A Argentina se prepara para combater um inimigo visível: as grandes fortunas
Em vias de compensar o colapso econômico e incrementar o sistema sanitário, a Comissão de Orçamento e Fazenda, estará submetendo ao Congresso, um projeto de lei proposto pela Frente de Todos para implementar o chamado “Imposto Pátria” a ser cobrado da minoria super-rica da Argentina, possuidora de grandes fortunas
O “imposto pátria” sobre as grandes fortunas
A Argentina está prestes a cobrar das grandes fortunas o custo das vidas ameaçadas pelo coranavirus. O governo acelera o protagonismo do Estado para evitar maiores danos à vida humana e sanar a economia enferma, deixada pelo macrismo e agravada pelo coronavirus. Em vias de compensar o colapso econômico e incrementar o sistema sanitário, a Comissão de Orçamento e Fazenda, estará submetendo ao Congresso, um projeto de lei proposto pela Frente de Todos para implementar o chamado “Imposto Pátria” a ser cobrado da minoria super-rica da Argentina, possuidora de grandes fortunas.
A AFIP (Receita Federal) acaba de revelar que há 950 contas bancárias de bilionários argentinos no exterior, sem declarar, em paraísos fiscais, totalizando cerca de 2,6 bilhões de dólares. Informações como essas já fornecidas pela OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico) em 2017 foram logicamente ignoradas pelo governo Macri que, ao contrário, favoreceu a fuga de 88 bilhões de dólares em quatro anos, incluindo os da sua família. São altíssimas fortunas do ápice de uma pirâmide dos 10% mais ricos que ganham 21 vezes mais que os 10% mais pobres. O governo argentino deverá enviar um projeto de lei para aprovação no Congresso, que lhes obrigue o pagamento de impostos extraordinários para que o Estado possa incrementar o sistema sanitário, a arrecadação tributária e compensar a derrubada da economia, agravada com o coronavirus.
O presidente Alberto Fernandez se reuniu com o deputado nacional, Carlos Heller (Partido Solidário, da Frente de Todos), que dirige a Comissão de Orçamento e Fazenda, com o Ministro da Economia, Martín Gusmán, e o deputado Máximo Kirchner (chefe da bancada da Frente de Todos). O projeto de lei a ser anunciado compreenderá patrimônios superiores a 3 milhões de dólares que implicam 50 arquimilionários, cerca de 11 mil pessoas possuidoras. Porta-vozes desses setores ricos e concentrados, da oligarquia, da UIA (União industrial argentina), como o ex-ministro da economia de Macri, Alfonso Prat Gay e a ex-ministra da Segurança Pública, Patrícia Bullrich, já levantaram seu grito de guerra pela mídia hegemônica e twitters. Essa minoria, a das grandes fortunas, a ser abarcada pela lei do “Imposto Pátria” seria só de 1,1% de contribuintes de Imposto de renda sobre patrimônio; seriam 0,08% da população ativa, e não perderiam nada em proporção à monstruosidade dos seus bens. Calcula-se que imediatamente o Estado arrecadaria 3 bilhões de dólares que, de toda forma, seriam paliativos, mas que cobririam 6 meses de entradas de emergência, e em condições de terra arrasada pela economia herdada.
Enquanto isso, Cristina Kirchner, vice-presidenta da nação recebeu aprovação, como presidenta do Senado, para apresentar à Corte Suprema de Justiça uma ação declaratória que dê a certeza de que se possa aprovar leis através de sessões do Congresso por vídeo-conferência, devido ao isolamento obrigatório diante do coronavirus. Desta forma, projetos de lei, como do imposto às grandes fortunas deverão ter garantias constitucionais. Passados já três dias, a Corte ainda não se pronunciou, sendo que ela mesma tem se reunido virtualmente, à distância. Tanto quanto no Brasil, a “Justiça” não tem sido neutral, e a demora pode ser indicativa de tendências entre os juízes que operam a favor das grandes fortunas.
As grandes fortunas, assim como o coronavirus, não têm fronteiras e matam
Na Argentina, um dos milionários, o industrial Paulo Rocca, dono da Techint, indústria de engenharia e construção de alto porte, acabou demitindo 1450 trabalhadores, alegando crise econômica. No valioso artigo e vídeo da jornalista ítalo-catalã, Alba Sidera, que abriu os olhos do mundo sobre o brutal crime do capitalismo italiano frente à pandemia do coronavirus, e a cumplicidade dos patrões das grandes empresas no genocídio em Bérgamo, na Itália, desvenda como a família Rocca, para quem a “economia está acima de tudo”, é responsável além das fronteiras argentinas pela exploração capitalista e o descaso às vidas humanas.
Aqui vão algumas revelações da jornalista, entre as dolorosas imagens de um mundo em estado de verdadeira guerra contra a humanidade, em que desfilam 70 caminhões do exército levando cadáveres de mortos por coronavirus em Bérgamo. “Vamos dar o nome das fábricas que não quiseram fechar. Uma das empresas da zona é Tenaris, líder mundial na fabricação de tubos e serviços para a exploração e produção de petróleo e gás, com uma faturação de 7,3 bilhões de dólares e sede legal em Luxemburgo. Emprega 1.700 trabalhadores na sua fábrica de Bergamasca e pertence à família Rocca, com Gianfelice Rocca, o oitavo homem mais rico da Itália.” Leia artigo completo.
Os que não têm fortunas, mas são ricos em solidariedade, serão reconhecidos pela memória e a consciência social
É inegável que o mundo se encontra entre a insegurança mundial no combate ao coronavirus, e a incógnita sobre a posteridade. Por um lado, estão os EUA e o Brasil, onde a violência das palavras e as decisões genocidas de governantes como um Trump (que renega a OMS) e um Bolsonaro (que abraça o coronavirus como arma de extermínio massivo), ainda não se defrontaram com uma contrapartida de uma saída política organizada das forças populares. Por outro, se encontra a Venezuela que dá exemplo, como governo e organização social, de combate ao coronavirus enquanto luta contra o bloqueio e as ameaças diárias do Trumpvirus. Em paralelo, a Argentina, que conta com um governo popular que defende com as armas do Estado e da ciência a vida do seu povo, mas enfrenta uma economia destroçada pelo neo-liberalismo, com tantas pressões de um mundo turbulento e incerto. E por outro, uma China, economicamente forte, quase vitoriosa frente ao coronavirus, junto à pequena Cuba, bloqueada pelo imperialismo; com as características comuns a um modelo solidário e em prol do bem comum dos povos.
É inegável que estes últimos exemplos são os que, em plena guerra, estão gestando uma consciência por um novo sistema mundial de economia planificada e de relações humanas superiores. Há dois dias, partiu da Argentina um Airbus da Aerolineas Argentinas (que Macri quis privatizar) com 17 tripulantes rumo a China para buscar 13 toneladas de insumos, material sanitário e de proteção, para enfrentar o coronavirus. Na realidade, outras doações chinesas já chegaram à Argentina. A nobreza da solidariedade dos chineses se expressa nas caixas que chegam com bandeiras de ambos os países e frases impressas como de Martin Fierro: “Nós, irmãos, estejamos unidos, porque essa é a lei primeira. Tenham uma verdadeira união em qualquer tempo que seja”. Ou com a frase de Séneca ao enviar doação à Itália: Somos ondas do mesmo mar, folhas da mesma árvore, flores do mesmo jardim”. Ou na Espanha: “As boas fontes se conhecem nas grandes secas; os bons amigos, em momentos de necessidade”.
A dívida externa é impagável, porque os pobres não pagam dívidas.
Alberto Fernández disse: “Que ninguém pense que, por cuidar da saúde dos argentinos, estamos descuidando o futuro dos argentinos”. De fato, tudo indica que muitas resoluções importantes no plano econômico ocorrerão nos próximos dias. Começar com o “Imposto Pátria” às grandes fortunas, é um bom passo!
O outro passo é o que acaba de comunicar o ministro da economia , Martín Gusman, é que a Argentina está num default virtual, e que não está em condições de pagar as dívidas ao FMI, e o fará somente em 2023. O governo pedirá um período de 3 anos para a postergação do pagamento da dívida, e negociará diminuir 5,4% do capital, e 63% dos juros da dívida. Na reunião com todos os governadores e em presença de Cristina Kirchner, o presidente Alberto Fernandez reitera o conceito já defendido de que “os pobres não pagam dívidas”, e agrega: "Para nós, uma dívida sustentável é a que podamos pagar sem adiar as necessidades de milhões de argentinos e argentinas, que já existiam em dezembro e que aumentaram com a pandemia”.
“Gostaria que todos entendamos que nós estamos dando um passo muito importante, que é o de decidir como queremos construir a Argentina do futuro”. “Talvez esta seja a oportunidade para construir outro país, mais justo, mais solidário, com maior igualdade e realmente mais federal”.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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