A fuga das galinhas

Katinha e Guigo estavam numa felicidade danada. Com pouco mais de um ano ali no Rio Pequeno, a loja de capinhas de celular estava vendendo mais do que garrafa de água mineral gelada em congestionamento da Marginal Tietê.

Os lucros líquidos, e sempre certos, do empreendimento já havia os levado às termas do Rio Quente, comprado um SUV, e logo poderiam sair do aluguel.

Naquele sábado à tarde, os dois combinaram de, afinal, levar o pai de Guigo para comemorar as vitórias do casal. E em alto estilo: num restaurante gourmetizado da zona sul.

Ex-vaqueiro, de origem humilde, seu Leônidas fora o responsável pela formação do filho, desde bem pequeno, depois de enviuvar.

Katinha escolheu o “Avatartar”, recomendado por nove entre dez influenciadores do Instagram. Seu Leônidas se paramentou como em dia de festa de Reis em sua São João dos Patos. Até glostora esparramou nos cabelos.

Logo que se abundaram à mesa, o garçom informou o menu da noite:

- As opções sugeridas pelo chef Aragones são: galinha asturiana ao concentrado de jabuticaba e própolis. Ou as ostras do Parnaso, ao vinagrete de uvaia, servidas numa cama de blinis.

Em seguida, se dirigindo a seu Leônidas, perguntou se gostaria de algumas das sugestões.

- Eu? Quero isso é nada.

Diplomaticamente, Katinha se interpôs pedindo outra ideia de prato para o sogro. O garçom propôs, com expressão magoada:

- A cavaquinha...

- Ela quer saber o que tem de comer. Não o que vão tocar no pardieiro hoje – replicou seu Leônidas ao atendente.

O ambiente logo se tingiu de pesado constrangimento. Tentando acertar as pontas, o empregado declarou:

- Não entendo por que o senhor não está apreciando as criações. Posso lhe mostrar meu Pinterest?

O munhecaço aplicado por seu Leônidas no equalizador de ruídos do fâmulo foi tamanho que o rapaz foi arremessado ao fundo do salão. Com o choque, uma porta se escancarou e o esquadrão de galinhas asturianas decolou pela janela. Decolagem maior do que aquela na semana, só a dos lucros da loja de capinhas de celular.