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Pedro Paiva

Jornalista, mora em Nova York. Foi produtor e repórter do América News, jornal do canal internacional da Globo feito para a comunidade brasileiros nos Estados Unidos. É colaborador da Revista Híbrida e da USBRTV nos Estados Unidos. Acompanha a política estadunidense e outros temas importantes do país

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Perdidos no mar, a vida de um bilionário vale mais que a de um imigrante

Imagine se no lugar de 4 bilionários e um CEO irresponsável, no submarino estivessem 5 imigrantes

Bilionário britânico Hamish Harding estava a bordo de submarino desaparecido em passeio até o Titanic (Foto: Reprodução)

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O mundo parou para assistir aos esforços dos Estados Unidos e do Canadá para resgatar um submarino que fazia visitas aos destroços do Titanic, no Atlântico Norte. Dentro da embarcação improvisada, bilionários que pagaram mais de R$1 milhão cada pelo passeio. O assunto não sai dos noticiários e todos contam quantas horas de oxigênio ainda resta no submarino. Tamanha comoção, porém, não é vista quando embarcações repletas de imigrantes pobres se perdem nas águas do Caribe, do sul da Califórnia ou do mar Mediterrâneo.

O caso mais recente aconteceu na costa sudoeste da Grécia. Um barco, carregando aproximadamente 750 migrantes que iam para a Itália, naufragou sob circunstâncias suspeitas. Eles não estavam desaparecidos. Muito pelo contrário, tinham sido avistados pela guarda costeira grega. Ainda que relatos de sobreviventes afirmam que o barco estava parado havia horas, eles não foram resgatados. O barco afundou e aproximadamente 500 pessoas seguem desaparecidas. Um número 100 vezes maior que o do submarino e, ainda assim, uma cobertura bem menor por parte da mídia.

Em janeiro do ano passado, a guarda costeira dos Estados Unidos iniciou uma busca por 39 migrantes de Cuba, do Haiti e da República Dominicana que desapareceram nas águas do Caribe, próximo à costa da Flórida. Eles tinham partido das Bahamas, um caminho perigoso  e cada vez mais utilizado por migrantes que não vislumbram entrar nos EUA por vias legais. O assunto morreu rápido, tal qual a quase totalidade daqueles a bordo. Um número de pessoas quase 8 vezes maior que o do submarino e, de novo, uma cobertura midiática muito aquém da tragédia.

O tráfico de pessoas pelo mar, diga-se de passagem, é um negócio lucrativo. Ainda mais quando as políticas imigratórias se destinam a dificultar a entrada de imigrantes, como no caso dos Estados Unidos. De acordo com uma reportagem do New York Times, traficantes cobram até US$70 mil por pessoa para fazer a travessia de Tijuana, no México, até o sul da Califórnia. Tudo isso, claro, em embarcações precárias que não seguem nenhum tipo de protocolo de segurança - tal qual o submarino em questão.

Mas se travessias acontecem, é porque muitos chegam ao destino final. E se chegam, é porque não passam pelo radar da Guarda Costeira. Não precisa ser nenhum gênio para constatar que, se muitos chegam à costa dos EUA, muitos também se perdem no caminho sem que tenhamos notícias. Não fosse tamanha a irresponsabilidade, todos os recursos que estão hoje sendo usados para buscar 4 bilionários que resolveram se aventurar em um submarino (sabidamente improvisado!) poderiam ser usados para evitar desastres como esses, mas isso não é falado na grande mídia que lucra com o sensacionalismo da história.

Espero que eles sejam encontrados, são e salvos. Dito isto, convido vocês a fazer um exercício: imagine se no lugar de 4 bilionários e um CEO irresponsável, no submarino estivessem 5 imigrantes. Não só o auê todo seria menor, tal qual a história nos mostra, como também barbaridades estariam sendo ditas pelos mesmos de sempre. Não é difícil imaginar figuras como Ron DeSantis e Donald Trump questionando o uso do “dinheiro dos pagadores de impostos” para salvar a vida de “ilegais”. Mas usar esse dinheiro para salvar bilionário… aí tudo bem.

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