Queda de braço com a Petrobrás
Que forças são essas, que enfrentam o presidente da República, o presidente da Câmara dos Deputados, o presidente do Banco Central, todos críticos da política de preços em vigor?
A queda de braço em curso em torno da política de preços de combustíveis e de
petroquímicos praticada pela Petrobrás evidencia a força dos protagonistas. De um lado,
o presidente Bolsonaro, que em fevereiro último afastou da empresa o seu presidente
Castello Branco, justamente por discordar da política de preços, e do outro, apoiada pelo
"mercado", a Petrobrás, entrincheirada na defesa dos "preços de paridade internacional",
que já provocaram, somente neste ano, mais de 50% de aumento, impactando a inflação,
afetando particularmente os mais pobres que, com o preço do botijão de gás nas alturas,
recorrem mais e mais à lenha para cozinhar alimentos, tudo contribuindo para derrubar
a popularidade do presidente. De prático, até aqui, a saída de Castello Branco só
produziu a abertura de mais um general em presidência de estatal, pois Silva e Luna, o
novo presidente, ao sair de Itaipu, teve como sucessor o general Ferreira.
Que forças são essas, que enfrentam o presidente da República, o presidente da Câmara
dos Deputados, o presidente do Banco Central, todos críticos da política de preços em
vigor?
Para sabermos, é preciso recuar no tempo. A Petrobrás, quando foi criada em 1953 tinha
como objeto livrar o país da dependência das multinacionais que controlam o setor no
mundo, assegurando o abastecimento de combustíveis e de petroquímicos a preços
módicos, de modo a remover o principal entrave ao desenvolvimento, já que sào
insumos que impactam toda a cadeia produtiva. Sendo assim, por décadas a empresa
atendeu à sociedade sem que, em instante algum, a sua política de preços fosse objeto
de discussão, nem mesmo pelos setores mais especializados afetos ao tema. Tudo
começou a mudar quando a Petrobrás encontrou o Pré Sal, a maior descoberta de
petróleo das últimas 4 décadas, o que veio atiçar o interesse das multinacionais do setor
a abocanhá-las. Estavam todas com muitos recursos disponíveis e reservas de petróleo
cadentes. A Petrobrás, para explorar o Pré Sal, teve de se endividar, o que foi amenizado
em 2010 pelo maior lançamento de ações da História à época, na Bolsa de Nova York.
Teve início, então, campanha sistemática para desacreditar a empresa. Ineficiência,
corrupção, altíssimo nível de endividamento, passaram a ser veiculados diuturnamente,
para apagar da memória o papel por ela desempenhado ao longo da sua história.
Em 2015, no segundo mandato de Dilma Rousseff, assumiu a direção da empresa
Aldemir Bendine, com uma diretoria alinhada aos interesses do "mercado". Inicia-se
então o desmonte da Petrobrás, símbolo da nossa capacidade criadora, a maior empresa
da América Latina, uma das maiores petroleiras do mundo. Em maio de 2016, Dilma é
afastada da presidência por impeachment, cedendo o posto a Michel Temer. Uma das
suas primeiras providências foi a de assegurar a aprovação do projeto do senador José
Serra, que retirava da Petrobrás a condição de operadora única das reservas do pré-sal, compromisso de campanha assumido por ele com as multinacionais do setor em 2010, quando foi derrotado por Dilma. Na mesma ocasião, Temer afastou Bendine da
presidência da Petrobrás, o substituindo por Pedro Parente, mantendo entretanto o
restante da diretoria. Parente, então, radicalizou o desmonte da empresa: afirmou que
as reservas do pré-sal haviam sido sobrevalorizadas, para justificar a venda, por preço
vil, do Campo de Carcará, o melhor da reserva, à estatal norueguesa Statoil. Definiu como
objetivo central da empresa a produção e exportação de petróleo bruto, retirando dela o
caráter verticalizado, "do poço ao posto", como diz o jargão do mercado, para abrir
espaço às multinacionais do setor, no refino, na distribuição, na bio energia. Foi ele quem
estabeleceu o tal "preço de paridade internacional", que nada mais é que aplicar aqui o
preço estabelecido por elas para utilização nos mercados que controlam, mormente os
de países que não produzem petróleo.
A queda de braço, portanto, é com as multinacionais do setor, hoje grandes
importadoras de combustíveis e de petroquímicos. É com os acionistas encastelados na
Bolsa de Nova York. É com Paulo Guedes, o ministro da Fazenda que, insensível ao
clamor da cadeia produtiva, do agro aos serviços, ao clamor dos caminhoneiros da base
de apoio do presidente Bolsonaro, à indignação com os sucessivos aumentos do preço
do botijão de gás, o que leva o povo a voltar a usar lenha na cozinha, sustenta a
necessidade de privatizar a empresa. Vale gás, subsídios ao botijão, não resolvem o
problema, apenas escondem-no. A Petrobrás, manietada pela política de preços em
vigor, mantém ociosas as refinarias que ainda opera, foge ao objeto da sua existência,
embora mantenha e até eleve sua margem de lucro. Defende-se ao afirmar que o preço
de venda nas refinarias é muito onerado pelos impostos estaduais. Ora, estes têm as
mesmas alíquotas há mais de 3 décadas, estabelecidas que foram na esteira da
aprovação da Constituição de 1988. Voltamos, pois, aos idos da década de 50 do século
passado, quando a política de petróleo era totalmente subordinada aos interesses das
multinacionais do setor. Enfrentá-las é um impositivo de soberania, de subordinação da
Petrobrás ao seu objeto precípuo, o de atender, a preços módicos, o nosso mercado
interno para viabilizar o desenvolvimento.
Restabelecer a política de preços adotada pela Petrobrás, desde a sua criação até a
gestão Parente, é o que se impõe. Oxalá o Governo Federal resolva a queda de braço
em favor do interesse nacional.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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