2020: o ano que não vai à escola
Como se pode observar é forte o impacto da pandemia sobre a educação brasileira o que, imediatamente aprofunda as desigualdades sociais existentes e rebaixa mais ainda a qualidade da educação brasileira. E pasmem: o governo federal nada faz a respeito
A pandemia de Covid-19 está pressionando os sistemas públicos e particulares de educação a oferecer ensino remoto a distância. Mais de 28,6 milhões de estudantes da educação básica e 3,7 milhões da educação superior, em pesquisa realizada pelo Senado Federal (Senadorense, agosto de 2002) passaram a ter aulas remotas. Aparentemente são números estonteantes que devem agradar a muitos políticos que prezam pelas formas utilitaristas mais antidemocráticas, que até Stuart Mills reprovaria. Mas, se olhamos de outra perspectiva, a realidade é perversa, sobretudo, com os estudantes mais pobres: 59,7% dos estudantes da educação básica e 44% da educação superior estão excluídos. Grande quantidade afirma não ter internet em casa e apenas 24% usam PC para receber os conteúdos postados; a maioria usa celulares, mas a pesquisa deixa de especificar se são pré-pagos ou pós-pagos, qual a qualidade do sinal e qual o tamanho dos seus pacotes de dados.
Nesta mesma pesquisa chama a atenção a resposta expressamente subjetiva dos participantes quanto à qualidade das aulas: para 64% a qualidade diminuiu; aumentou para 8% e 22% afirmaram que permaneceu igual; 6% abstiveram-se. Como em todas pesquisas, é provável que ficaremos sem saber em que as aulas pioraram, melhoraram ou continuaram igual. É, entretanto, significativo que a maioria tenha atestado a diminuição da qualidade e isto é deveras preocupante porque, conforme demonstrei em texto anterior, a qualidade da educação básica e da educação superior no Brasil está muito aquém da qualidade desejada, como atestam os indicadores de qualidade da OCDE, utilizados pelo MEC, e da Clarivate Analytcs.
Como se pode observar é forte o impacto da pandemia sobre a educação brasileira o que, imediatamente aprofunda as desigualdades sociais existentes e rebaixa mais ainda a qualidade da educação brasileira. E pasmem: o governo federal nada faz a respeito. O novo ministro, o professor Milton Ribeiro, empossado como quarto ministro de educação deste malfadado governo, desde a sua posse em 16 de julho nenhuma palavra pronunciou a respeito desta grave crise educacional. A Presidência da República por sua vez, por opção, também fecha os olhos à morte de mais de 100 mil brasileiros e mais de 3 milhões de contaminados, preferindo uma falsa interpretação de humanitarismo ao enviar ajuda material ao povo do Líbano após a explosão no porto de Beirute.
A sensatez no campo da educação começa a ser revelada pelos estudantes de vários estados brasileiros. O BBC News (10 agosto 2020) conversou com diversos e, segundo pensam a educação a distância, deveria ser “pensada com seriedade, não como paliativo ou improviso, como estamos fazendo, de qualquer maneira". Muitos estão chegando ao ponto de preferir a reprovação: “Não é que vou tomar bomba, eu só vou realmente fazer meu terceiro ano, ano que vem. Aprender de verdade para ter condições de fazer um Enem decente, digno". "Se eles não cancelarem essas aulas, eu vou reprovar de propósito. Não dá, mano, tá impossível estudar via internet". "No caso, não seria reprovar, seria fazer mesmo o segundo ano. A gente não está fazendo o segundo ano, nem sei o que a gente está fazendo. Todos os meus amigos estão com dificuldade, todos reclamam, ninguém está entendendo nada das matérias".
Não fossem as razões de sobrevivência das instituições particulares de ensino básico e superior, o melhor que poderia ser feito seria declarar inexistente o período letivo de 2020 até a suspensão do isolamento social. Nestas “grandes férias” escolares o MEC coordenaria a retomada das aulas presenciais sem prejuízos para os estudantes, desenvolveria plataforma digital para ações emergenciais e coordenadas e proporia um calendário acadêmico nacional para todos os estudantes de forma a garantir os seus prazos de conclusão e a aquisição de conteúdos de qualidade. As universidades, por sua vez, teriam tempo para debater o oferecimento de ensino remoto e desenvolver propostas de uma pedagogia para o século XXI.
Mas isto, dependeria de vontade político-social, o que parece não estar na agenda de preocupações do atual governo federal: ele prefere passeios de moto e helicóptero nos finais de semana, assistir a partidas de futebol, oferecer comprimidos de cloroquina às emas do Palácio da Alvorada e demonstrar nenhuma compaixão para com as famílias das vítimas da Covid-19.
Este ano, 2020, não tenho muita dúvida, entrará para a História, como sendo o ano que não vai à escola!
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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