A avionada
Leia a crônica
A vida mãe de Higino estava emaranhada: deu nó nas tripas. Era hora de almoço e o filho saía da Regional de Pinheiros, onde trabalhava como escriturário concursado, quando recebeu a notícia via zap. Targina, a irmã mais velha, pedia urgência na ida a São Roque, local da residência da genitora. Já estavam até caçando vigário para a extrema-unção.
Higino não era barnabé graduado, mas tinha lá as suas prerrogativas no funcionalismo público. Foi parlamentar com a chefia, a saber, o doutor Ladário. Relatou a magnitude da conjuntura e saiu do gabinete com uma concessão para uso de um monomotor de propriedade da federação.
Entrou no carro de aplicativo e, momentos depois, já embarcava rumo a um aeródromo para pequenas aeronaves, na rodovia Castello Branco.
Arribaram na sequência. Passados poucos minutos, o piloto, lhe mostrando uma peça abaixo do painel, disse:
“É um teco-teco bem antigo, então vou pedir uma gentileza. O senhor segure esse caninho. Se ele esfriar, me avise na hora”.
“Mas o que acontece se esfriar?” – quis saber Higino.
“Pane seca. Como só tem motor um, é descer na hora”.
Seguiu a avionada. Nos arrabaldes de São João Novo, o cano deu para gelar. Higino, no ato, alertou o piloto. Este, ao avistar um campinho de futebol, principiou a conduta de aterragem, no modo balão apagado. Um vento de través abalroou a popa da avioneta e ela foi baixando, mais torta do que globo ocular de estrábico.
Quando tocou o solo, se virou completamente para trás. Segundo testemunhas, foi a primeira aterrissagem de marcha a ré no sul do estado paulista.
Felizmente, a mãe de Higino passa bem. É o filho agora que está retido na Santa Casa: a cervical foi parar na lombar.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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