Lideranças indígenas criam o "Parlaíndio Brasil"
Tendo como presidente de honra o cacique Raoni Metuktire, o Parlaíndio Brasil já fez a sua primeira assembleia e, entre os principais temas do movimento, estão desmatamento, invasões de terras, projetos de mineração, garimpo ilegal e poluição dos rios. O objetivo é dar visibilidade política aos 305 povos originários do país
Por Claudia Correa - Um parlamento indígena aberto, para dar voz e visibilidade política aos 305 povos originários do país. Essa é a proposta do "Parlaíndio Brasil", cuja primeira assembleia (https://www.parlaindiobrasil.com.br/assembleias) foi realizada virtualmente na última quinta-feira de maio (27). O encontro debateu os objetivos do movimento, as questões que serão abordadas, a estruturação e o calendário das assembleias mensais.
A coordenação executiva deste parlamento indígena, de caráter informal, ficou a cargo do cacique Almir Narayamoga Suruí. Principal liderança do povo Paiter Suruí de Rondônia, ele é conhecido por seus projetos de sustentabilidade em terras indígenas.
O presidente de honra do "Parlaíndio" é o cacique Raoni Metuktire, do povo Caiapó, importante líder indígena brasileiro, reconhecido internacionalmente por sua luta pela preservação da Amazónia e pelos direitos dos povos nativos. Em 2020, Raoni figurou na lista dos indicados ao Prêmio Nobel da Paz.
Entre os principais temas que o movimento abordará estão o desmatamento, invasões das terras indígenas, projetos de mineração e hidroelétricas em terras dos povos nativos, garimpo ilegal, poluição dos rios por mercúrio e contaminação das populações originárias e ribeirinhas.
O primeiro ato político definido pelo coletivo foi a entrada da ação na justiça pedindo a exoneração do delegado Marcelo Xavier, presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão executor da política indigenista do governo federal brasileiro.
Em comunicado oficial o movimento informou: “Foi aprovado, por unanimidade, o 'Parlaíndio Brasil' entrar com uma ação na justiça pedindo a exoneração do presidente da Funai, delegado Marcelo Xavier, que à frente do órgão não tem cumprido a missão institucional de proteger e promover os direitos dos povos indígenas do país",
Recentemente o presidente da Funai pediu à Polícia Federal (PF) a abertura de inquérito contra lideranças indígenas, como Sônia Guajajara e Almir Suruí, sob a justificativa de difamação do governo Bolsonaro. No último dia 12 de maio novo inquérito foi aberto pela Polícia Federal no Amazonas. A Funai acionou a PF através de ofício de novembro de 2020 contra o líder indígena Mário Parwe Atroari, duas organizações indígenas waimiri-atroari, nove servidores do próprio órgão e advogados dos indígenas. A justificativa dessa vez é que há "entraves e óbices" à construção da linha de alta tensão Manaus-Boa Vista.
Almir Suruí, coordenador executivo do "Parlaíndio Brasil", destacou a importância do movimento como um importante espaço para a construção de uma política de defesa dos povos indígenas. “Agradeço a todos que se apresentaram para discutir, avaliar, propor e fiscalizar as políticas públicas e os direitos conquistados na Constituição de 1988. Um dos nossos objetivos é debater a construção do presente e do futuro a partir de uma cuidadosa avaliação do passado. Vamos discutir também as políticas públicas e fornecer subsídios para as organizações que integram o movimento indígena", acrescentou na sessão de lançamento do movimento.
Experiências internacionais
No Brasil a experiência do Parlaíndio é inédita. As iniciativas que existem são comissões especiais ou frentes parlamentares de direitos indígenas, no âmbito das câmaras municipais ou assembleias legislativas nos estados. Coordenada pela deputada federal e advogada Joenia Wapichana (Rede-RR), primeira mulher indígena eleita para a Câmara Federal no Brasil, a Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas foi criada em 2019 e é composta por 237 membros, 210 deputados e 27 senadores.
A criação do Parlaíndio retoma uma ideia antiga, debatida há décadas pelo Movimento Indígena nas Américas: a representação indígena formal assegurada nos parlamentos nacionais e regionais, assim como no Poder Judiciário. Defensor dessa proposta, o indigenista Eduardo Almeida considera que apesar de ser uma estrutura informal, o Parlaíndio é válido por dar visibilidade à questão indígena no Brasil. “Este movimento é interessante e pertinente porque chama atenção para a representatividade política dos povos indígenas, que precisa estar contemplada no Congresso Nacional e prevista na Constituição, a exemplo do que já acontece em alguns países. Simbolicamente valoriza o protagonismo indígena”, afirmou. Ele cita as experiências da Colômbia, Bolívia, Venezuela e Panamá onde existem instâncias indígenas no parlamento, previstas na Constituição, para debater temas gerais ou específicos que envolvem os povos indígenas.
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