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Luana Araújo: novas epidemias virão se ataque ao meio ambiente continuar

Para infectologista, Bolsonaro e indústria da saúde são responsáveis por resposta desastrosa à Covid-19 no Brasil

Infectologista Luana Araújo (Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado)

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Opera Mundi - A médica infectologista Luana Araújo relacionou a probabilidade de o planeta atravessar novas epidemias e pandemias à destruição continuada do meio ambiente, em conversa como o jornalista Breno Altman no programa 20 MINUTOS ENTREVISTA desta segunda-feira (04/07). 

O avanço das fronteiras agrícolas e o desmatamento da Amazônia, por exemplo, estão diretamente relacionados com os desequilíbrios que fazem microrganismos como o coronavírus se adaptar à espécie humana. 

“Toda vez que invadimos ou maltratamos os biomas do planeta e, por isso, entramos em contato com microrganismos para os quais não temos nenhuma defesa, corremos o risco de que alguns ou muitos deles consigam se disseminar pela espécie humana, com a mesma complexidade que aconteceu com a covid-19”, explicou.

Demitida pelo governo federal em 2021, após 10 dias como Secretária Extraordinária de Enfrentamento à covid-19 do Ministério da Saúde, após confrontar o negacionismo praticado por Jair Bolsonaro, Araújo depôs na Comissão parlamentar de inquérito (CPI) da covid, no mesmo ano. 

Ela trata a pandemia a partir do conceito de saúde única, que abarca a saúde do meio ambiente, dos outros animais e dos humanos como integrantes de um mesmo sistema, cujo desequilíbrio atinge a todos indistintamente: “os microrganismos não saem correndo atrás da gente. Nós é que corremos atrás deles e damos essa chance, pela nossa própria estupidez”. 

Para a infectologista, o Brasil tinha todas as condições de desenvolver uma resposta-modelo à pandemia e não o fez, num concerto de ações (ou inações) combinadas entre o governo Bolsonaro, administrações estaduais e municipais, a indústria privada de saúde pública e a imaturidade da sociedade como um todo. “Em cima do que aconteceu, existe uma indústria privada que se compraz com o desespero e a morte das pessoas e ganha dinheiro com isso. Não é que existe um ponto fora da curva", disse. 

Essa combinação de fatores não é, para ela, um ponto fora da curva, mas antes um comportamento-padrão que faz com que, dois anos e meio mais tarde, ainda exista quem argumente que a chamada varíola dos macacos seja transmitida pela vacina contra covid-19. 

Araújo lamenta o abandono do Sistema Único de Saúde (SUS) pelo governo no enfrentamento à pandemia e aponta as consequências disso: “o Brasil tinha toda a condição de ser totalmente exemplar, porque temos um sistema de saúde baseado na atenção primária, nos agentes comunitários de saúde, que é a coisa mais sensacional que temos. E não é que foi mal utilizado. Ele não foi utilizado. Nosso melhor recurso foi absolutamente alijado nessa resposta”. 

Apocalipse viral

O termo “apocalipse viral”, em sua avaliação, seria sensacionalista e pouco condizente com a realidade na descrição dos rumos da saúde pública mundial, mas isso não significa que o planeta não esteja sob risco real importante e já conhecido há algum tempo. A humanidade estaria hoje, em suas palavras, pisando num grande campo minado em relação à saúde pública. 

Ela explica o que entende por maturidade social, não particularmente no caso brasileiro, mas em nível global: "não se pode tapar o sol com a peneira, democracia exige maturidade, e as pessoas precisam se comportar como sociedade. O que aconteceu foi farinha pouca, meu pirão primeiro, ‘eu resolvo minha vida, você que se lasque’”. 

Sua avaliação é de que três quartos das mortes por covid-19 poderiam ter sido evitadas se o Brasil tivesse adotado uma resposta apenas mediana à pandemia, o que corresponderia a mais de 500 mil vidas poupadas. Quanto ao momento presente, sustenta que o vírus se mantém como ameaça e uma quarta dose será necessária para todos, assim como outros futuros reforços. 

A infectologista explica que a chamada varíola dos macacos, outra ameaça que hoje assusta a humanidade, não tem chance de causar o mesmo impacto que a covid-19 causou, por ser menos transmissível e porque tem se mostrado mais benigna até mesmo que a varíola original. Seria, então, uma doença benigna perigosa nos extremos (como entre crianças, idosos e imunossuprimidos), mas sem repercussão muito grave para a população em geral. 

Confrontada por Altman e por espectadores sobre as diferenças entre a esquerda que se preocupa com políticas públicas e a direita privatista na condução da saúde pública, Araújo sustentou que a relação é frequente, mas não direta. "A resposta de um sistema de saúde vai muito além dessa distopia reducionista entre direita e esquerda. O que faz a diferença é olhar para o que povo precisa”, disse, criticando a mistura de propósitos políticos com as necessidades da população. 

“A dualidade não é produtiva para ninguém. Pessoalmente você pode fazer o que quiser, mas saúde pública não é sobre você, é sobre o grupo, a sociedade. Colocar como direita ou esquerda é reducionista, a mesma coisa que perguntar se é favor ou contra aborto. Essa é uma pergunta idiota", defendeu.

Ainda por essa lógica, Araújo afirma que foi levada a tentar participar do governo Bolsonaro em 2021 por causa dos quatro mil mortos diários por covid-19 naquele momento: “eu ia me abster por quê? Porque é de direita ou de esquerda? Na minha cabeça, era uma sucessão de erros inacreditáveis, como por exemplo Manaus. Teoricamente, ali foi colocado no Ministério da Saúde um gestor que vinha da ciência”. 

De seu ponto de vista, era necessário tentar colaborar e não foi uma atitude totalmente infrutífera.

“Respondo a meu juramento e à minha consciência social. Deu certo? Não. A CPI não deu em nada em termos legais, mas despertou nas pessoas a ideia de que aquela condução estava muito errada em muitos outros níveis além do que estavam imaginando”, disse.

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