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    José Neto

    Estudante de História e analista geopolítico. De Canguaretama, Rio Grande do Norte.

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    O urso apenas se defende (Parte I)

    A Rússia viu a OTAN, braço armado dos EUA no ocidente, crescer fortemente nas suas ex-repúblicas-irmãs da era soviética e causar pressão no seu território

    (Foto: Carlos Latuff)

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    A Rússia foi desmembrada e humilhada após o colapso da União Soviética, no começo da década de 90 do século XX. O maior país do globo viu a sua economia se esfacelar e as suas instituições de seguridade social acabarem com a abertura para o “capitalismo selvagem”: o neoliberalismo. Entretanto, a maior das derrotas para o poderio russo naquele período,  marcado pela dominação unipolar norte-americana na geopolítica global, foi ter perdido a sua influência ao redor das suas fronteiras e no Leste Europeu. A Rússia viu a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte), braço armado dos Estados Unidos no ocidente, crescer fortemente nas suas ex-repúblicas-irmãs da era soviética e causar pressão no seu território.

    A partir dessas movimentações, Mikhail Gorbatchov, último líder da era soviética, fez um acordo informal, sem assinaturas diplomáticas, com o bloco ocidental e com os Estados Unidos da América (EUA), para que a OTAN não se expandisse para o Leste, com o qual ambos os lados concordaram. Contudo, após o ocidente ver a instabilidade em que a Rússia se encontrava no período pós-soviético, esse grupo de países não cumpriu com as demandas russas acordadas. Ademais, ingressaram na organização ocidental os países bálticos: Letônia, Lituânia e Estônia, que outrora foram repúblicas soviéticas. Após o fim do campo socialista na década de 80, entraram também no bloco: Polônia, República Tcheca, Romênia, Hungria e Bulgária, países que fizeram parte do antigo bloco. Dessa forma, vemos que os acordos informais não foram respeitados pelo bloco ocidental e, desde então, a OTAN está cada vez mais próxima da casa russa, trazendo tensões do nível da “Guerra Fria”. 

    Um bêbado no comando

    Um dos fatores do conflito no Leste Europeu são as atitudes de Vladimir Putin, presidente russo, e a sua contraposição ao ocidente. Para analisarmos sua influência  no conflito, devemos olhar o que ele herdou. Antes de Putin assumir o poder na Rússia, em 2000, o país era governado por Boris Yeltsin, primeiro presidente russo após o colapso soviético. O primeiro mandatário da federação russa foi um oligarca da era soviética que levou adiante e radicalizou as reformas liberalizantes de Gorbachev. 

    Por um lado, o líder russo mostrou ser um ator harmonioso no novo cenário internacional, sabendo dialogar e receber ordens do ocidente. Por outro, nas questões internas, o capitalismo tão anunciado não veio da forma que ele e o ocidente esperavam, e sim como uma crise econômica e social brutal para o povo russo. A crise teve vários fatores, mas os de maior relevância foram as privatizações a “preço de banana” e a falta de investimento nos programas de seguridade social, levando milhões de russos à fome e à queda drástica da qualidade de vida. Além disso, Yeltsin tinha inúmeros problemas alcoólicos, que foram expostos publicamente em várias ocasiões, e  garantia a confiança de  seu povo. 

    Diante dessa convulsão social apresentada, em 1993, o povo foi às ruas e tentou mudar, com as  próprias mãos, os caminhos de seu país, mas a resposta do governo foi a repressão e, como um autocrata, Yeltsin bombardeou o parlamento e se assegurou no poder pela força. A insatisfação continuou e Boris Yeltsin decidiu renunciar em 31 de dezembro de 1999, assim, assumiu o seu lugar Vladimir Putin, que recentemente tinha sido escolhido como primeiro-ministro do governo Yeltsin e foi o quarto no cargo em menos de um ano. O novo presidente russo mudaria tudo no tabuleiro geopolítico. 

    A cara russa no século XXI

    O novo presidente russo inverteria totalmente o tabuleiro interno e externo, se consagrando como uma das maiores e mais pragmáticas figuras políticas do novo século. Putin foi um ex-agente da KGB, polícia secreta soviética, e atuou como vice-prefeito de São Petersburgo, no governo do oligarca corrupto Anatoly Sobchak. Putin se mostrou um bom administrador e conciliador, mas os descontroles de Sobchak o levaram a perder a eleição seguinte. 

    Putin, que tinha feito um ótimo trabalho ao controlar as oligarquias russas, recebeu de Yeltsin um convite para fazer parte do seu tão criticado governo e  assumir a FSB (serviço secreto da Federação Russa), ele aceitou. Apesar de fazer   parte do governo Yeltsin, Putin foi um crítico da década de abertura frenética, apontando os males que ela gerou. Após ter feito   um bom trabalho, Yeltsin o convidou para ser seu primeiro-ministro, e lhe deu ordens para o novo premier lidar com os grupos separatistas na Chechênia e com os poderosos oligarcas. O governo de Yeltsin tinha uma alta desaprovação e o país vivia uma crise generalizada, dessa forma, vendo-se encurralado pela crise, Yeltsin renunciou e Putin assumiu o poderio da nação.

    O novo homem forte do Kremlin pegou o país desmoralizado e no fundo do poço , mas, com um governo firme e controlado, começou a fazer reformas. Dessa forma, seu governo pôs fim às privatizações, soube fazer novas alianças para a cooperação e aproveitou o bom momento do mercado internacional, começando a reconstruir a economia russa. Além disso, aumentou os investimentos nas instituições de seguridade social, melhorou a qualidade de vida da população russa, atuou com firmeza na área da segurança interna e manteve a integridade territorial de seu país. 

    Em contrapartida, Putin recebeu críticas do ocidente pelo seu alto conservadorismo e repressão às minorias,  o que os russos veem como um fator de identificação e manutenção das tradições. O maior dos feitos de Putin, entretanto, foi controlar as oligarquias nacionais e deixá-las sob o seu controle;  máfia russa que dominou e controlou a política por anos desde o fim da União Soviética. No âmbito externo, Putin soube dialogar com líderes ocidentais e fazer acordos com seus países, mas sempre foi um crítico feroz da política externa dos países ocidentais e sempre tomou decisões opostas às desses países no âmbito internacional.

    Putin sempre criticou o poder dominador do ocidente, pois via esse grupo de países como opostos à soberania nacional de inúmeras nações e  buscando suprir seus interesses socioeconômicos naqueles países dominados - agem como impérios. Os ocidentais interviram de inúmeras formas em diversos, Putin criticou todas elas. Intervenções diretas, como na Líbia; indiretas - "revoluções coloridas'' -, como na Geórgia; ou sanções econômicas, como no caso da Venezuela e da própria Rússia. 

    Essas formas de ingerências externas não são porque os governos dessas nações são opressores ou antidemocráticos, mas sim porque esses governos não são subordinados ao poderio da OTAN e dos EUA. A cada obstrução, víamos que o Ocidente não estava preocupado com a população dessas nações ou com seus direitos fundamentais, mas com suas buscas frenéticas por zonas de influências; Putin sempre foi um crítico desse esquema. 

    Foi por esses embates que o ocidente, principalmente os norte-americanos, começaram a tratar Putin como um vilão - ou o novo Stalin; essas narrativas mostram mais dos veículos culturais ocidentais, sempre pró-imperialistas e autoritários, do que de Putin e de sua estrutura de governo. O ocidente chegou ao seu limite com o líder russo após a ajuda ao governo Sírio do presidente Bashar Al-Assad - quando seu país passava por uma guerra por procuração -, e com sua atitude frente às manifestações na Ucrânia em 2014 - onde houve interferência externa. Na verdade, a Ucrânia pode mudar totalmente a visão ocidental sobre a Rússia.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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