Slogan pra quebrar polarização?
Quem governa não pode fugir do debate, seja ele frugal ou espinhoso
Já perdi muitos clientes por não ser bajulador. Em compensação, vi vários deles perderem eleições, justamente por contratarem bajuladores. Mas como minhas convicções profissionais prevalecem sobre meu saldo bancário – cada vez mais no vermelho -, não tenho problema nenhum em dizer que, em matéria de comunicação, o governo federal é um desastre total.
Não sei quem são os “formuladores das estratégias de comunicação do governo”, mas depois do anúncio da criação de “dois slogans” como aposta para quebrar a polarização política, confesso que não faço questão de conhecê-los.
Diariamente são publicadas centenas de matérias nas redes sociais dos principais veículos de comunicação do país, com acesso gratuito ao público. Se for um assalto, “faz o L”. Se for um homicídio, “matou pra comprar uma cervejinha”. Tráfico? “O amor venceu”, e por aí vai. Essas mensagens são difundidas 24 horas por uma rede muito bem organizada de extrema-direita, onde até os méritos do governo na economia, geração de empregos, distribuição de renda, são creditados ao ‘legado’ deixado por Jair Bolsonaro. E os “formuladores das estratégias de comunicação do governo” não fazem absolutamente nada a respeito disso.
Ou pelo menos não faziam. Porque, agora, para cada fake news publicada na timeline da Folha ou do Globo, os defensores do governo poderão responder com: “Bote fé no Brasil” ou “Isso é bom para todo mundo”. Hoje, aqui no Rio de Janeiro, governado pelo Bolsonarento Cláudio Castro, roubaram uma lancha. O primeiro comentário da matéria, publicada no G1, foi: “Com a ajuda do STF um criminoso chegou à presidência do país. kkkkkk. Bem-vindos à casa da mãe Joana chamada BRASIL. O Rio de Janeiro não aceita amadores.” E você vai encontrar esse mesmo texto até mesmo em matérias relacionadas ao Big Brother.
O terreno mais fértil para divulgação de mensagens de ódio e mentiras, nas redes sociais, são os espaços para comentários nos sites noticiosos. Como estudioso dos movimentos de propagação da ideologia de extrema-direita nestes ambientes, percebi que os resultados são alcançados pela repetição da mensagem, daí o motivo para postarem comentários sem qualquer conexão factual com a matéria publicada. A partir daí, fiz alguns experimentos no intuito de descompensar emocionalmente os propagadores do bolsonarismo, e descobri a eficácia de misturar humor, ironia e deboche como antídoto aos cães raivosos. E deu certo.
Os “formuladores das estratégias de comunicação do governo” precisam dar uma volta de ônibus pelo Brasil, cada um levando seu radinho de pilha. Só assim eles vão entender o poder desse meio de comunicação, que não tem nada de obsoleto no interior do país. São milhares de rádios comandadas e financiadas por políticos fascistas e empresários escravagistas, que passam o dia inteiro demonizando o presidente Lula para sua audiência. Segundo a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão – ABERT, 80% da população brasileira ouve rádio diariamente. Dá para ignorar essa realidade?
O melhor esforço para divulgar as realizações do governo foi a criação do portal ComunicaBR. Mas como veículo de comunicação, se tornou inútil ao transferir a responsabilidade da divulgação de seus conteúdos para a sociedade. O material ali contido só teria eficácia se em cada cidade brasileira existisse um núcleo de divulgadores de conteúdo profissionalizado para pulverizar a informação em suas regiões. O que fazem os diretórios do Partido dos Trabalhadores nesses locais?
Confesso que fiquei com vontade de assistir a uma reunião dos “formuladores das estratégias de comunicação do governo”, só para saber se suas ideias geniais ocorrem no intervalo entre uma e outra baforada de charuto cubano. Como esses caras acham que podem afastar o presidente Lula das pautas identitárias, se é a extrema-direita que o joga no caldeirão? Lula não precisa falar de aborto, relações homoafetivas, liberação do uso da maconha. Os bolsonaristas fazem isso por ele.
Quem governa não pode fugir do debate, seja ele frugal ou espinhoso. Existe aborto mais cruel do que aquele em que a criança nasce viva, trazendo alegria para a família, e que morre poucas horas depois, por falta de assistência de saúde, decorrente, por exemplo, da extinção da Rede Cegonha no governo Bolsonaro? De cada três bebês nascidos em 2022 com problemas de saúde, duas morreram por omissão e negligência do governo anterior. Estamos falando de 20 mil mortes de bebês que não foram evitadas pela política de direita que despreza a vida dos mais humildes.
Se os “formuladores das estratégias de comunicação do governo” não conseguem ir além da criação de slogans chinfrins, o presidente Lula pode se preparar para dias ainda mais difíceis, com a vitória avassaladora da direita nas eleições municipais deste ano. Esses caras parecem que estão brincando; só pode. Não estão entendendo que o que está em jogo é a consolidação da democracia e o fortalecimento das nossas instituições, e não apenas a reeleição de Lula em 2026. Pessoal, que tal primeiro pensar no Brasil e depois nos seus empregos?
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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