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    Luis Cosme Pinto

    Luis Cosme Pinto é carioca de Vila Isabel e vive em São Paulo. Tem 63 anos de idade e 37 de jornalismo. As crônicas que assina nascem em botecos e esquinas onde perambula em busca de histórias do dia a dia.

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    Sogra

    Na noite da cadeirada, o furioso Datena disse que defendeu a honra da sogra

    José Luiz Datena agride Pablo Marçal com cadeira durante debate da TV Cultura com candidatos a prefeito de São Paulo (Foto: Reprodução)

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    Tempos antigos, hábitos do século passado.

    Mulheres silenciadas até dentro de casa, desvalorizadas e impedidas de escolher uma profissão, exceto aquela: “do lar”.  

    Nesse período que hoje soa tão injusto, as piadas de mau gosto se multiplicavam e só eram engraçadas para quem fazia. Um dos alvos preferidos eram as sogras. 

    Bezerra da Silva, num samba de Rodi do Jacarezinho, Sarabanda e Barbeirinho do Jacarezinho, canta a seguinte estória. O sequestrador leva a sogra mas não suporta ficar com ela no cativeiro. De tão incomodado, em vez de receber, acaba por pagar o resgate para que o genro leve a sogra chata de volta. 

    Um verso se repete na voz do partideiro: “sequestraram minha sogra, bem feito pro sequestrador”.

    Bem antes disso, em 1937, Jorge Veiga, interpretava outra quizumba familiar em “Faustina”. A sogra chega de surpresa com as malas. O genro diz que vai embora para não morar com a jararaca de cara feia, que além de tudo é barulhenta. 

    Zeca Pagodinho, em início de carreira, fez sucesso com outro samba em que um genro xinga a sogra de fofoqueira e dá um ultimato à própria esposa: “Ou ela ou eu.”

    Por que nunca ouvimos uma dessas provocações com o sogro? Só a sogra incomodava?

    Se no século XX eram consideradas divertidas e tocavam sem parar, em nossos tempos são machistas e agressivas. Dificilmente seriam gravadas hoje.

    Uma vez, o Toninho, marido razoável e genro exemplar, me contou um segredo.

    A gente estava embaixo de uma jaqueira, quando a Barra da Tijuca era só uma baixada arenosa e deserta. Eu menino curioso, ele adulto experiente.

    - Garoto, existem dois tipos de sogra.

    - Ah é, quais são?

    - Sogra boa e sogra ruim. A chata é a sogra da nora, a legal é a sogra do genro. 

    - Como assim?

    - Da nora a sogra vira rival. Acha que a nora levou o filho embora. Também critica a comida e a educação das crianças. 

    - E com o genro?

    - Aí, trata como filho. Até defende o genro nas brigas de casal e aconselha a própria filha: fulano é bom marido, bom pai. Paciência minha filha, todos nós temos defeitos. Entendeu os dois tipos de sogra?

    - Entendi. Ou ela é legal com o marido da filha ou é chata com a mulher do filho.

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    Capa do livro Birinaites, Catiripapos e Borogodó, de Luís Cosme Pinto(Photo: Reprodução)

    - Isso mesmo. A minha, a dona Cleide, é um amor.

    Concordei mais para encerrar a conversa do que por acreditar na estranha teoria de meu veterano amigo, da qual lembro até hoje sem saber porquê.

    Eu, que casei, separei e tentei outros relacionamentos, tive sorte com as sogras. Nossas amizades resistiram muito além dos casamentos, estão vivas e saudáveis até hoje. A mãe da minha namorada tem 91 anos e sempre me recebe com uma palavra amiga e os braços abertos.

    Escrevo aqui sobre as sogras, motivado por uma cena bizarra. Depois de nos maltrarem com uma enxurrada de asneiras e grosserias, os candidatos a prefeito de São Paulo, Marçal e Datena, se xingaram bastante, até que Datena bateu no inimigo com uma cadeira. 

    A justificativa? Marçal teria lembrado denúncias de assédio sexual contra Datena feitas por uma jornalista, colega de trabalho. O apresentador-candidato garante que na época as mentiras causaram a morte da sogra. 

    Uma das manchetes sobre o “debate da cadeirada” reproduzia declaração desconcertante de Datena: “Defendi a honra da minha sogra morta.” 

    De saúde, educação e meio ambiente nenhum dos dois tratou. O debate que podia ser um encontro útil aos eleitores virou, como resumia a gíria antiga, “a casa da sogra”, que merecia genros mais educados.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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