PL 1904. A criminalização por ser mulher
Não é fácil ser mulher
Não é fácil ser mulher. A todo o momento são cercadas de pressão afetiva, estética, cultural, profissional, biológica e ainda têm que lutar contra uma classe de homens conservadores religiosos, impondo suas regras para criminalizar mais ainda a mulher na sociedade. Onde foi que tudo desandou? Onde foi o marco zero? Antes os povos pagãos reverenciavam a mulher, tendo deusas e com uma sociedade que podia ser matriarcal também. Se antes, os afetos dos povos indígenas, segundo o trabalho da Dra. Kimberly Tallbear do povo Sisseton-Wahpeton Oyate, podiam tanto ser por vários humanos, os amores pela natureza eram mais duradouros. Ou seja, os amores não eram apenas cultivados por seres humanos, mas também entre seres humanos e a natureza que os cerca, mostrando que a sabedoria e respeito pelo ser vivente e seu espaço eram muito bem respeitados.
A extrema-direita fundamentalista, baseado apenas nas pautas de costumes, apresentou a barbaridade do PL 1904, que criminaliza a mulher no caso de um aborto criminoso ou por anencefalia que é respaldado hoje pela lei federal, coloca essa mulher na prisão por mais tempo que seu algoz. Esses mesmos fundamentalistas trazem uma pauta muito polêmica, pois misturam o assunto para o senso comum e no final colocam Deus como avalista de suas atrocidades. Foucault já trazia que a grande diferença das crenças religiosas estava nos homens e pontuava que existem duas religiões. A religião natural que seria a relação direta do ser humano com a divindade e a religião positiva que são o conjunto de leis, regras, dispositivos dessas organizações religiosas. E nesse momento, existe a falha. Quem são esses que escrevem essas leis e por quê? Tivemos um período negro na história da humanidade com a Inquisição, caça às bruxas e anticiência.
O autor do PL, Sóstenes Cavalcante, matou uma idosa em um acidente de trânsito em 2022 e cuidou para que tudo fosse abafado. O mesmo que diz defender a vida. Seu carro blindado em alta velocidade ceifou a vida de Irma Diniz da Cruz de 81 anos. Se lembrarmos de que no Brasil, quando não conseguiam escravizar os povos indígenas, matavam e estupravam suas mulheres, roubavam as terras e acabavam com os rios, evangelizavam os povos indígenas para trazer o projeto civilizatório branco e dominador. Já existiam os chamados “homens de bem” desde o início da colonização no país, já perpetuando diversas violências aos povos indígenas e seu amor pela vida.
A cada oito minutos, uma mulher ou menina é estuprada no Brasil. Aborto não é uma questão religiosa e sim problema de saúde pública. Como tal, devem ter políticas públicas de segurança acoplado ao acolhimento, tratamento e cuidados psicológicos dessa mãe. Se depois de tudo isso ainda tenta colocar essa mãe ou menina na prisão, estamos vivenciando The Handmaid's Tale da vida real. O corpo feminino sempre foi tratado pela posse do masculino ou através do poder na sociedade. Embora nosso Estado seja laico, quem tenta se apoderar desse Estado são as igrejas pentecostais de direita, que já estão trabalhando nesse projeto de poder há algumas décadas, para impor pautas de costumes. Afinal, está em Coríntio 1, capítulo 7, versículo 4: “A mulher não pode dispor de seu corpo: ele pertence ao seu marido.” Isso justificava crimes de legítima defesa da honra para homens que se diziam traídos.
Depois da urgência do PL do Estupro, que agora foi adiada diante da repercussão negativa na população brasileira, inclusive de evangélicos, a Câmara pauta a PEC 9, que representa a anistia aos partidos políticos que não cumpriram as cotas de mulheres, negros e negras. As pautas da extrema direita uma atrás da outra para criar cortina de fumaça para algo que poderá ser votado com urgência para proteger esses mesmos políticos ditos “do bem”.
Em tempo: ou os homens mudam suas atitudes e abraçam a causa feminina por uma grande reparação histórica ou passam a frequentar psicólogos para aprenderem a evoluir.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular
Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: