Petrobrás "em modo campanha" baixa preços, mas ainda vende mais caro que importador
Estatal cria rotina de pequenas reduções de preços faltando dois meses para eleição presidencial
Vinicius Konchinski, Brasil de Fato - “Quando fizer o bem, faça-o aos poucos. Quando for praticar o mal, é melhor fazê-lo de uma vez só.”
A frase, escrita pelo filósofo italiano Nicolau Maquiavel em 1513, foi publicada em 1532 no livro “O Príncipe", uma espécie de manual clássico e atemporal para políticos que desejam se manter no poder.
Não se sabe se o presidente Jair Bolsonaro (PL) leu tal obra. Parece, porém, que ele resolveu aplicá-la em sua relação com a Petrobras.
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A estatal, cuja diretoria é formada por executivos indicados por Bolsonaro, criou uma rotina de reduções frequentes no preço de seus combustíveis faltando cerca de dois meses para a eleição presidencial.
Nas últimas quatro semanas, foram quatro quedas – duas baixas da gasolina e outras duas do diesel. Todas elas pequenas, abaixo dos 5%.
Elas vieram depois de aumentos esporádicos e relevantes dos combustíveis anunciados durante os primeiros seis meses do ano. O diesel, por exemplo, subiu quatro vezes em 2022. Em março, foi reajustado pela Petrobras em quase 25%, gerando revolta de caminhoneiros, categoria que fez campanha pela eleição de Bolsonaro em 2018.
Preços da Petrobras em 2022
Diesel
01/Jan - R$ 3,34
12/Jan - R$ 3,61 (aumento de 8,08%)
11/Mar - R$ 4,51 (aumento de 24,93%)
10/Mai - R$ 4,91 (aumento de 8,86%)
18/Jun - R$ 5,61 (aumento 14,25%)
05/Ago - R$ 5,41 (queda de 3,56%)
12/Ago - R$ 5,19 (queda 4,06%)
Gasolina
01/Jan - R$ 3,09
12/Jan - R$ 3,25 (aumento de 5,17%)
11/Mar - R$ 3,86 (aumento de 18,76%)
18/Jun - R$ 4,06 (aumento de 5,18%)
20/Jul - R$ 3,86 (queda de 4,92%)
29/Jul - R$ 3,71 (queda de 3,88%)
Nos primeiros meses do ano, Bolsonaro criticava a Petrobras por repassar aos consumidores brasileiros a alta do petróleo causada pela guerra entre Rússia e Ucrânia, iniciada em fevereiro. Dizia também não ter poder de interferir nos preços da companhia, apesar de a União ser a sócia-controladora da empresa.
Meses depois, o discurso mudou. A redução do preço do petróleo no mercado internacional abriu espaço para cortes no preço dos combustíveis no Brasil. Desde 20 de julho, toda semana a Petrobras anuncia baixas no país. Já Bolsonaro, em campanha para reeleição, divulga as quedas como feitos de seu governo.
As baixas consecutivas há cerca de dois meses da eleição chamaram a atenção da Federação Única dos Petroleiros (FUP), que sempre criticou Bolsonaro por manter os preços da Petrobras atrelados ao mercado internacional e permitir que a empresa praticamente triplicasse o valor do diesel produzido no país durante seu governo.
Segundo o coordenador-geral da entidade, Deyvid Bacelar, a dois meses da votação, a estatal passou a atender uma agenda eleitoreira do presidente.
“Quem determina a política de preço dos combustíveis não é mais o PPI [paridade de preços de importação], mas, sim, a política eleitoreira de Bolsonaro”, afirmou. “O governo tentará, até as eleições, anunciar seguidas reduções nos preços dos combustíveis, numa tentativa de minimizar o estrago provocado na economia e na população pelo reajuste de 193,1% no diesel acumulado nesta gestão.”
Soma de interesses
O economista Eduardo Costa Pinto, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pesquisador do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep), também vê um comportamento eleitoreiro da Petrobras. Diz que, neste momento, isso atende inclusive aos interesses acionistas privados da estatal, que já acumularam ganhos recordes durante o governo Bolsonaro com a alta distribuição de dividendos da empresa.
Segundo ele, a Petrobras está reduzindo seus preços – o que, em tese, baixa seus lucros e prejudica investidores. Acontece que a queda é paulatina e menor do que a verificada no mercado internacional – ou seja, preserva em parte o ganho dos acionistas enquanto prejudica a população como um todo.
Na sexta-feira (12), após redução de 4% do diesel, a Petrobras ainda vendia o combustível 6% mais caro do que importadores que trazem o óleo dos Estados Unidos até o Brasil. Antes do corte do preço, a diferença era de 13%.
Já a gasolina da Petrobras custava na sexta 9% mais do que a importada, segundo monitoramento diário da Associação Brasileira dos Importadores de Combustível (Abicom).
Empresas associadas à Abicom, aliás, também estão entre as maiores beneficiadas pelas quedas tímidas aplicadas pela Petrobras ao preço dos combustíveis. Como a estatal não baixou tanto o preço do diesel, atualmente, importadores conseguem trazer o óleo de fora do país e vender aqui mais facilmente, aumentando suas receitas.
Desviando foco
O economista Eric Gil Dantas, do Observatório Social do Petróleo (OSP), observa ainda que a Petrobras e seus acionistas foram beneficiados pelo corte de impostos sobre combustíveis aprovado pelo Congresso Nacional.
Com os tributos mais baixos, houve uma redução natural dos preços. Com preços mais baixos, a pressão sobre a estatal diminuiu.
Criou-se aí a possibilidade de ela segurar seus preços num nível acima do internacional, resguardando o interesse de seus investidores, e ainda assim passar para a população uma mensagem de comprometimento com a economia do país.
A Petrobras tem informado de forma reiterada que as reduções em seus preços acompanham a evolução dos preços de referência e são coerentes com sua política de valores, que busca o equilíbrio dos seus preços com o mercado global, mas sem o repasse da volatilidade conjuntural das cotações internacionais e da taxa de câmbio.
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