Olhando para trás, olhando para frente
Tivemos a pior crise econômica desde a depressão dos anos 30 e os diversos governos tomaram decisões diferentes, escolheram rumos distintos para lidar com ela
Somos constantemente bombardeados por notícias, email, alertas, newsletters e às vezes é difícil escolher o que é relevante. Temos que aprender como ler as notícias, conectar os acontecimentos e no fim, tomar decisões importantes, para nossa vida e para nossos investimentos.
Para mim a regra básica é: ignore as notícias diárias e concentre-se nos fundamentos.
Com isto em mente resolvi olhar minhas decisões de investimentos e minhas sugestões aos leitores nos últimos anos e ver o resultado. Vamos começar pelo mais fácil, olhar para trás: tivemos a pior crise econômica desde a depressão dos anos 30 e os diversos governos tomaram decisões diferentes, escolheram rumos distintos para lidar com a crise o que resultou em resultados divergentes (ver gráfico no meu blog).
Começamos com o Brasil: o Governo não usou o boom das commodities para fazer reformas ou os investimentos necessários em infraestrutura - aí incluída a educação. Quando a crise chegou, a resposta do Governo - que entendi correta naquele momento - foi de estimular a economia com medidas de relaxamento fiscal e monetário. Ao mesmo tempo, o Governo menosprezou o tamanho da crise, ignorou a mudança nas condições econômicas e ampliou, por razões politicas, o programa social. O preço das commodities nunca se recuperou e o país começou a apresentar aumento nos déficits, aumento da inflação, estagnação no crescimento nos levando a situação de hoje. Eu acredito em responsabilidade fiscal, portanto quando o governo continuou a agir como se nada tivesse mudado e continuou a gastar como se não houvesse amanhã, me tornei pessimista em relação ao País.
Enquanto isto na China, o crescimento econômico foi motivado pelas politicas e gastos do Governo e exportação. Houve um imenso investimento em infraestrutura, em construção. É por isto que a China estava consumindo todo o minério de ferro disponível estimulando as econômicas da Austrália, Brasil, África do Sul e outros. A China tem hoje os seis maiores portos do mundo, e os seis maiores aeroportos do mundo e estes investimentos não foram uma resposta de mercado. Alguém poderia me acusar de estar sendo contraditória já que acabei de dizer que um dos problemas do Brasil foi a falta de investimento em infraestrutura. O problema é que o Brasil investiu menos do que o requerido pelo mercado e a China investiu muito mais do que o requerido. Isto era insustentável e agora a China tem cidades fantasmas e portos, rodovias e aeroportos subutilizados. Veja o mercado acionário: o governo estimulou o mercado de ações porque achava que um mercado em ascensão era bom para sua imagem. Eles incentivaram investimento em ações feito com dinheiro emprestado. De novo, isto era insustentável porque a economia tinha/tem tantos desequilíbrios e algum dia o declínio aconteceria. Aí o Governo interviu de novo para evitar o declínio- até agora sem muitos resultados.
Portanto a China é um país com um debito enorme, cidades fantasmas, incorporações problemáticas e infraestrutura subutilizada. Como não acredito em economia dirigida pelo Estado fiquei longe da China, com a convicção de que era insustentável. Como resultado aconselhei a não investir na China e eu mesma não investi na China.
Claro que perdi as altas do Mercado acionário da China e do Brasil. E aqueles que seguiram meus conselhos perderam também. A pergunta é se eu me arrependo e a resposta é um sonoro NÃO. No meio tempo eu estava investindo no que acredito: numa economia liderada pelas forças de mercado, que tem uma classe empresarial única e fantástica, que tem um governo que apesar da oposição conseguiu passar um pacote de estimulo no “começo do jogo” (2009) que tem um Banco Central que entendeu a magnitude do problema e imediatamente começou o relaxamento monetário. Talvez o mais importante seja ser uma economia que tem flexibilidade para ajustar. Claro que estou falando dos EUA.
Minha sugestão era investir em companhias americanas e em companhias que poderiam se beneficiar do boom na China e no Brasil. Portanto em vez de tomar diretamente o risco país, apostei na liderança e eficiência das companhias americanas com negócios e vendas no exterior. Qualquer pessoa que acreditasse nisto e tivesse investido seus recursos no índice americano, por exemplo, o SPY (S&P 500 ETF) teria tido um rendimento desde 2009 de 88.6%, ou seja, poderia ter quase dobrado o capital inicial.
Antes de falar mais sobre os Estados Unidos vamos olhar para a Europa depois da crise: quais são os problemas da Europa além do fato de ter colocado economias tão diferentes sob a mesma moeda, retirando a autonomia individual de fazer politica monetária? Como um projeto financiado na Grécia poderia se equivaler a um projeto financiado na França? O resultado só poderia ser má alocação de recursos sem bons resultados. Além disto, não podemos nos esquecer das regulações na Europa, da rigidez do Mercado de trabalho e dos programas sociais. Quando a crise chegou eles insistiram numa politica de austeridade e veja onde esta politica os levou. O ECB resolveu estimular a economia muito tarde e o QE europeu foi anunciado em Janeiro de 2015. Abaixo se pode ver o efeito do anúncio no mercado acionário europeu depois do anúncio e o efeito em Março quando o QE começou efetivamente.
Esta alta eu perdi, e quem me segue perdeu também. Este dói um pouco mais do que China e Brasil porque no mesmo período o mercado americano estava andando de lado. Mas, graças à volatilidade dos últimos meses, graças à China, Grécia e aos últimos indicadores da economia europeia, ainda há tempo para entrar.
O curto e longo prazo: olhando para o futuro.
Embora a economia americana continue indo bem, com queda de desemprego, declínio no déficit, sem inflação, com crescimento econômico, não há como ignorar os desafios. Dada à situação mundial a primeira distinção que o investidor tem que fazer é entre empresas concentradas no mercado doméstico e empresas com parte substancial dos negócios no exterior, portanto mais dependentes da economia mundial e de exportações.
Em segundo lugar, taxa de juros. Um aumento da taxa de juros vai resultar no fim do bull market? Não necessariamente. O que realmente encerra um bull market é recessão. Quanto às taxas de juros, vai depender do ritmo e magnitude do aumento. Minha opinião é que o FED está plenamente consciente do estado da economia mundial e consciente do impacto que um dólar ainda mais forte pode ter nas empresas americanas e do impacto de um menor crescimento econômico no mundo. Minha visão é de que as condições econômicas NÃO estão pedindo um aumento na taxa de juros, mas o FED quase que se sente obrigado a aumenta-la.
Portanto há uma possibilidade, remota, que não haja aumento este ano. Ou talvez eles façam um pequeno aumento e não façam mais nada em 2016. A não ser que as condições mudem.
A economia Americana ainda está bem e a questão é se isto vai se refletir no Mercado acionário. De novo, não necessariamente. A temporada de resultados está chegando ao fim e mais de 88% das empresas já anunciaram resultados. Destas, quase 70% apresentaram resultados melhores do que os esperados, mas somente 49% tiveram receitas maiores do que as esperadas e isto pode ser atribuído ao dólar forte e menor crescimento em mercados externos. Isto também explica a volatilidade que temos observado: sem contar China e Grécia, cada vez que uma empresa rebaixa as perspectivas futuras, o mercado treme.
Olhando para frente, e em relação a minha ultima carta mensal eu mudei minha visão: eu era cética em relação à China, mas agora penso que ainda não vimos o pior e o mesmo se aplica ao Brasil: é possível que tenhamos mais alguns anos com más noticias. Estava cética em relação à Europa, mas agora, com a postergação do problema Grego e apesar dos dados negativos publicados recentemente, há alguma razão para o otimismo. Mas ainda é uma aposta arriscada.
Embora 2015 não tenha sido um bom ano para o mercado acionário, mantenha o foco no longo prazo, mantenha suas ações de boa qualidade e tome um dramamine.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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