo, o charlatanismo religioso, quer a civilidade e a ciência. Enfim, quer alegria de viver e saúde mental. Quer um país onde reine a justiça, a igualdade, a felicidade.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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