TV 247 logo
    Lejeune Mirhan avatar

    Lejeune Mirhan

    Sociólogo, Professor (aposentado), Escritor e Analista Internacional. Foi professor de Sociologia e Métodos e Técnicas de Pesquisa da UNIMEP e presidente da Federação Nacional dos Sociólogos – Brasil

    90 artigos

    HOME > blog

    Primeiras medidas de Biden e minhas previsões: Nosso mundo continua altamente inseguro

    O imperialismo eventualmente poderá vir a ser menos agressivo, como disse, não pela bondade, mas pelo avanço das lutas dos povos

    O presidente dos EUA, Joe Biden, fala durante sua posse como 46º presidente dos Estados Unidos na Frente Oeste do Capitólio dos EUA, em Washington, nesta quarta (20) (Foto: Kevin Lamarque/Reuters)

    ✅ Receba as notícias do Brasil 247 e da TV 247 no Telegram do 247 e no canal do 247 no WhatsApp.

    No dia 17 de novembro publiquei um grande ensaio sobre como seria o mundo depois da gestão Donald Trump (1), sob o comando de Joe Biden. Eu mencionei temas que eu tenho certeza que ele não mexerá, temas que eu tinha certeza que ele mexeria, mas a maioria eram temas que ele até podería fazer alterações em termos de rumo, mas que não tinha certeza disso. Passados duas semanas da sua posse, apresento um primeiro balanço e menciono os aspectos positivos internos de sua nova gestão e as dúvidas sobre a política externa. 

    Quero iniciar este trabalho de revisão com a publicação de forma resumida, das principais medidas adotadas internamente pelo novo presidente estadunidense. Ele tem assinado diariamente dezenas das chamadas ordens executivas, algo como equivalente aos nossos antigos decretos-lei. São orientações emanadas do executivo federal que devem ser observadas pelo conjunto da máquina pública dos Estados Unidos que, aliás, não é nada pequena.

    Apresentarei essas medidas dividindo-as em quatro grandes blocos, sem entrar em maiores detalhes da mesma. Todas as medidas adotadas até o dia 27 de janeiro – portanto em uma semana desde sua posse – podem ser lidas no site da NBC News.

    De um modo geral, quero registrar que já havia previsto que Biden poderia vir a ser, para os estadunidenses, um bom presidente. As suas medidas tem sido na linha de desmontar todas as maldades feitas em quatro anos pelo governo Trump, em especial discriminatórias, cerceadoras de liberdades de pessoas (dependendo de sua origem) e de instituições (em especial que prestam serviços de apoio aos imigrantes). 

    A seguir essa linha até o final de seu mandato, seguramente eu o incluirei na lista dos quatro menos ruins (nos EUA não se pode dizer que existam presidentes bons) presidentes dos EUA em toda a sua história (de meu ponto de vista são: Abraham Lincoln, Franklin Delano Roosevelt, Jimmy Carter e Woodrow Wilson). 

    1. Bloco de medidas sobre a diversidade

    Parece que o campo dos direitos civis, da diversidade, do apoio às lutas dos movimentos LGBTQI+ além de serem as primeiras, foram em maior número. Além dele nomear a primeira secretária transexual (aqui para nós equivale a ministra), que é a Rachel Levine, da Saúde, nomeou pela primeira vez um homossexual assumido, que é o Pete Buttieg.

    Com relação ainda à pessoas transexuais, havia uma ordem executiva de Trump que proibia que transgêneros pudessem se alistar nas forças armadas (a proibição de alistamento de homossexuais já havia caído há mais tempo). Pois Biden revogou essa que era uma das últimas formas de discriminações contra pessoas com orientações sexuais diferentes de uma parte da sociedade. Não tenho dúvida que são medidas positivas para essa comunidade tão discriminada na sociedade. 

    Ele emitiu também uma ordem executiva para que fossem feitos os levantamentos sobre a equidade, no sentido do equilíbrio em termos de percentuais, entre as repartições federais de negros e brancos e outras etnias.

    Por fim, nomeou a primeira índia no cargo poderoso de secretária do Interior, que cuidará da demarcação de terras indígenas no país, além de palpitar sobre esse tema em todo o mundo, pois eles se acham chefes do mundo. Trata-se de Debra Haaland, deputada democrata pelo estado do Novo México. Ela é dura crítica ao governo Bolsonaro e sua política ambiental e indigenista que queima nossas matas e mata nossos índios. 

    2. Meio Ambiente

    Aqui, como se diz popularmente, foi “pule de dez” que os EUA voltariam incondicionalmente para o Clube de Paris (Conferência do Clima ou COP 21). Essa foi uma das primeiras medidas. Mas, ele fez mais do que isso. Indicou a mudança da matriz energética atual, completamente dependente do petróleo, para uma matriz limpa. Isso é extremamente positivo.

    Também, através de uma das suas medidas executivas, determinou a paralisação da construção do oleoduto que vem do Canadá, chamado Keystone XL, que atravessa muitas terras indígenas e é extremamente polêmico. 

    3. Direitos Humanos

    Esse tema, pelo menos desde Carter que tomou posse em janeiro de 1977, é um dos temas mais caros para o Partido Democrata. Nessa área ele assinou várias ordens executivas. Talvez a de maior repercussão seja a revogação de uma ordem que proibia que qualquer pessoa oriunda de países com populações majoritariamente muçulmanas, ficasse proibido de viajar aos EUA. 

    São 47 os países que são membros da Organização da Conferência Islâmica, que representam quase dois bilhões de pessoas, que passam a ter o direito – dentro das normas e regras do trânsito internacional de turistas – de viajar aos Estados Unidos, seja lá a qualquer interesse. 

    Biden determinou a interrupção da construção do muro que separa os EUA e o México, onde não se pode mais usar dinheiro público. É bem verdade que ele não determinou a sua demolição, mas é positivo que pare a sua construção.

    Biden também revogou uma medida repressiva adotada por Donald Trump, que proibia a atuação nos Estados Unidos, de entidades e instituições que prestam auxílio e ajuda humanitária às pessoas indocumentadas (ilegais), vindas de várias partes do mundo. Foi promessa de sua campanha legalizar 11 milhões de pessoas nessas condições. 

    Por fim – e de forma surpreendente –, Biden determinou a federalização de todos os presídios que haviam sido terceirizados pelos governos anteriores – quaisquer que tenham sido eles, democratas ou republicanos – de forma que determinou o rompimento de todos os acordos de terceirização e privatização desses presídios federais. É importante dizer que no Brasil, à exceção de alguns estados, isso ainda não é uma regra geral. Sabe-se que Dória pretende fazê-lo em SP, mas depois dessa atitude do chefe do império deve repensar a ideia. 

    4. Combate à pandemia

    Não pretendo aqui enchê-los de números sobre essa praga mundial que assola a humanidade neste momento histórico. Mas, no momento que escrevo este trabalho, já são 112.237.314 contaminados em escala mundial, dos quais 2.245.987 mortos. Os três países governados por direitistas e de maior relevância no mundo – EUA (até 20 de janeiro), Brasil e Índia – respondem por 55.210.748 contaminados (exatos 49,19%), ou seja quase metade de toda a contaminação da Terra. Quanto aos mortos, essa tríade responde por 832.354 mortos, ou 37,05% do total (4). 

    Todos os cientistas do mundo – os sérios, claro – sabem que a máquina dos governos nacionais/federais são fundamentais – vitais na verdade –, para ajudar no controle da pandemia, na decretação de regras rígidas de isolamento, no investimento maciço em bilhões de dólares em ciência, pesquisa, vacinas, equipamentos hospitalares, pessoal de apoio e combate à pandemia e, principalmente, canalização de recursos para as famílias mais desfavorecidas e até auxílio às pequenas e médias empresas com suas folhas de pagamento e alugueis. 

    Nesse sentido, é muito claro para o mundo que os governos dos EUA (até 20 de janeiro), Brasil e Índia, se enquadram entre os governos que nada fizeram. No entanto, no caso dos Estados Unidos, com a posse de Joe Biden, o combate à pandemia passa a ser tema de estado, por assim dizer. Biden instala em uma sala ao lado da sua na Casa Branca, o maior cientista dos EUA para a epidemia. Anuncia que pretende vacinar de imediato até cem milhões de pessoas. 

    Uma das suas primeiras medidas foi a do retorno dos Estados Unidos à Organização Mundial de Saúde, que Trump havia se desligado e, portanto, deixado de contribuir com os cerca de 250 milhões de dólares que é a cota parte dos EUA para a Organização. Biden decidiu que vai fortalecer a OMS, como já fazem a China e a Rússia.

    Mas, e sobre a política externa?

    No meu mencionado ensaio de novembro de 2020, eu apresento um conjunto de ações e temas na política internacional que ainda não se sabe qual será a proposta do presidente. Ou, como se diz popularmente, ele não disse a que veio ainda nesses temas delicados. Passo a listar todos eles.

    1. Sobre o Irã

    O acordo nuclear com a República Islâmica do Irã é de 2016, estabelecido na gestão de Barak Obama em seu último ano de governo. Trump assim que toma posse, trata de revogar tudo isso, denunciando o acordo, ou seja, saiu fora. Mas, os outros quatro membros do CS/ONU seguiram firme junto com a Alemanha. O próprio secretário de Estado, Anthony Blinken, foi um dos negociadores do referido acordo.

    Eu indiquei no trabalho que acho que é muito provável que os EUA retornem ao acordo. Interessa muito a esse país e seu aliado no Oriente Médio, que é Israel, ter um certo controle do desenvolvimento da tecnologia nuclear na nação persa. 

    Ocorre que o Irã viu-se desobrigado de cumprir as cláusulas que estabelecem os percentuais máximos de enriquecimento do seu urânico para fins de energia, ciência e medicina nuclear. Em anúncio recente, o Irã disse que atingiria os 5% de enriquecimento e que poderia até chegar aos 20% (sabe-se que para fabricar um artefato nuclear é preciso atingir 90% e o país não só não tem essa capacidade, como, mesmo se tivesse, tem posição de não querer ter nenhuma bomba nuclear sob seu comando).

    Vimos observando que Israel ameaça os EUA, advertindo-os que se eles voltassem ao acordo nuclear e retirassem quaisquer sanções contra o Irã eles poderiam atacar aquele país. Se isso vier a ocorrer, o Irã seguramente responderá. E o país persa tem hoje uma capacidade dissuasiva imensa, com seus mísseis de defesa que atingem mais de 10 mil quilômetros. Isso sem falar no assassinato até agora de quatro dos mais importantes cientistas nucleares do país.

    Esse seguramente é um dos mais tensos problemas que Biden terá que se posicionar e dizer a que veio. Não dá para ficar em cima do muro neste caso, pois a cobrança de seus aliados no Oriente Médio é muito grande. Vamos ver como ocorrerão os desdobramentos.

    2. Sanções ilegais e unilaterais

    Como diz Noam Chomsky, como pode um país como os EUA governarem sancionando outros países cujos governos não têm a mesma linha política que eles desejam? Qual o limite dessa política? Em tese, a sanção a um país é mesmo para estrangulá-lo economicamente de tal forma que as coisas de primeira necessidade faltem para o povo consumir e, em tese, esse mesmo povo se rebelaria contra esses governos (que não são amigos dos EUA) e o derrubariam. Isso jamais funcionou em nenhum lugar onde elas foram aplicadas. Serviu apenas para impor sofrimentos e sacrifícios aos povos do mundo inteiro, em especial de países que lutam contra a política imperialista estadunidense.

    Apenas para citar dois exemplos. Com o final da primeira agressão ao Iraque em fevereiro de 1991, este país ficou sob bloqueio aéreo e com sanções. Até março de 2003, quando sobre nova invasão – ou seja, em 12 anos – as estatísticas mostram que morreram dois milhões de iraquianos vítimas de fome e falta de medicamentos. Na Venezuela, com o bloqueio, o país deixou de importar insulina. Fala-se na morte de mais de 40 mil pessoas que necessitavam desse medicamento. 

    3. A Paz na Palestina

    Até agora estamos vendo o total silêncio de Joe Biden. Em 12 anos de governos de extrema direita de Nethanyahu (no próximo dia 31 de março, ele completará exatos 12 anos de poder, o mais longevo primeiro Ministro israelense em 72 anos de história desse país) nada foi feito para debater a paz na Palestina, para a criação de seu estado nacional com fronteiras delimitadas e com o pleno direito dos palestinos poderem votar na Assembleia Geral das Nações Unidas, nada andou, nada foi para frente, nenhuma negociação foi instalada. 

    Não há mesa de negociação de paz na Palestina. Os palestinos seguem sendo o povo que vive a mais longa ocupação por potência estrangeira nos tempos recentes. Todos os presidentes anteriores sempre tentaram melhorar as relações e avançar em alguma conquista rumo à paz. Mas, nesses 12 anos da era Nethanyahu, parece que tudo andou para trás. Biden conseguirá mudar essa realidade? 

    4. Relações diplomáticas com Cuba

    Já vimos em trabalhos anteriores que o presidente Barak Obama restabeleceu relações diplomáticas com Cuba. Mas, manteve muitas das sanções contra aquele pequenino mas aguerrido país com seu combativo povo cubano. 

    A famigerada lei (de ação extraterritorial) denominada Helms-Burns (de 6 de março de 1996) segue em vigor de forma que navios de armadas de quaisquer países que levem mercadorias para Cuba ou de lá as peguem para levar a outros países, estarão sujeitos à sanções estadunidense, sendo que a pior delas é que essas embarcações ficariam proibidas de aportarem em qualquer porto dos EUA. Uma lei odiosa e que fere completamente o direito internacional. 

    A expectativa não só da minha parte, mas de toda a comunidade internacional, é que Biden deveria retornar pelo menos ao patamar onde Obama deixou e até mesmo avançar em mais algumas coisas (voos regulares, remessas de dinheiro, cotas maiores de ingressos de turistas etc.). Estamos todos na expectativa que voltem a se normalizar as relações diplomáticas. 

    5. Retirada de tropas

    Quando Obama se elegeu em novembro de 2008, disse que retiraria as tropas do Iraque. Tomou posse em janeiro de 2009 e só retirou – parte das tropas – em 2012. Deixou lá uns seis mil soldados ainda. Trump se elegeu em novembro de 2016 e prometeu retirar as tropas da Síria e do Iraque. Tomou posse em janeiro de 2017 e passaram-se quatro anos e nenhum soldado foi chamado de volta.

    Biden, é bem verdade, não mencionou especificamente a retirada dessas tropas em sua campanha. Síria, Iraque e – principalmente – Afeganistão, que em outubro próximo completará 20 anos de ocupação, esta que é a mais longa ocupação militar de outro país por parte dos Estados Unidos.

    Há uma forte expectativa de que Biden chamaria de volta pelo menos as tropas restantes no Iraque e as que dão suporte para os terroristas na Síria, do chamado Estado Islâmico (que, como dito, não é nem estado e nem islâmico pelas barbaridades que pratica, as quais nenhum muçulmano verdadeiramente seguidor do Corão faria).

    No caso do Iraque especificamente, eles ainda têm cinco bases militares (uma delas foi inteiramente destruída por um míssil iraniano disparado após o assassinato do general Qaseem Suleimani em 3 de janeiro de 2020). O parlamento iraquiano aprovou por unanimidade em 7 de janeiro uma moção pela retirada das tropas, que jamais foi cumprida pela gestão Donald Trump.

    Há uma expectativa geral na comunidade internacional que, finalmente, essas tropas possam ser retiradas. Mas, Biden tomou posse já há duas semanas e não deu nenhum sinal que isso ocorrerá. 

    6. Relações com a China

    A questão da República Popular da China, foi foco das maiores tensões no governo Trump, que impôs várias sanções, apesar de ser o maior comprador desse país, com importações na casa dos 500 bilhões de dólares (exporta para a China apenas cem bilhões, gerando um déficit astronômico de 400 bilhões).

    Fala-se em “desacoplamento” da economia estadunidense da economia chinesa. Acho isso quase impossível, tamanha a dependência dos chineses para a indústria nos EUA, tanto em produtos de empresa norte-americanas cujas plantas principais ficam na China, quanto pelo fato que insumos, peças e produtos agrícolas e outras mercadorias vêm da China e não há mercado que possa suprir isso. Não vejo saída.

    Desde o governo Obama a política externa dos EUA vem se caracterizando pela tentativa de contenção da China. De todas as formas. Inclusive militar, com a ostensiva presença da Frota do Pacífico navegando no mar do Sul da China e no estreito de Taiwan, que é mar territorial chinês, pois Taiwan pertence à China e isso jamais será alterado.

    Não sabemos onde essas provocações podem chegar. Existem autores que até mencionam uma certa predestinação da China confrontar-se com os Estados, como o Prof. Graham Alison  (5), cientista política de Harvard. Do ponto de vista dos chineses, o que se busca é a paz mundial, a harmonia, o desenvolvimento e a busca por um mundo próspero, sem miséria e pobreza. Esses jamais foram os objetivos dos norte-americanos. 

    Recentemente, pela primeira vez a chancelaria chinesa emitiu uma nota com um teor altamente inusitado. Afirmaram que se Taiwan decretasse sua independência isso significaria a guerra. Mas, diretamente a ilha de Taiwan não disse que proclamaria essa independência. Mas, essa “província rebelde” como chamam os chineses, é governada por maioria independentistas. É protetorado dos EUA, apesar deste não ter nenhuma relação diplomática com a ilha e não a reconhecer como “país” (eles se dizem República da China e são reconhecidos dessa forma por apenas 15 países com as quais a China, por certo, não possui nenhuma relação).

    Se as coisas pioraram e as tensões seguirem elevadas, sabemos que pode ocorrer, mesmo que de forma não deliberativa, uma agressão, um disparo de míssil. Isso ficaria incontrolável, pois os chineses revidariam imediatamente. E se vier uma agressão primeiro de Taiwan e a China usar seu direito de defesa, de que lado ficarão os EUA? Acho que da ilha! Vamos conferir.

    7. Venezuela

    Esse é um dos temas mais delicados na política externa que o novo presidente dos EUA irá enfrentar. Seu secretário de Estado Anthony Blinken, referendado pelo Senado no dia 26 de janeiro, na sua sabatina naquela casa disse que, se dependesse dele, os EUA iriam “arrochar” ainda mais a República Bolivariana da Venezuela. 

    Em uma outra ocasião, Blinken chegou a dizer que os EUA seguiriam reconhecendo o obscuro e inexpressivo Juan Guaidó como “presidente” (sic) daquele país, possuidor da maior reserva petrolífera da Terra. Achei isso muito estranho, na medida que a União Europeia já declarou que não mais o reconhecerá nessa condição, mas a de simples “aliado diplomático (o que ainda assim é um absurdo).

    Em uma decisão surpreendente, nos últimos dias o presidente dos EUA desbloqueou as operações via portos e aeroportos com relação às movimentações e transportes vindas ou chegando à Venezuela. Isso pode indicar um primeiro passo no sentido da normalização da relação diplomática e diminuição das tensões na América Latina (6).

    Venho dizendo nos últimos dias que o bloqueio á Venezuela é prejudicial aos EUA, especialmente em função da compra e venda do petróleo venezuelano. Além de ser de melhor qualidade (maior octanagem), transportar óleo por petroleiros entre os portos de Caracas até os EUA, passando pelo Golfo do México, a distância é muito menor. 

    Calculei essa distância. Um petroleiro saindo de Caracas Bay navegando até Miami, percorre uma distância de 1.533 milhas náuticas, que corresponde a 2.839 quilômetros (cada milha náutica corresponde a 1,852 Km). Se o petroleiro partir de Jedda Islamic Port na Arábia Saudita, ele navega exatos 7.393 milhas, ou 13.691 quilômetros, isso significa exatos 380% a mais. O frete é imensamente maior, assim como o seguro total por distância percorrida. Ou seja, os EUA só teriam a ganhar se voltassem a comprar petróleo de seu vizinho.

    Conclusões

    Como disse acima, Biden concorre para ser um dos melhores presidentes dos EUA entre os seus 46 presidentes. É o segundo de apenas dois presidentes católicos em toda a história estadunidense (o primeiro tinha sido Kennedy). Não é simples ser católico em uma Nação com maioria esmagadora de protestantes de diversas correntes. E, temos que levar em conta, que o atual papado de Francisco é dos mais progressista da história da Igreja Católica. Sua formação cristã e vinculado às lutas dos direitos civis das minorias na décadas de 1960 pode fazer dele, com esse conjunto de muitas medidas progressistas já adotadas, de fato, um bom e até um dos melhores presidentes.

    A questão central é a sua política externa. Ser bom para o povo estadunidense ele não faz mais do que sua obrigação e cumprir suas promessas de campanha. Mas, a questão é como ele será para o resto do mundo. Para mim, para vocês que me leem, para os árabes, para os chineses, europeus e bilhões de pessoas que, de alguma forma ou de outra, sofrem a influência dos EUA (seja boa ou má). 

    Eu penso que há uma tendência inevitável que o mundo seja mais multipolar e mais multilateral (que não é a mesma coisa, claro). A dúvida é: será que esse mundo, que caminha de forma acelerada para a finalização da transição da unipolaridade para a multipolaridade, será mais ou menos tenso. Chegou-se a falar na inevitabilidade de um confronto mundial, até mesmo nuclear entre os EUA  e a China. Não creio nisso.

    Como disse no meu ensaio de 17 de novembro, tem duas coisas que eu tenho certeza que Biden jamais fará: 1. Colocar um fim ao sistema capitalista financeiro (ele não tem vocação para ser o Gorbachev estadunidense que foi coveiro do socialismo) e 2. Ele não abrirá mão jamais de tentar de todas as formas, manter os EUA na liderança mundial. Um trabalho publicado sobre ele, continha uma frase sua que dizia mais ou menos assim: “Vou defender que os EUA mantenham-se à cabeceira da mesa”. Até um amigo que contesta meu otimismo – moderado, é bem verdade – sobre mudanças no Império, ao me mostrar o artigo de forma esfuziante, ao que eu lhe respondi: “Camarada, mas você está estranhando o que nesse artigo? Eu estranharia se ele não dissesse exatamente isso”. 

    Quando afirmo que o mundo poderá sim ser menos tenso, como marxista e dialético, quero dizer que isso só é e será possível, não pela “bondade” do chefe do imperialismo, mas exatamente porque a correlação de forças está sendo alterada em todo o mundo, a nossa favor, em especial pela força e a potência já manifestada pela República Popular da China. E o crescimento da força da Federação Russa. 

    O imperialismo eventualmente poderá vir a ser menos agressivo, como disse, não pela bondade, mas pelo avanço das lutas dos povos. Negar isso é não ser dialético. Por isso venho contestando com veemência as análises que alguns amigos/as têm feito (poucos é verdade), na linha de que “nada vai mudar” ou ainda “é tudo igual, a mesma coisa, farinha do mesmo saco”. Não é verdade. Se assim fosse, por que a luta ferrenha de Trump para não deixar o poder? Há algo de diferente sim. Vamos ver o que vem pela frente. 

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

    iBest: 247 é o melhor canal de política do Brasil no voto popular

    Assine o 247, apoie por Pix, inscreva-se na TV 247, no canal Cortes 247 e assista: