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    Leonardo Boff

    Ecoteólogo, filósofo e escritor. Escreveu Ecologia: grito da Terra, grito dos pobres, Vozes 1995/2015; em espanhol por Trotta, Madrid 1996, Dabar, México 1996

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    A busca do bem-estar nacional e planetário

    Para os 730 milhões passando diariamente fome o desejo de bem-estar se vê continuamente frustrado

    Thawanny Silva de Souza, de 6 anos, (E) e Rafael Silva de Souza, de 9 anos, (D), comem prato com arroz, feijão e ovo na Favela do Arci-Íris, em Recife 15/09/2022 (Foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)

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    (Publicado no site A Terra é Redonda)

    Mesmo dentro do quadro sombrio em que a humanidade vive atualmente, cabe sempre colocar a questão: em que medida a humanidade, todos os países e as pessoas podem e devem colaborar para um possível e desejável bem-estar minimamente possível. Para as grandes maiorias da humanidade com 730 milhões passando diariamente fome este desejo se vê continuamente frustrado. Isso representa uma desumanidade pois temos condições econômicas e políticas para permitir que todos pudessem viver de forma decente. Mas falta-nos coração e sensibilidade para com quem padece.

    Vale a advertência do Papa Francisco em sua encíclica Laudato Sì: sobre o cuidado da Casa Comum (2015), dirigida a toda a humanidade e não apenas aos cristãos: “todos devemos fazer uma global conversão ecológica” (n. 5). Sem esta disposição para a mudança, não superaremos as ameaças que pesam sobre a Terra como as mudanças climáticas e as tragédias que já estão acontecendo.

    Podemos até chegar a um ponto de inflexão, de um não-retorno. Estaríamos face ao colapso de nossa civilização e mesmo de nossa existência sobre esse planeta. Na encíclica Fratelli tutti (2021) o mesmo pontífice foi enfático ao dizer: “estamos no mesmo barco; ou nos salvamos todos ou ninguém se salva” (n. 34).

    Alimentamos, no entanto, a esperança da Carta da Terra (2003) de que “nossos desafios ambientais, econômicos, políticos, sociais e espirituais estão interligados e juntos poderemos forjar soluções includentes” (Preâmbulo). Esse é o desafio a ser enfrentado corajosamente.

    Aclaremos antes, o que se entende por “bem-estar nacional e planetário”. A resposta não pode ser antropocêntrica, como se o ser humano fosse o centro de tudo e o único a ter um fim em si mesmo. Ao contrário, ele é um elo da corrente da vida e parte inteligente da natureza. Vale o que assevera a Carta da Terra: temos que “reconhecer que todos os seres são interligados e cada forma de vida tem valor, independentemente, de sua utilidade para os seres humanos” (I,1.a).

    No plano infra-estrutural o bem-estar é o acesso justo de todos aos bens básicos como à alimentação, à saúde, à moradia, à energia, à segurança, à educação, à comunicação e ao lazer. No plano social é a possibilidade de se levar uma vida material e humana satisfatória, na dignidade e na liberdade num ambiente sem violência, de cooperação, da solidariedade e de convivência pacífica. Este seria o grande ideal para a inteira humanidade e para as pessoas.

    Esse tipo de bem-estar que equivale ao que chamamos de bem-comum, vale para todos os países e povos. Mas como somos parte da natureza e sem ela não poderíamos viver, o bem-estar inclui a comunidade biótica, os ecossistemas e todos os representantes de diferentes espécies que possuem o direito de existirem, de serem respeitados como portadores de direitos.

    Pertence também ao bem-estar o respeito ao mundo abiótico, como as paisagens, as montanhas, os rios, lagos e oceanos, pois formamos com todos eles a grande comunidade terrenal.

    Dada a religação de todos com todos, é a cooperação entre todos a seiva secreta que nutre o bem-estar nacional e planetário como um todo. Todo o planeta, entendido como um super-ente que sistemicamente articula o físico, o químico e o biológico, alcança um bem-estar à condição de todo ele se fazer sustentável, manter o equilíbrio de todos os elementos que o compõem e conseguir permanentemente se manter e se autorreproduzir. É o que significa a categoria sustentabilidade.

    A Carta da Terra sabiamente colocou as pilastras que sustentam o bem-estar comum: uma mudança na mente e no coração. Quer dizer, ter uma visão da Terra realmente como nossa Mãe que devemos amar, respeitar e cuidar. Uma mudança no coração no sentido de estabelecer um laço afetivo com todos os seres, pois são nossos irmãos e irmãs com os quais conviveremos em harmonia. O bem comum resulta de um sentido de interdependência global entre os humanos e com a natureza. Também requer um sentido de responsabilidade universal pelo bem comum válido para toda a humanidade e para a natureza.

    Somente assim se alcança um modo de vida sustentávelque mais que um desenvolvimento econômico sustentável, aos níveis local, nacional, regional e global, expressão de um bem-estar possível e alcançável por todos nós. Talvez o grande desafio humanístico e ético é criar a condições que possibilitem esse tão ansiado bem-estar nacional e planetário. Esse bem inestimável deve ser buscado e construído dia a dia, momento a momento para garantir a sua realização possível.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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