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Alex Solnik

Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais "Porque não deu certo", "O Cofre do Adhemar", "A guerra do apagão" e "O domador de sonhos"

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Pazuello infringiu regra militar; Bolsonaro fez apologia de golpe de estado

"A cada vez que Bolsonaro e seus aliados usam o artigo 142 para justificar a implantação de uma ditadura estão fazendo apologia de um crime, o que ocorreu mais uma vez no domingo em que o general Pazuello subiu ao palanque de Bolsonaro", escreve o jornalista Alex Solnik

O presidente Jair Bolsonaro e o ex-ministro Eduardo Pazuello durante passeio de moto, que gerou aglomeração na cidade do Rio de Janeiro. (Foto: Alan Santos/PR)

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Por Alex Solnik

Num estudo realizado em 2001, publicado na Revista “Pesquisa Fapesp”, o cientista político Eliézer Rizzo de Oliveira, da Unicamp, observou que “o deputado federal Jair Bolsonaro (PPB-RJ)” era o primeiro na “lista de congressistas com visão mais aprofundada das Forças Armadas”.

Nesse estudo, intitulado “Forças Armadas e democracia: o papel do Poder Legislativo”, Eliézer alerta que “a política nacional na área militar é um ato isolado do presidente” e critica o Congresso pelo desconhecimento e desinteresse por questões militares:

“O Congresso deveria ser corresponsável pela política de Defesa Nacional”.

Ele atribui à falta de conhecimento equívocos como o de 1992, quando o presidente Fernando Henrique chamou o Exército para policiar o Rio de Janeiro durante a Eco-92. Fato que foi encarado como normal pelo Congresso, pela mídia e pela opinião pública.

“Essa visão dos parlamentares é equivocada. Não se deve militarizar a segurança pública”, observava o cientista político, há 20 anos.

Ele também já aborda a questão do artigo 142 que, entre a promulgação da constituição e julho de 1991 facultava a qualquer prefeito, vereador, deputado ou juiz chamar tropas federais para resolver conflitos.

Em novembro de 1988, um juiz convocou o Exército para controlar uma greve pacífica na Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda. Como sempre ocorre quando soldados fazem papel de policiais, o resultado foi escrito com sangue: três grevistas mortos. Quartel não tem algemas. Soldado não prende; mata.

A militarização da segurança pública chegou ao auge no governo Temer, que nomeou o general Braga Netto comandante da intervenção militar na Segurança Pública no Rio de Janeiro em 16 de fevereiro de 2018. No dia 14 de março a vereadora Marielle Franco e seu motorista foram assassinados em circunstâncias até hoje mal esclarecidas.

Punições a generais têm relação direta com o ambiente político do país, mais ou menos democrático.

No dia 22 de outubro de 2015, durante o governo Dilma Rousseff, o general José Carlos Cardoso, comandante da 3a Divisão do Exército promoveu uma homenagem póstuma ao coronel Brilhante Ustra, torturador e chefe de torturadores do DOI-Codi de São Paulo durante a ditadura militar, morto a 15 de outubro, num quartel de Santa Maria (RGS), cidade natal do criminoso.

Seu superior, general Hamilton Mourão, Comandante Militar do Sul, fez vistas grossas.

Mourão era useiro e vezeiro em fazer manifestações políticas, sempre a favor de regimes autoritários. Chegou a convocar os presentes a uma reunião para “o despertar de uma luta patriótica” contra a presidente Dilma, cujo impeachment ele defendia abertamente:

“A vantagem da mudança seria do descarte da incompetência, má gestão e corrupção”.

Nenhuma dessas provocações incomodou seu superior, o comandante do Exército, general Eduardo Villas Boas, mas a homenagem ao torturador, tolerada por ele, foi a gota d’água.

Mourão foi derrubado do comando – e substituído pelo general Edson Leal Pujol – para exercer um serviço burocrático, longe da tropa. O Ministro da Defesa era Aldo Rebelo.

O general não abandonou, porém, seu discurso golpista. A 17 de setembro de 2017, em pleno governo Temer, numa conferência na Loja Maçônica de Brasília, fez pronunciamento político ameaçador:

“Ou as instituições solucionam o problema político, pela ação do Judiciário, retirando da vida pública esses elementos envolvidos em todos os ilícitos ou nós teremos que impor isso. Se tiver que haver, haverá”.

O comandante do Exército, o mesmo general Eduardo Villas Boas que punira Mourão dois anos antes, dessa vez contemporizou:

“Ele é um bom soldado”.

O ministro da Defesa, Raul Jungman, pediu punição, “pero no mucho”. Sabia que Mourão tinha respaldo de generais importantes, como Augusto Heleno, que declarou:

“Ele apenas explicou, de modo claro e honesto, o conteúdo do dispositivo da constituição de 1988”.

Mais uma referência à deturpada interpretação do artigo 142, dando a entender que ele faculta os militares a darem um golpe de estado.

Um absurdo, já que o artigo 5o. inciso XLIV da mesma constituição do artigo 142 afirma que derrubar a democracia é crime inafiançável e imprescritível, inclusive por forças militares:

“É crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado democrático”.

A cada vez que Bolsonaro e seus aliados usam o artigo 142 para justificar a implantação de uma ditadura estão fazendo apologia de um crime, o que ocorreu mais uma vez no domingo em que o general Pazuello subiu ao palanque de Bolsonaro.

Embora esteja mais em destaque na imprensa a polêmica de punir ou não punir Pazuello, o crime de Bolsonaro foi mais grave que o do ex-ministro da Saúde: Pazuello infringiu regra militar; Bolsonaro conspirou contra a democracia.

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