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“Agro é fogo”: dossiê aponta que incêndios florestais são um projeto político no Brasil

Articulação “Agro é Fogo” destaca que o uso do fogo como arma em conflitos por terra aumentou no governo Bolsonaro

Jair Bolsonaro e queimadas na Amazônia (Foto: Agência Brasil)

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Gabriela Moncau, Brasil de Fato - Só no ano de 2021, 142 conflitos envolvendo fogo criminoso atingiram  cerca de 38 mil famílias no Brasil. Entre as 132 comunidades diretamente  afetadas, algumas foram incendiadas mais de uma vez. O estado do Mato Grosso do Sul, com 26 ocorrências, desponta como o campeão, seguido pelo Mato Grosso.  

Neste segundo, das dez áreas protegidas mais desmatadas entre agosto de 2020 e julho do ano passado, seis são do povo Xavante.  Para se ter ideia, a área atingida por incêndios florestais no Mato  Grosso equivale a quase cinco vezes o tamanho de São Paulo. 

A escalada destes números aconteceu durante o governo Bolsonaro.  Conflitos envolvendo fogo acontecem em todos os biomas brasileiros, mas  em 2021 o Cerrado concentrou 54% deles. De um ano para o outro, a taxa de desmatamento  nessa região subiu 7,9% - o maior crescimento desde 2015. Desde que Jair  Bolsonaro (PL) assumiu a presidência do país, em 2018, a devastação no  Cerrado cresceu 17%. 

A partir de sistematizações da Comissão Pastoral da Terra (CPT), estes dados estão na terceira fase do dossiê da Articulação “Agro é Fogo”.  Lançado nesta quinta (13), o material de 100 páginas enfatiza a relação  intrínseca entre os incêndios nos biomas brasileiros, os conflitos por  terra e a política posta em prática pelo governo federal.  

“O aumento das queimadas criminosas faz parte de um projeto político  que está diretamente ligado às ações do poder legislativo e executivo”,  ressalta a articulação “Agro é Fogo”, que reúne 30 organizações e  pastorais atuantes na defesa da Amazônia, Cerrado, Pantanal e seus  povos.  

Citando que nas áreas da Amazônia Legal 44% das comunidades que  sofreram com incêndios tiveram de enfrentar também ações de desmatamento  e grilagem de terras, o documento reforça que o contexto é de uma  “sobreposição de violências”.  

“São áreas ricas em sociobiodiversidade sendo desmatadas com tratores  e fogo, e depois empobrecidas com gados e monocultura, tudo isso ao  redor das terras indígenas”, aponta o relatório. 

O rastro das queimadas 

Sob o título “Brasil em Chamas - o poder político no rastro dos  incêndios”, o dossiê é composto por cinco artigos e sete textos sobre  casos específicos de conflitos por terra envolvendo fogo criminoso.  Entre eles, a luta do povo Krahô-Kanela por seu território no Tocantins;  os Karipuna em Rondônia e os incêndios nos territórios veredeiros em  Bonito de Minas Gerais.  

Também no estado de Rondônia, as invasões na Terra Indígena (TI)  Uru-eu-wau-wau, onde vivem sete povos (quatro dos quais isolados), são  abordadas no relatório. Demarcada desde 1991, nos últimos três anos, a  TI tem sido invadida por grileiros que acessam a área por meio da  fazenda Marechal Rondom, que faz limite com o território. Neste contexto  de conflito, um indígena foi espancado até a morte em 2021. Em reação  às invasões, os Uru-eu-wau-wau vem se organizando com vigilância e  combate autônomo aos incêndios.  

No Mato Grosso, os Xavante, que se autodenominam A’uwe, enfrentam  mais do que as tensões das suas 11 terras estarem rodeadas pelo  agronegócio e de incêndios terem atingido uma área de 7.400 km² só em  2021. Além disso, eles têm sido pressionados, segundo o dossiê, “pelo  projeto inconstitucional mobilizado pelo governo Bolsonaro, chamado  ‘AgroXavante’, para expandir o monocultivo dentro das terras  indígenas”. 

“O dia do fogo não parou” 

Quem vive em São Paulo provavelmente se lembra do dia 10 de agosto de  2019 quando, no meio do dia, o céu escureceu. O fato da fumaça das  queimadas na Amazônia alcançarem o Sudeste deu ao que ficou conhecido  como “Dia do fogo” repercussão internacional. 

Incentivados pelo discurso de Bolsonaro, fazendeiros da região Norte  do Brasil articularam, naquela data, uma ação organizada para desmatar,  com fogo, áreas florestais visadas para a grilagem. De acordo com o  dossiê recém lançado, no entanto, a prática segue ininterrupta.  

O documento aponta que algumas das áreas devastadas na ocasião, como o  Projeto de Desenvolvimento Sustentável (PDS) Terra Nossa, no Pará,  continuam sendo “invadidas por grileiros e gerando conflitos agrários  mesmo sendo uma terra destinada, por lei, à Reforma Agrária”.  

Segundo texto assinado pelos advogados e membros da CPT José Raimundo  de Santana e Raione Lima Campos, somente neste assentamento paraense  quatro lideranças já foram assassinadas. “A cada ano os focos de  incêndio aumentam e a recorrência são os mesmos locais em que existe  forte atuação do agronegócio”, salientam. 

“A cadeia do agro utiliza o fogo de forma direta ou indiretamente  associada a processos de desmatamento e grilagem, buscando consolidar a  expansão da fronteira agrícola”, constata o dossiê, caracterizando os  incêndios florestais como vetores da devastação ambiental e, ao mesmo  tempo, como arma para expulsar os povos de seus territórios. 

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