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    Entenda a situação do Haiti e o risco de paramilitares tomarem o poder

    O primeiro-ministro do Haiti, Ariel Henry, ainda não conseguiu voltar ao país depois que grupos paramilitares atacaram uma penitenciária, libertando 4 mil presos

    Manifestantes pedem renúncia do primeiro-ministro do Haiti, Ariel Henry, em Porto Príncipe (Foto: REUTERS/Ralph Tedy Erol)

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    Por Lucas Pordeus León, da Agência Brasil - A situação de conflagração armada no Haiti é hoje mais grave do que nos momentos que antecederam às intervenções militares internacionais de 1994 e 2004, com risco real de grupos paramilitares tomarem o poder, segundo avaliaram dois especialistas no tema ouvidos pela Agência Brasil.

    O primeiro-ministro do Haiti, Ariel Henry, ainda não conseguiu voltar ao país depois que grupos paramilitares atacaram uma penitenciária, libertando 4 mil presos, e estiveram próximos de controlar o aeroporto internacional de Porto-Príncipe, capital do país caribenho. Sem conseguir voltar ao Haiti, Henry pousou em Porto Rico, território dos Estados Unidos no Caribe.

    “A situação hoje no Haiti é extremamente perigosa, extremamente volátil, e nós podemos, como sempre acontece no Haiti, esperar o pior: que é a tomada de poder por parte dessas gangues. Uma vez eles tomando o poder, desalojá-los será muito mais custoso”, destacou o o professor aposentado de relações internacionais da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) Ricardo Seitenfus, que atuou como representante da Organização dos Estados Americanos (OEA) no Haiti durante a ocupação liderada pelo Brasil.

    O pesquisador do Grupo de Estudos em Conflitos Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), João Fernando Finazzi, destacou que os grupos armados estão mais fortes hoje que antes das últimas intervenções internacionais e acredita que, por isso, há uma possibilidade real de que eles tomem o poder em Porto Príncipe.

    “Os grupos estão mais profissionalizados, com operações com táticas mais complexas, armamento muito mais pesado, ponto 50, rifles, snipers e drones, sendo que boa parte desse armamento, os relatórios da ONU [Nações Unidas] já mostraram, vem dos Estados Unidos, principalmente da Flórida”, destacou.

    As gangues - O líder de uma dessas gangues com mais visibilidade é Jimmy Cherizier, um ex-policial conhecido como Barbecue e alvo de sanções dos Estados Unidos e da ONU. Autointitulado revolucionário, ele foi a público pedir aos grupos armados que suspendam as hostilidades entre si e se unam para derrubar o primeiro-ministro.

    “Esses grupos que estavam se matando, que estavam disputando o controle no país, eles convergem na pauta de oposição ao governo”, acrescentou Finazzi, que é doutor em relações internacionais pelo programa San Tiago Dantas.

    Para o professor aposentado Ricardo Seitenfus, esses grupos são oportunistas e estão aproveitando o vácuo de poder causado pela fraqueza das forças policiais.

    “Eles veem a oportunidade, primeiro, de fazer os sequestros e aferir lucros com os resgates. Mas notam hoje que eles podem ter um papel político. Há um discurso tentando dizer que esse é um suposto processo revolucionário. O que há por trás disso é que sempre houve uma espécie de conivência, de aceitação, às vezes até de colaboração entre o poder político e as gangues no Haiti”, afirmou.

    João Finazzi reforçou que sempre houve uma relação entre os grupos paramilitares e os partidos políticos no Haiti. Além das gangues com atuação criminosa, Finazzi enfatiza que o Haiti tem grupos armados de autodefesa dentro das comunidades.

    “Tem grupos armados que, por vezes, não são necessariamente gangues puramente criminais. Você tem alguns grupos armados de autodefesa que têm uma certa representatividade comunitária também”, comentou Finazzi, que diz ser difícil definir a natureza desses grupos.

    “É muito difícil distinguir se são grupos criminosos ou se são revolucionários porque pode ser um grupo revolucionário, mas que comete crimes. Ao mesmo tempo, pode ter grupos simplesmente criminosos que usam da ideia de revolução para conseguir alcançar seus fins particulares”, acrescentou.

    Governo não eleito - Com cerca de 80% da população desempregada e 60%, analfabeta, o Haiti vem registrando uma deterioração da segurança pública desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse, em julho de 2021. O caso ainda não foi resolvido e há dezenas de suspeitos, incluindo o próprio primeiro-ministro e a esposa de Jovenel, Martine Moïse.

    Herdeiro político indicado por Moïse, Henry chegou ao poder sem passar por eleições. Apoiado pela comunidade internacional desde então, ele já prometeu realizar eleições por duas vezes. Na última vez, prometeu deixar o cargo em 7 de fevereiro deste ano, o que não aconteceu. Agora, o premiê informa a interlocutores que pretende ficar no governo até agosto de 2025.

    “Ele está no poder há três anos governando por decretos. O Parlamento haitiano não tem nenhum membro. Então, a impressão que se tem, e certamente não é errônea, é de que há uma postergação indefinida desse governo que deveria ser de transição”, destacou o pesquisador João Fernando Finazzi, acrescentando que o Haiti está há sete anos sem eleições.

    “A comunidade internacional falhou em lidar com esse processo exatamente na medida em que não pressionou o suficiente o primeiro-ministro Ariel Henry para que ele realizasse essas eleições”, completou.

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