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O previsível ressurgimento do fascismo e do nazismo em ambos os lados do Atlântico Norte

A derrota do Fascismo e do Nazismo redefiniu as relações de poder, empoderando as classes trabalhadoras

Adolph Hitler (Foto: Agência Brasil)

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Artigo de Vicente Navarro originalmente publicado no website Counter Punch em 09/12/2022. Traduzido e adaptado por Rubens Turkienicz com exclusividade para o Brasil 247

A Grande Depressão

O Fascismo e o Nazismo foram os produtos da Grande Depressão. A

situação econômica em deterioração produziu efeitos desastrosos na

qualidade de vida e no bem-estar das classes populares e minou a

credibilidade e legitimidade dos sistemas democráticos nos EUA e na

Europa. O Fascismo no sul da Europa e nos EUA, o Nazismo no sul da

Europa no centro e no norte da Europa e também nos EUA,

capitalizaram no descontentamento resultante. Estes movimentos

adquiriram uma influência significativa em ambos os lados do

Atlântico Norte – terminando por governar diversos países da Europa

Ocidental.

A mensagem de cada um deles foi autoritária e antidemocrática. O

Fascismo e o Nazismo consideravam todas as outras opções políticas

como ilegítimas, o que era a base para justificar a eliminação destas.

Ambas defendiam o nacionalismo extremo baseado no classicismo, no

racismo e no machismo, apresentando-se como defensores da

civilização Cristã e promovendo a força e a violência contra o “outro”

– a quem eles definiam como um inimigo. Os dois movimentos eram

profundamente anti-sindicatos, anticomunistas e anti-socialistas.

Estes pontos de vista os tornavam atrativos para os ‘establishments’

de poder econômico e financeiro – os quais sentiam o seu poder

ameaçado pelos protestos alimentados pelos movimentos

trabalhistas. Por isso, setores influentes destes ‘establishments’

financiaram o Fascismo e o Nazismo.

A derrota do fascismo e do nazismo na Segunda Guerra

O Fascismo e o Nazismo foram derrotados militarmente na Segunda

Guerra Mundial, uma meta atingida através de uma ampla aliança de

forças políticas e sociais. A derrota destas opções políticas e o

enfraquecimento dos poderes econômicos e financeiros que as

apoiaram, permitiram uma redefinição de relações de poder entre as

classes sociais – especialmente entre os proprietários e gerentes do

capital, de um lado, e as classes trabalhadoras do outro. Isto abriu

novas possibilidades, incluindo o empoderamento das classes

trabalhadoras – que levou ao estabelecimento do estado de bem-

estar social e a redução das desigualdades. Onde a classe

trabalhadora era mais forte, como na Escandinávia, a redistribuição

de renda e a propriedade do capital foi maior e o estado de bem-

estar social foi mais extensivo. Onde a classe trabalhadora foi mais

fraca, na no sul da Europa e nos EUA, a redistribuição de renda e o

estabelecimento do estado de bem-estar social foram praticamente

inexistentes (como ocorreu na Espanha, governada por um governo

fascista, e em Portugal, governada por um governo fascistóide), ou

muito limitada (como nos EUA, onde os direitos trabalhistas e sociais

dos trabalhadores foram muito reduzidos) e as desigualdades de

classe, raça e gênero foram muito extensas. A estrutura e o modus

operandi dos seus sistemas democráticos sempre foram claramente

estruturados a favor de forças políticas conservadoras.

Consequentemente, a classe trabalhadora nos EUA tem sido

historicamente muito graça. A lei federal estadunidense –

nominalmente a Lei Taft-Hartley de 1947 [em vigor até hoje] –

restringe as atividades e o poder dos sindicatos, limitando-os a

defender setores segmentados e altamente descentralizados dos

trabalhadores. Greves-gerais são proibidas. O sistema eleitoral

federal dos EUA é mal representa ou é proporcional de cada estado,

independentemente da sua população – cada estado é representado

igualmente por dois senadores federais, o que é um viés inerente da

câmara legislativa, o Senado, à favor das regiões rurais e mais

conservadoras do país. O financiamento do processo eleitoral é

fundamentalmente privado, o que possibilita que o ‘establishment’

financeiro e econômico “compre” políticos. Este é o “modelo

econômico e político liberal”, por excelência.

A resposta da casse social de proprietários e gerentes do

capital econômico e financeiro

A derrota do Fascismo e do Nazismo redefiniu as relações de poder,

empoderando as classes trabalhadoras. Uma consequência disso foi

um aumento na parede dos trabalhadores na renda nacional, com uma

redução proporcional da renda do capital durante o período desde o

pós-Segunda Guerra Mundial até a década dos anos de 1970. Isso

levou a protestos por parte dos ‘establishments’ econômicos e

financeiros e ao advento do neoliberalismo, que foi estabelecido nos

EUA com a eleição do presidente Ronald Reagan e na Grã-Bretanha

com Margaret Thatcher e que foi incorporado depois pela maioria dos

partidos social-democratas governantes – a maioria sendo partidos

da esquerda Europeia – através da chamada Terceira Via.

Esta nova versão do liberalismo promoveu a globalização das

atividades econômicas e financeiras, dando liberdade total à

mobilidade do capital e dos trabalhadores, criando um aumento

significativo das migrações e deslocamentos de capitais, basicamente

industriais, para os países do Sul Global. Esta globalização também

resultou na desregulação do mercado de trabalho, em políticas fiscais

crescentemente regressivas e na grande contenção e redução dos

gastos sociais públicos.

Estas políticas visando o enfraquecimento da classe trabalhadora em

países de ambos os lados do Atlântico Norte e a inversão da

distribuição de renda em favor dos proprietários e gerentes do capital

– às expensas da renda derivada do trabalho. O declínio da renda dos

trabalhadores como percentual da renda nacional declinou

significativamente desde o final da década de 1970, no final do

período conhecido como a Era de Ouro do Capitalismo, até 2019,

antes da pandemia. Entre 1978 e 2019, os EUA viram um declínio da

renda derivada do trabalho de 70% para 63%, a Alemanha de 70%

para 62%, a França de 74% para 66%, a Itália de 72% para 62%, o

Reuni Unido de 74% para 70% e a Espanha de 72% para 56%. O

declínio médio de renda do trabalho dentre os 15 países que

formariam a União Europeia (UE) foi de 73% para 64%.

Esta resposta neoliberal foi promovida e liderada basicamente pelo

governo dos EUA (ao qual se juntou mais tarde a União Europeia,

cujo governo era predominantemente constituído por forças de

persuasões conservadoras e liberais) e por outras organizações

lideradas pelos EUA – como a OTAN. A OTAN expandiu a sua

influência em áreas do Atlântico Norte, incluindo países da Europa

Oriental e, agora, a Ucrânia, que está programando a sua

incorporação à organização.

Durante este período neoliberal e como parte da globalização liderada

pelos EUA, um objetivo tem sido a expansão e promoção do modelo

neoliberal existente. Exemplos disso são as políticas econômicas e

trabalhistas que estão sendo promovidas pelo Banco Mundial e o

Fundo Monetário Internacional (FMI). Estas políticas, que têm sido

claramente influenciadas pelos EUA e países da Europa Ocidental,

estão forçando a Ucrânia a condicionar o atraso no pagamento da sua

dívida externa à aprovação de uma mudança no direito à propriedade

de terras na Ucrânia. A lei ucraniana atual restringe a propriedade de

terras por parte de estrangeiros. No entanto, a mudança desta

política dá direito a empresas internacionais de terem propriedades

no país. O atual governo ucraniano, que segue uma orientação

neoliberal, favorece estas políticas – que são altamente impopulares

no país. Igualmente impopular é a desregulamentação massiva

proposta por este governo antes da guerra e que foi aprovada há

apenas algumas semanas. Ambas as medidas foram impostas por

organizações internacionais e foram adoptadas pelo governo

ucraniano sob a suposição de que elas sejam necessárias para “atrair

capitais internacionais para facilitar a reconstrução do país”. Neste

caso, capital estrangeiro significa empresas Norte-Americanas e

europeias.

A conversão dos governos de esquerda ao neoliberalismo e as

suas consequências

As reformas neoliberais dos anos de 1980 espalharam-se por todo o

Atlântico Norte, à ponto que os governos de esquerda diluíram a sua

resistência a estas reformas e acabaram assumindo-as como próprias

suas. Quanto maior a força destes governos, mais longo foi o atraso

na aplicação destas políticas. O mais recente e mais notório caso é o

da Suécia, onde historicamente as forças progressistas mantiveram o

poder e onde o Partido Social-Democrata foi quem teve o governo por

mais tempo. O Partido Social-Democrata governou a Suécia de 1932

até o final dos anos de 1970, apoiado por uma média de 48% do

eleitorado. As coisas começaram a mudar nos anos de 1980, apesar

que não foi até os anos de 1990 e o começo do século XXI que as

políticas neoliberais atingem a sua influência máxima. A expansão do

fascismo foi uma consequência direta da aplicação destas políticas.

Era previsível que o movimento fascista cresceria quase

exponencialmente – e também que os efeitos prejudiciais das

políticas neoliberais afetaram o comportamento eleitoral das classes

sociais que seriam as mais negativamente impactadas por estas. Eu

conheço bem a Suécia, academicamente e pessoalmente. Escrevi

extensivamente sobre o estado de bem-estar social sueco e uma

parte da minha família é sueca. No meu artigo “What happens in

Sweden?”, eu previ que as políticas públicas implementadas conduziriam

à situação que existe hoje. Isso foi precisamente nos anos de 1980,

quando o governo social-democrata começou a aplicar essas políticas

– liderado pelo ministro das finanças da Suécia. Mais tarde, estas

políticas foram expandidas pela aliança de governo entre os partidos

conservadores e os liberais – um corpo conhecido como a Aliança

Burguesa – e, mais tarde, foram continuadas pelo Partido Social-

Democrata que governou novamente de 2014 até 2022. Estas

políticas neoliberais incluíam a desregulamentação do mercado de

trabalho (o que permitiu que os empregadores pagassem os

trabalhadores segundo os seus próprios critérios; consequentemente,

os empregadores, incluindo o estado, começaram a contratar e a

pagar menos aos trabalhadores mais desprotegidos – leia-se: os

imigrantes); a facilitação da imigração, que aumentou

dramaticamente; a introdução da privatização no gerenciamento dos

serviços públicos – como a saúde e a educação -, incluindo as

empresas privadas com fins lucrativos; e a desregulamentação dos

preços das habitações.

A maior parte destas políticas teve um efeito negativo no bem-estar

social e na qualidade de vida da classe trabalhadora sueca, com

amplos setores desta classe distanciando-se do partido social-

democrata – abstendo-se de votar, ou votando para o partido

nazista, conhecido como os ‘Democratas Suecos’. Este partido se

apresentou como o partido do “establishment antineoliberal”,

contrário à classe política do ‘establishment’. Eles ganharam com

grande vantagem nas últimas eleições.

A classe capitalista sueca favoreceu estas políticas neoliberais,

mesmo que alguns setores daquela classe – próximos do partido

social-democrata- sentiram-se desconfortáveis com a linguagem e os

valores do partido nazista. A vasta maioria das mídias, controladas

por grupos econômicos pertencentes a esta classe, fizeram todo o

possível para destruir os partidos à esquerda do partido social-

democrata para evitar que estes canalizassem a raiva das classes

populares ao establishment antineoliberal. Foi assim que o partido

nazista cresceu. Tudo que ocorreu era totalmente previsível.

O crescimento do fascismo na Europa Ocidental era

previsível: a Suécia foi um exemplo claro disso

Nas eleições que ocorreram na Suécia há alguns meses, a aliança

progressista – o Partido Social-Democrata, o Partido da Esquerda e o

Partido Verde – conquistou 163 mandatos no Parlamento. Isto foi

apenas 3 votos a menos do que os 166 conquistados pela direita

combinada dos partidos Conservador, Liberal e Nazista. O partido

Nazista, fundado em 1968 como herdeiro do Partido Nazista Sueco,

conseguiu 20% dos votos, tornando-se a segunda força no

parlamento sueco. O Partido Social-Democrata, ganhou mais votos,

conquistando 30,3%. O partido nazista não só atraiu um grande

número de eleitores dos outros partidos de direita, mas também de

setores da classe trabalhadora – que previamente votaram no Partido

Social-Democrata. O apoio ao partido nazista cresceu até entre os

membros da união mais próxima ao Partido Social-Democrata, o LO.

A metade destes, a maioria homens, apoiaram o partido nazista. No

total das eleições deste ano [2022], 60% dos homens suecos

votaram nos partidos de direita.

As causas destas transferências de votos são fáceis de se ver: foram

as políticas neoliberais iniciadas pelo Partido Social-Democrata e que

foram expandidas pela aliança liberal-conservadora que governou a

Suécia durante seis anos. Mais tarde, esta aliança foi substituída pelo

Partido Social-Democrata – o qual está governando nos últimos seis

anos. Durante este tempo, eles mantiveram estas políticas, enquanto

adicionavam medidas impopulares de austeridade – como a reduções

na saúde pública e no seguro de incapacidade. As políticas de

austeridade e a desregulamentação do mercado de trabalho foram

especialmente importantes para explicar o antagonismo à imigração,

que aumentou consideravelmente durante este tempo. Em 2015, a

Suécia viveu uma crise de imigração, quando chegaram 163.000

imigrantes (o que fez dobrar o número de imigrantes no país), muitos

dos quais oriundos da Síria, da Turquia, do Irã e do Afeganistão.

Todas estas medidas explicam o crescimento do partido nazista. Em

2011, o partido tinha apenas 5,7% dos votos, sendo que apenas 8%

da população acreditava que a imigração era um problema. Quatro

anos depois, em 2015, quando a imigração chegou ao seu ápice, o

partido nazista obteve o apoio de 20% da população. No ano

seguinte, 24% dos suecos consideravam a imigração como o

problema mais significativo do país. Recentemente, 44% citaram a

imigração como sendo um dos maiores problemas que o país

enfrenta. Durante a última eleição, o partido nazista fez a sua

campanha eleitoral baseada na premissa, entre outras, que os

socialistas estavam “reduzindo os direitos sociais para liberar fundos

públicos para dar assistência aos imigrantes”. E eles adotaram este

slogan: “Suécia é para Suecos”, significando que os imigrantes não

mereciam os direitos desfrutados pelos “verdadeiros” suecos.

A experiência no outro polo político do Atlântico Norte: a

enorme crise do modelo neoliberal dos EUA

O crescimento do fascismo nos EUA era igualmente previsível. O

neoliberalismo de Reagan que começou nos anos de 1980 estava se

expandindo e o presidente Bill Clinton o incorporou totalmente no

Partido Democrata e no seu governo. Quando fazia campanha para a

presidência em 1992, Clinton ofereceu propostas relativamente

progressistas, até adotando o estabelecimento de um programa

nacional de saúde que fazia parte da candidatura de Jesse Jackson

nas primárias do Partido Democrata em 1988 e que teria garantido o

direito dos estadunidenses de ter cuidados de saúde. Enquanto

conselheiro de Jesse Jackson em 1988, eu trabalhei naquela

proposta.

No entanto, Clinton mudou depois que foi eleito. Além de aprovar o

altamente impopular acordo de livre comércio entre os EUA, o

Canadá e o México, ele renunciou a muitas das suas propostas –

incluindo o estabelecimento de um programa nacional de saúde. Mais

tarde, a sua esposa Hillary Clinton, que serviu como Secretária de

Estado durante o governo do presidente Barack Obama, promoveu o

processo de globalização com um aumento na mobilidade naquilo que

é chamado de o Sul Global.

As consequências desta globalização neoliberal foram devastadoras

para a classe trabalhadora nos setores industriais. Há milhares de

exemplos: Durante muitos anos em Baltimore (onde se localiza a

Universidade Johns Hopkins – onde eu tenho ensinado há mais de

meio século), a indústria do aço era uma das mais importantes fontes

de emprego da cidade. A maior aciaria deixou a cidade e os bairros

dos trabalhadores da aciaria (a maioria de brancos, de colarinho azul

[industriários] e bem pagos) mudaram radicalmente e agora estão

desolados. A mortalidade nestas áreas aumentou significativamente

devido à doença do desespero (suicídio e vício em drogas). A grande

maioria dos residentes nestes bairros votou no Trump.

Atualmente, os estabelecimentos políticos e das mídias neoliberais

estão profundamente desacreditados dentre as classes populares,

especialmente nas classes trabalhadoras – e especialmente dentre os

brancos, a maioria dos quais se abstêm de votar. Esta situação é

responsável pelo crescimento da ultradireita que precedeu Trump e a

qual ele usou de uma maneira muito astuta ao se apresentar como

“um establishment antineoliberal”. Num outro artigo, eu expliquei que

tal movimento tem as características do movimento fascista no sul da

Europa, uma realidade que eu conheço bem porque eu vivenciei o

fascismo em primeira mão na minha juventude. Eu tive que deixar a

Espanha porque eu era membro do movimento antifascista

clandestino nos anos de 1960. E agora, a ultradireita espanhola,

sucessora do partido fascista dos anos de 1960, tem uma ideologia

muito similar ao Trumpismo, com quem ela tem uma relação

próxima. O Trumpismo tem muitas características e posições políticas

similares a ultradireita espanhola e muitos outros movimentos

europeus de direita que se apresentam como defensores da pátria e

da civilização cristã. O seu principal ideólogo é Steve Bannon, que

está tentando estruturar uma nova internacional de ultradireita que

inclui Putin, Giorgia Meloni, Le Pen, Bolsonaro e muitos outros.

Putin merece uma menção especial neste estudo, porque o seu

governo é apresentado por muitos conservadores como um governo

comunista, sucessor dos governos da União Soviética. Putin foi o

braço direito de Yeltsin, que foi apoiado pelos presidentes Bush e

Clinton dos EUA no seu desmantelamento completo da União

Soviética e o sistema econômico e social promovido por aquele

regime. Yeltsin e Putin privatizaram a maior parte dos meios de

produção (exceto a energia) responsáveis pelo maior aumento da

mortalidade da população russa desde a Segunda Guerra Mundial.

Hoje em dia, a Rússia é uma economia capitalista operada por uma

ditadura altamente corrupta, com uma ideologia nacionalista

profundamente conservadora – resultado da aliança do estado russo

com a Igreja Ortodoxa Russa. E o governo Putin claramente

simpatiza com os movimentos internacionais de direita, incluindo o

Trumpismo nos EUA.

O Trumpismo é um Movimento Fascista?

O establishment do Partido Republicano está perdendo a sua

capacidade de mobilização e está sendo substituído pelo Trumpismo,

que se caracteriza por um discurso visando principalmente as classes

populares. Ele use um discurso “operário” (referindo-se

explicitamente aos trabalhadores como sendo a sua gente), que

apresenta o establishment das mídias políticas liberais baseadas em

Washington como o inimigo. Atualmente, este movimento inclui a

maior parte da base eleitoral do Partido Republicano e a maior parte

da liderança do partido, que conquistou uma maioria nas eleições de

meio-de-mandato (da presidência) na Câmara dos Representantes

Federais no Congresso dos EUA em 8 de novembro de 2022 – o que

os capacita para controlar a liderança parlamentar daquele partido,

empoderando-a para enfraquecer o governo Biden, com uma

possibilidade de retomar a presidência dos EUA em 2024. Isto , teria

consequências devastadoras não só para os EUA, mas também para o

mundo – uma realidade aparentemente ignorada pelo establishment

político da União Europeia.

O Partido Democrata dos EUA – cujo aparato é controlado

basicamente pelos Clintonianos, cuja maior influência é sobre a

política externa – é liderado por Joe Biden. Pressionado pela

esquerda, sob a liderança do Senador Bernie Sanders, Biden

astuciosamente se apresenta como herdeiro do ex-presidente

Franklin D. Roosevelt, favorecendo um novo ‘New Deal’ com

elementos progressistas. No entanto, desde que ele assumiu o

governo, a pauta progressista de Biden tem sido boicotada ou

eliminada devido à resistência interna do partido e à pressão dos

interesses econômicos e dos lobbies dos negócios e das corporações.

Esta situação desapontou amplos setores do eleitorado Democrata.

As medidas extremas do Trumpismo – como a decisão da Suprema

Corte (controlada por tal movimento) em junho de 2022 de revogar a

lei Roe v. Wade (1973), que garantia o direito constitucional ao

aborto – mobilizou uma resistência. Outras decisões da Suprema

Corte também mobilizaram a base eleitoral do Partido Democrata

para parar o Trumpismo. No entanto, a principal razão para mobilizar

o eleitorado do Partido Democrata nos EUA é parar o Trumpismo, ao

invés de apoiar as políticas de Biden – as quais criaram consideráveis

desapontamentos. A popularidade de Biden é muito baixa e a maioria

da população estadunidense está insatisfeita com a situação

econômica atual do país – que a maioria da população atribui às

políticas de Biden.

Uma última nota sobre os EUA: Aparentemente, os establishments

políticos e das mídias na União Europeia não estão plenamente

conscientes sobre o caráter fascista do Trumpismo, já que eles

consideram este rótulo como um exagero. No entanto, uma anedota

reflete por que a relutância deles é um erro. Em 6 de janeiro de

2021, Donald Trump tentou mobilizar os generais do exército dos

EUA para encenarem um golpe militar a fim de obstruir a

transferência pacífica de poder, depois que ele perdeu a eleição. Esta

estória foi bem documentada por Susan B. Glasser e Peter Baker na

revista New Yorker (em 8 de agosto de 2022) e referenciada no

jornal The New York Times (em 8 de setembro de 2022). O fato de

que o establishment militar se recusou a obedecer ou a agir sob as

ordens dele frustrou e enraiveceu Trump – que anunciou que queria

generais leais a ele, como fez Hitler. Numa conversa privada, um

auxiliar lembrou ao presidente que alguns generais alemães tentaram

assassinar Hitler e quase tiveram sucesso – um fato que Trump

iradamente negou. Ele insistiu que ele esperava os generais de Hitler

foram fiéis a ele e que ele esperava o mesmo dos seus oficiais.

Trump deixou isto claro ao General Mark A. Milley antes de nomeá-lo

como chefe do Estado Maior. Milley prometeu que faria qualquer coisa

que o presidente pedisse. Mas ele não esperava que Trump pediria a

ele que aprendesse sobre os limites da sua lealdade. Isso ocorreu em

um protesto do movimento Black Lives Matter em junho de 2022. O

presidente Trump propôs que o general instruísse as tropas – que

tinham sido alocadas para impedir os protestos – que disparassem as

suas armas diretamente na multidão. Milley escolheu não dar a

ordem. Esta não foi a primeira vez que o general se sentiu

desconfortável com um pedido de Trump; mas daquela vez, ele ficou

tentado a pedir demissão. Milley escreveu uma carta ao presidente.

Porquanto ele jamais tenha enviado a carta, esta foi publicada nos

artigos mencionados acima. Nela, Milley acusou Trump de ter valores

típicos do fascismo e do nazismo. Referenciando-se na Segunda

Guerra Mundial – a qual ele chamou de uma guerra contra o fascismo

e o nazismo – o general escreveu: “Agora fica evidente para mim que

você não compreende o significado daquela guerra. Na verdade, você

apoia muitos dos princípios contra os quais nós lutamos. Eu não

posso fazer parte deste projeto”.

Como Contrapor-se ao Impacto das Políticas Neoliberais sobre

a Democracia e as Classes populares

Apesar deste artigo ter focalizado no crescimento do fascismo e o

nazismo em dois pólos do espectro político do Atlântico Norte, a

Suécia e os EUA – dois países que eu conheço bem – e uma

experiência similar ocorreu em muitos outros países, respondendo às

mesmas causas – a aplicação das políticas neoliberais pelos seus

governos tiveram consequências similares: o dramático declínio da

qualidade de vida e do bem-estar das classes populares, exacerbado

pela pandemia do Covid-19. Como consequência disso, atualmente

nós vemos um descontentamento geral com o sistema democrático

liberal, o qual enfrenta uma profunda crise de legitimação nos dois

lados do Atlântico Norte. Caso as coisas não mudem, a situação ficará

ainda pior. Um crescente número de protestos está sendo canalizados

por estes partidos de ultradireita que se apresentam como sendo

anti-establishment.

A única maneira de responder a esta ameaça aos sistemas

democráticos e de defender as classes populares – as quais

representam a maioria da população em qualquer país – é que os

partidos progressistas de todas as partes renovem o seu

compromisso com uma profunda transformação das suas respectivas

sociedade. Há uma necessidade de se reverter a concentração de

poder econômico, financeiro, nas mídias e na política que vem

ocorrendo desde os anos de 1980, com a aplicação da chamada

revolução neoliberal na maioria dos países em ambos os lados do

Atlântico Norte. Estamos testemunhando os efeitos daquela

revolução. Para que esta reversão ocorra, haverá a necessidade de

uma pressão popular para democratizar as instituições de estado e

para diversificar os principais meios de informação e de comunicação

– os quais estão altamente controlados nos tempos atuais. E à nível

internacional, é imperativo mudar e se opor a esta globalização

neoliberal e às guerras que esta gerou, que ameaçam a própria

sobrevivência da humanidade. As evidências mostram claramente

que, para parar com estas políticas suicidas, estas devem ser

substituídas por políticas solidárias, porque os atuais problemas do

mundo todo (como a pandemia, a extrema mudança climática e

outros) demonstram que o bem-estar da maioria não pode ser

assegurado sob a atual ordem internacional, a qual enriquece uns

poucos às custas da miséria dos muitos. Com este propósito, há uma

necessidade urgente de desmistificar a ideologia neoliberal

dominante, a qual persiste na maior parte dos círculos intelectuais e

acadêmicos nesta parte do mundo, falsificando as realidades que nos

cercam e nos levando para o fim da humanidade.

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