Brasil tem forte potencial para a produção nuclear, declara diretor da AIEA
O diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, destaca a importância e a segurança das instalações nucleares e o papel da energia nuclear no processo de transição energética
Sputnik - Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, o diretor-geral da AIEA, Rafael Grossi, fala sobre a importância e a segurança das instalações nucleares e o papel da energia nuclear no processo de transição energética.
O diretor-geral da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA), Rafael Grossi, visitou o Brasil nesta semana para participar de uma audiência pública no Congresso Nacional.
Em entrevista exclusiva à Sputnik Brasil, ele falou sobre a cooperação com o país, a segurança das usinas nucleares Angra 1 e Angra 2 e o papel da energia nuclear no processo de transição energética. Além disso, comentou os esforços da agência para garantir a integridade da usina de Zaporozhie em meio ao conflito ucraniano.
Grossi iniciou a entrevista destacando o forte relacionamento e colaboração ativa que a AIEA e o Brasil têm para "o desenvolvimento seguro e sustentável da capacidade nuclear do Brasil".
"Isso inclui, entre outros [atributos], assistência técnica, capacitação, fornecimento de orientação especializada em vários aspectos da energia e tecnologia nuclear."
"A AIEA está pronta para continuar a fornecer suporte para garantir os mais altos padrões de segurança, inclusive na usina nuclear Angra 3. Além disso, a AIEA está envolvida no projeto do Reator Multipropósito Brasileiro [RMB], que visa aumentar as capacidades do Brasil na produção de radioisótopos para aplicações médicas e industriais."
Ele acrescenta que "a AIEA também apoia o Brasil no uso da tecnologia nuclear para a proteção ambiental, como estudar o impacto dos microplásticos e das florações algais nocivas na região antártica por meio de sua iniciativa [da AIEA] NUTEC Plastics".
Segundo Grossi, o Brasil tem um forte potencial para a produção de energia nuclear, "sustentado por sua infraestrutura nuclear existente e avançada e seu know-how nuclear".
O país hoje opera duas usinas nucleares, Angra 1 e Angra 2, "com Angra 3 em construção para diversificar sua matriz energética e aumentar a segurança energética", especifica o diretor-geral.
"Por exemplo, o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (IPEN) está envolvido em projetos que utilizam tecnologia nuclear para fins médicos e industriais", detalha Grossi.
Ele enfatiza ainda que espera uma cooperação contínua com o Brasil durante a presidência do país no G20, "especialmente na transição energética e no desenvolvimento sustentável".
Energia nuclear é 'tendência'
Questionado sobre quais são as expectativas da AIEA para a participação de países emergentes, como os membros do BRICS, no mercado nuclear global nos próximos anos, Grossi diz que "a maioria desses países já são importantes países com energia nuclear".
Atualmente, 31 países operam usinas nucleares, mas outros 25 a 30 países, "incluindo mercados emergentes e economias em desenvolvimento, estão considerando ativamente a introdução de energia nuclear", disse Grossi à reportagem.
"Alguns desses países já estão construindo sua primeira usina nuclear. Até 2035, o número de países operantes pode aumentar em cerca de 10 a 12, ou 30%", diz o diretor-geral da agência.
Grossi destaca que a AIEA já apoia países em desenvolvimento na construção de infraestrutura nuclear segura e eficiente. Segundo ele, "uma vez que um país decide introduzir a energia nuclear em sua matriz energética, a AIEA está disponível para ajudar desde o planejamento do projeto até a fase de descomissionamento várias décadas depois".
"Em resposta à crescente demanda dos países em fase de implementação por aconselhamento e assistência, a AIEA desenvolveu a Abordagem de Marcos [Milestones Approach], para auxiliar os países que estão considerando ou planejando sua primeira usina nuclear a entender os compromissos e obrigações associados ao desenvolvimento de um programa nuclear."
Qual o papel da energia nuclear na transição energética?
Grossi sublinha que o mundo precisa de todas as fontes de energia de baixo carbono, incluindo a nuclear, para enfrentar efetivamente a emergência das mudanças climáticas.
"A energia nuclear pode ser uma importante contribuidora para as transições de baixo carbono, oferecendo uma fonte escalável, resiliente ao clima, despachável de eletricidade e calor de baixo carbono, enquanto contribui significativamente para a segurança energética."
Com isso em mente, Grossi destaca que o primeiro Balanço Global do Acordo de Paris, publicado na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2023 (COP28), reforçou a importância de "acelerar as tecnologias de zero e baixas emissões, incluindo, entre outras, nuclear, e tecnologias de redução e remoção, como captura e utilização de carbono e armazenamento".
"O diretor-executivo da Agência Internacional de Energia, dr. Fatih Birol, também afirmou recentemente, na Cúpula de Energia Nuclear em Bruxelas, que 'sem o apoio da energia nuclear, não temos chance de atingir nossas metas climáticas'."
A energia nuclear é segura?
Sobre a segurança das instalações nucleares, ele ressalta que embora isso seja responsabilidade de cada Estado, "o papel da AIEA, como centro de cooperação global no campo nuclear, em ajudar os países a cumprirem essas responsabilidades vitais é indispensável. Ele afirma que a agência faz isso por meio de suas normas de segurança, que servem como referência global.
"A pedido dos países, a AIEA também envia equipes de especialistas para revisar a segurança nuclear. Esse trabalho ajudou a criar padrões robustos de segurança nuclear em todo o mundo", destaca.
Grossi lembra que liderou pessoalmente nove missões da AIEA à usina nuclear de Zaporozhie, hoje sob controle da Rússia, e destaca que a agência agora tem missões permanentes de especialistas que "avaliam constantemente a segurança nuclear dessas instalações, assistem e aconselham os operadores e garantem que o mundo esteja informado sobre desenvolvimentos".
Como parte dos esforços da agência para garantir a segurança e proteção nuclear durante o conflito ucraniano e reduzir o risco de um grande acidente, ele se reuniu tanto com autoridades da Ucrânia quanto com autoridades da Federação da Rússia. Grossi sublinha que se encontrou duas vezes com o presidente russo, Vladimir Putin, com quem teve uma conversa "profissional e franca", sobretudo em Sochi, no último dia 8.
O diretor-geral da AIEA observou também que durante suas discussões em Sochi ele havia enfatizado que a situação de segurança nuclear daquela que é a maior usina nuclear da Europa, Zaporozhie, continua precária, "com seis dos sete pilares de segurança e proteção nuclear que eu delineei no início do conflito sendo comprometidos total ou parcialmente. Como sempre, apelo por máxima restrição militar e estrita observância dos cinco princípios concretos estabelecidos no Conselho de Segurança das Nações Unidas em 30 de maio de 2023", frisou ele.
Ademais, ele afirma que, por meio de seu trabalho, a agência "está ajudando a fomentar a transparência e a confiança pública na segurança das usinas nucleares ao redor do mundo".
"Como parte de nossas atividades de segurança, enviamos missões de revisão por pares aos países, a pedido dos mesmos, para revisar diferentes aspectos de suas atividades nucleares e fornecer recomendações e sugestões para melhorias adicionais."
"Eu mesmo invisto tempo e esforço para informar a mídia e o público sobre todas as questões relacionadas à energia nuclear", afirmou Grossi.
Ele afirma ainda que entre as principais inovações tecnológicas que estão moldando o futuro da energia nuclear está o avanço no desenvolvimento de pequenos reatores modulares (SMRs, na sigla em inglês).
Esses reatores, afirma Grossi, são "projetados para ser inerentemente mais seguros, com recursos de segurança passiva que operam sem intervenção humana ou fontes de energia externas".
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