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    Elias Jabbour

    Elias Jabbour, é doutor e mestre em Geografia Humana pela FFLCH-USP. É professor dos Programas de Pós-Graduação em Relações Internacionais (PPGRI) e em Ciências Econômicas (PPGCE) da UERJ. É autor de quatro livros e dezenas de artigos acadêmicos e de opinião sobre a China e o socialismo de mercado como uma nova formação econômico-social.

    20 artigos

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    A “estagnação” chinesa e o mundo paralelo de Krugman et al

    "Não se sustenta a comparação entre a trajetória da economia chinesa com qualquer outra no mundo", escreve Elias Jabbour

    Bandeira da China é hasteada em Pequim (Foto: REUTERS/Tingshu Wang)

    Recente artigo do renomado economista Paul Krugman busca demonstrar, como o próprio título supõe, uma “estagnação com características chinesas” (disponível em: https://paulkrugman.substack.com/p/stagnation-with-chinese-characteristics?utm_source=post-email-title&publication_id=277517&post_id=153651979&utm_campaign=email-post-title&isFreemail=true&r=upqd&triedRedirect=true&utm_medium=email ).

    Essa estagnação manifesta-se de diversas maneiras. Todas levando ao mesmo problema deflacionário enfrentado pelo Japão. Afora a utilização de esquemas de demanda agregada para expor uma quase crise (sic) de subconsumo na economia chinesa; a queda da fertilidade; queda da margem de lucro, fruto da queda na “produtividade total de fatores”, “modelo” baseado na construção civil e que “falha” enquanto economia de “renda média” e crescente desprezo e desmobilização do setor privado da economia chinesa por parte de uma liderança “intelectualmente rígida” exercida por Xi Jinping.

    Em primeiro lugar, tenho sustentado por vários meios que não se sustenta a comparação entre a trajetória da economia chinesa com qualquer outra no mundo. Seja com a dos EUA ou o Japão. Em ambos os casos tratam-se de economias capitalistas convencionais com maior ou menor grau de financeirização. O Japão, por exemplo, passou por um canto de réquiem de seu modelo no pós-Acordo de Plaza (1985) com a expansão de sua bolha imobiliária e mercado de ativos levando seu sistema financeiro a passar por imensas dificuldades. Direção oposta seguiu a China com a orientação do Partido Comunista, o senhor do Estado, a desinflar sua bolha imobiliária e dirigir a transição de dinâmica para setores de alta tecnologia.

    Crédito para manufatura (em % do PIB, 2016- 3º trimestre de 2023)

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    Aqui está o primeiro motivo para 99,9% das previsões elaboradas pelo mainstream ortodoxo e heterodoxo sobre o futuro da economia chinesa. Ao se desconsiderar que o núcleo de qualquer economia reside em seus esquemas de propriedade, e não em um jogo antiquado entre elementos de demanda agregada, perde-se de vista o fundamental: a política. Em uma economia socialista, logo baseada na propriedade pública dos meios de produção, a eficiência não se mede pela “tendência da margem de lucro” e sim pela capacidade de empreender grandes projetos sem a incerteza típica das economias capitalistas e financeirizadas. A mudança nos esquemas de crédito gerenciadas por um sistema financeiro público tem levado a China a um processo de fazer girar um elefante de em 180 graus em apenas poucos anos. E como a economia não é a arte do equilíbrio, as dores do parto deste processo são inevitáveis. Vejamos como funciona a chamada “estagnação com características chinesas” quando o assunto é o resultado deste movimento do crédito:

    elias

    A estagnação em si é uma figura de retórica onde o analista mira na China e acerta nas economias do chamado “Ocidente coletivo” prestes a voltarem a matrizes energéticas do século XIX e com taxas de crescimento muito menores que a chinesa. Mas qual a razão de Krugman, e nenhum outro, enfrentar a realidade e colocar que a China está capitaneando a maior e mais rápida transformação setorial de uma economia nacional desde a Revolução Industrial? O crescimento do PIB chinês tem sido dirigido por setores relacionados a transição energética como expõe a figura acima. Este dado nos remete para responder a outra questão em comum nos círculos ocidentais: o desemprego entre os jovens:

    China: taxa de desemprego entre os jovens (em %, 2012-2024)

    elias

    Somente no ano de 2024, a taxa de desemprego entre os jovens na China diminuiu para 13,20% em junho, em comparação com 14,20% em maio de 2024. Est mesmo índice teve uma média de 16,57% de 2021 até 2024, alcançando um recorde histórico de 21,30% em junho de 2023 e um mínimo histórico de 13,20% em junho de 2024. Esse é o resultado de uma política combinada que envolveu diretamente o enquadramento do setor privado em prol de setores onde a mão-de-obra sobrante seria aproveitada via expansão deste tipo de setor de alta tecnologia quanto de startups.

    Por fim, a questão do “consumo”. Uma economia socialista responde por uma série de subsídios que o capitalismo é incapaz de levar às últimas consequências. Por exemplo, de 44 cidades com metrôs na China, 40 operam de forma subsidiada, sendo que a de Xangai tem “prejuízo” de 400%. Por outro lado, o positivismo que serve de base às teorias econômicas tradicionais é incapaz de “tomar a parte pelo todo”. Daí não relacionarem uma queda do investimento em prol do consumo na China incorrer em uma tragédia sem precedentes para uma país de 1,4 bilhão de habitantes. Mas vamos ver como as coisas funcionam no mundo real.

    Média de aumento do consumo privado (China e países selecionados)

    elias

    Terminamos perguntando. Qual o mundo paralelo em que os economistas ocidentais estão vivendo?

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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