A frente ampla é um entrave na luta contra o fascismo
Sempre quando surge uma tendência dos trabalhadores a se mobilizar e encontrar uma solução própria à crise política dos capitalistas, a campanha da frente ampla chega com força para estancá-la
A luta política contra o fascismo assume o caráter amplo da luta contra o golpe de Estado no Brasil, principalmente em torno do “Fora Bolsonaro”. Isso reflete o aprofundamento da crise política após a derrubada fraudulenta de Dilma e a prisão ilegal do ex-presidente Lula.
A pandemia do coronavírus acirrou a crise política dentro do bloco golpista, que esteve unido nas eleições de 2018 para colocar Jair Bolsonaro no poder. Agora, Bolsonaro está em crise com setores importantes da burguesia e do imperialismo. É isso que explica - sem entrar no específico de cada disputa - os conflitos com o Supremo Tribunal Federal (STF), com governadores e a imprensa monopolista.
Essa briga entre as classes dominantes sempre foi um fator determinante da mobilização dos trabalhadores contra o regime político, uma vez que os poderosos ficam enfraquecidos por suas crises internas. A primeira revolução proletária da história, a Revolução Russa, de 1917, por exemplo, acontece em um momento de conflito extremo entre o imperialismo internacional: a 1ª Guerra Mundial.
No Brasil, à medida que se aprofundou a pandemia do coronavírus e o País se tornou um ponto central da crise sanitária internacional, o bloco golpista rachou e o governo passou a ser alvo de diversas manifestações políticas, tanto por parte das torcidas organizadas de futebol e partidos, quanto de profissionais da saúde que reivindicam melhores condições de trabalho para enfrentar a Covid-19.
Da mesma forma, os entregadores de aplicativo realizaram greve contra a precarização do trabalho. Assim como os enfermeiros, médicos e outros trabalhadores diversos dos hospitais, os entregadores encararam um aumento da exploração do trabalho durante a pandemia.
A luta contra o fascismo
Desta forma, pressionada pela população, a maioria das organizações de esquerda passaram a defender, de fato, a reivindicação pelo “Fora Bolsonaro”, o que foi expresso no pedido de impeachment assinado por todos os partidos de esquerda, institucionais ou não. Vale ressaltar que no período que vai de 2019 até antes da pandemia no Brasil, não era uma posição de consenso entre as organizações.
Ademais, realizar manifestações de rua durante a pandemia contra a política assassina que o governo e os empresários estão promovendo em meio ao coronavírus também não era consenso. Finalmente esta barreira foi rompida com as manifestações espontâneas das torcidas organizadas em São Paulo, que foi acompanhada por manifestações contra o genocídio do povo negro no Rio de Janeiro e diversas manifestações em finais de semanas seguintes.
Essa luta surgiu essencialmente, em São Paulo (onde começou), para enfrentar diretamente as manifestações bolsonaristas que pedem golpe militar, ditadura e promovem o nazismo e o fascismo. As torcidas foram à Avenida Paulista para expulsar a extrema-direita e protestar contra o governo Bolsonaro. Era um combate direto ao fascismo usando a truculência contra os truculentos fascistas.
A ideia das manifestações é correta: não há diálogo contra o fascismo.
A frente ampla
Em outro artigo, afirmei que “a frente ampla é pelo ‘fica Bolsonaro’” e este fator precisa ser claramente compreendido por aqueles que querem derrotar a extrema-direita e o governo Bolsonaro.
A ideia de uma frente ampla ou “democrática” entre a esquerda e setores da direita está em pauta desde o acirramento da luta política (e, portanto, da luta de classes) com o golpe contra Dilma. Antes mesmo da presidente ser derrubada, o PCdoB (principal porta-voz desta política na esquerda) defendeu que Dilma chamasse novas eleições.
Da mesma forma, o conjunto da esquerda já no governo de Michel Temer abandonou a luta pela restituição do governo eleito, através da campanha por “anulação do impeachment” e defenderam que o governo usurpador chamasse novas eleições.
Agora, com o aprofundamento da crise de todo o regime golpista, a frente ampla se torna ainda mais necessária para aqueles que querem “virar a página do golpe”, justamente para frear as mobilizações que se tornam cada vez mais constantes.
Assim, a frente ampla procura se reunir em torno de questões abstratas como a “democracia” e a “defesa da vida” para permitir a manobra de unir a esquerda e os partidos golpistas que criaram o bolsonarismo com a campanha contra o PT. Desta forma, em nome da aliança, colocar a esquerda à reboque da direita “democrática”. Como já denunciei, importantes lideranças da frente ampla que está se formando são contra o “fora Bolsonaro” e, portanto, contra a luta efetiva contra o fascismo.
O PSDB, de FHC, e a Rede, de Marina Silva, já se posicionaram contra o “fora Bolsonaro”. Cada vez que é chamado para comentar política, o ex-presidente tucano Fernando Henrique Cardoso busca reforçar sua “defesa da democracia” ao se posicionar contra um impedimento do governo Bolsonaro - ele que foi o articulador do golpe contra Dilma.
Já nesta linha, o PDT assume propositalmente um caráter dúbio. Enquanto leva adiante ações parlamentares para pressionar o governo e chegou a enviar para o Congresso um pedido de impeachment do governo, Cid Gomes, principal parlamentar do partido (que votaria esse pedido de seu partido), afirmou ser contra o processo.
Igualmente, PSDB, PDT, Rede e PSB se uniram ao bolsonarismo no projeto de lei para privatizar a água, para aprovar o fim da previdência social e outros ataques importantes contra os trabalhadores, deixando claro que não querem um fim do governo Bolsonaro, mas um melhoramento. Estes setores buscam pressionar de forma institucional e midiática o governo para que este assuma uma face menos impopular. Da mesma forma, sendo Bolsonaro um elemento de segundo escalão na defesa dos interesses dos capitalistas, a frente ampla quer desgastar o governo para conseguir uma vitória eleitoral nas eleições de 2020 e 2022.
Para isso, é necessário ganhar capital político, pois o que ficou claro com a eleição de Bolsonaro é que os setores mais tradicionais da direita foram totalmente desgastados pelo processo golpista uma vez que, enquanto seu eleitorado e sua base social se radicalizou e foi para o bolsonarismo, também eram impopulares do ponto de vista da esquerda.
Ou seja, na realidade são cadáveres políticos. A importância da esquerda na frente ampla é dar uma face popular para a manobra enganosa. Com o apoio dos Guilherme Boulos, Flávio Dino, Marcelo Freixo, Fernando Haddad e assim por diante, os próprios PSDB e o PDT ganham capital político para buscar uma vitória eleitoral.
A frente ampla como instrumento de contenção da luta dos trabalhadores
Quer dizer, a ideia é canalizar a luta dos trabalhadores contra Bolsonaro para uma condição institucional e, portanto, acabar com a essência do movimento que é o enfrentamento do fascismo.
Como representante da frente ampla nas mobilizações contra o fascismo, o PSOL - através de Guilherme Boulos e Danilo Pássaro - está sendo usado para descategorizar o caráter combativo dos atos. Os psolistas se reuniram com a extrema-direita para alternar os dias em que se usaria a Avenida Paulista e, o antes defensor do “fica Bolsonaro” e do “fica em casa”, Boulos decidiu entrar nas manifestações, autoproclamando-se dirigente dos atos, colocando-as no Largo da Batata. Desta forma, fizeram de tudo para evitar um enfrentamento com os fascistas, fazendo inclusive acordos com eles.
Resumindo, destruíram o caráter combativo dos atos e, portanto, os próprios atos, que surgiram essencialmente combativos. Transformaram os atos em uma defesa da política da frente ampla, no “somos democracia”, que usa verde e amarelo em apoio à campanha da golpista Folha de S. Paulo. Eles expulsaram bandeiras de partidos políticos e manifestantes vestindo vermelho e defendendo o fora Bolsonaro; transformaram os atos em comícios políticos do PSOL e de seus candidatos à prefeito, Guilherme Boulos e a vereador, Danilo Pássaro.
Sempre quando surge uma tendência dos trabalhadores a se mobilizar e encontrar uma solução própria à crise política dos capitalistas, a campanha da frente ampla chega com força para estancá-la.
Na Rússia, em 1917, a esquerda defendeu o poder para o Governo Provisório enquanto o verdadeiro poder político estava com os Sovietes (conselhos operários). Felizmente, essa manobra foi derrotada pelos bolcheviques.
Na França, em 1936, uma vez que a classe operária realizava uma de suas principais greves da história contra a extrema-direita, o stalinismo (principal força operária internacional) aliou-se com setores da burguesia para eleger a Frente Popular. O resultado foi que o movimento da classe operária foi derrotado e, assim, quatro anos depois, a situação dos nazistas para invadir o país, com o apoio da burguesia, foi facilitada. Na Espanha, no mesmo período, a Frente Popular que chegou ao poder pelos mesmos motivos, desarmou os trabalhadores radicais e não levou uma luta efetiva contra os fascistas, permitindo a ascensão de Francisco Franco.
Da mesma forma, no período que vai desde a 1941, na 2ª Guerra Mundial, até 1948/1949 o stalinismo aliou-se com o “imperialismo democrático” e impediu revoluções na França, na Itália e na Grécia, desarmando os trabalhadores, que haviam derrotado os fascistas através de um movimento guerrilheiro. Inclusive, na Itália, participaram de um governo junto com elementos do antigo regime fascista de Benito Mussolini. E assim se seguiu.
Os trabalhadores só foram vitoriosos quando romperam absolutamente com a burguesia. Naturalmente, é preciso que haja um frente contra o fascismo, mas precisa ser uma frente dos partidos, organizações e movimentos operários e populares que leve adiante a luta por “Fora Bolsonaro”. A saída são os comitês de luta contra o golpe.
Revisão: Micnéias Róberth
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