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    Heba Ayyad

    Jornalista internacional e escritora palestina

    140 artigos

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    A guerra global contra o povo palestino continua

    Os palestinos continuarão resistindo e vencendo seus inimigos, independentemente de quem os decepcione

    Pessoal de segurança e resgate israelense no local de um ataque a tiros contra um carro e um ônibus, onde pelo menos três israelenses foram mortos perto de Kedumim, na Cisjordânia ocupada por Israel (Foto: Reuters)

    Antes de falarmos sobre a guerra em andamento contra o povo palestino, quero compartilhar com nosso povo a alegria por dois momentos positivos que comoveram todas as pessoas livres e honradas deste mundo.

    O primeiro é o retorno de centenas de milhares de moradores de Gaza às suas casas e terras no norte da região. A cena angustiante dessas pessoas simples, que emergiram após 471 dias de genocídio, aguardando a abertura da passagem de Netzarim, foi marcante. Elas preferiram passar toda a noite de domingo à espera da reabertura da Rua Rashid na manhã de segunda-feira, ansiosas por retornar às suas casas, mesmo sabendo, quase com certeza, que tudo estaria destruído e coberto de escombros. As ruas diante de suas casas foram devastadas, nenhum veículo tem permissão para passar e bombas não detonadas estão espalhadas por toda parte, ameaçando a vida daqueles que sobreviveram à guerra de extermínio.

    Nosso povo construiu as mais extraordinárias lendas sobre o vínculo inquebrantável do palestino com sua terra natal, seu território e seu lar. Podem demolir suas casas, escolas, hospitais e ruas, mas falharam — e continuarão falhando — em romper o laço vital que une o palestino à sua terra e à sua pátria. O amor à pátria e a conexão com ela não serão destruídos, mesmo diante de todas as toneladas de explosivos lançadas sobre Gaza, que já ceifaram a vida de mais de dez por cento da população.

    O palestino pode ter sua casa, escola e hospital demolidos, mas ninguém será capaz de cortar o cordão umbilical que o liga à sua terra e à sua pátria. O amor à pátria e o apego a ela não serão quebrados, mesmo diante de todas as toneladas de explosivos lançadas sobre Gaza.

    O segundo momento de alegria é ver os prisioneiros da liberdade respirando aliviados fora das grades, após vinte, trinta ou até quarenta anos de encarceramento. As sentenças perpétuas foram canceladas, as celas foram abertas, e eles partiram com o que restava de seus corpos enfraquecidos, após anos de tortura, humilhação e destruição psicológica sistemática. Do lado de fora, encontraram suas mães, esposas, filhos e filhas — ou aqueles que ainda permaneciam vivos.

    As grandes manifestações de alegria irritaram a entidade sionista, que emitiu ordens para impedir a celebração do retorno dos libertos. Também enfureceram as autoridades de Oslo, que proibiram as festividades em Beitunia, nas proximidades da temida prisão de Ofer, e chegaram a prender alguns correspondentes da Al Jazeera. É impressionante ver até que ponto essa autoridade se rebaixou diante da guerra de extermínio em curso. Resta-nos fazer uma pergunta simples e direta: desde 13 de setembro de 1993, a Autoridade de Oslo conseguiu libertar algum prisioneiro?

    Dois momentos históricos sem precedentes nos tempos modernos. Um povo que emerge dos massacres, enchendo as ruas com cânticos, enquanto rasteja em direção ao que resta dos muros de suas casas, de suas memórias e de sua terra. Centenas de prisioneiros são libertados das celas graças à resistência heroica, que um dia lhes prometeu a brisa da liberdade — e cumpriu sua promessa.

    A guerra contra o povo palestino continua. Podemos observar quatro formas de guerra simultâneas, que se entrelaçam em um único objetivo: destruir a causa palestina de uma vez por todas e permitir que a entidade sionista tome posse de toda a Palestina, concluindo a Nakba de 1948.

    A guerra de Trump contra o povo palestino por meio do deslocamento

    A questão do deslocamento dos palestinos de sua terra natal não é nova. Ela faz parte do projeto sionista desde seus primórdios, sendo defendida por seus primeiros teóricos, como Jabotinsky e Ben-Gurion. A ideologia sionista baseia-se na apropriação da terra, na evacuação de seus habitantes nativos e na recepção de judeus de todo o mundo, para que a composição demográfica se torne exclusivamente judaica.

    Agora, após oito décadas, o número de árabes e judeus está quase igual, e a ideia de expulsar os palestinos tornou-se predominante no pensamento da extrema direita israelense. Isso se deve ao fato de que permitir o estabelecimento de um Estado palestino é considerado tabu, criar um Estado para todos os seus cidadãos é visto como uma utopia e manter o sistema de apartheid é insustentável. Assim, a única opção que resta para essa linha de pensamento é o deslocamento forçado ou o chamado "deslocamento forçado voluntário" — um termo que sugere voluntariedade, mas que, na prática, ocorre sob coação, quando todas as condições de subsistência são sistematicamente destruídas.

    Acredito que Trump esteja convencido dessa ideia ou já tenha chegado a um acordo com os simpatizantes estadunidenses, especialmente com a viúva de Sheldon Adelson. Em março de 2024, concordou em fornecer mais de 100 milhões de dólares para a campanha eleitoral de Trump em troca da anexação da Cisjordânia.

    O plano agora parece evidente. As declarações de Trump, feitas por duas vezes, sugerindo o deslocamento dos habitantes de Gaza para o Egito e a Jordânia, não foram meros deslizes de linguagem, mas sim um prenúncio de uma estratégia iminente. Trump também afirmou esperar cooperação do presidente egípcio e do rei jordaniano, em troca dos serviços que os Estados Unidos prestam a esses dois regimes.

    Esse plano só poderá ser frustrado por uma resistência abrangente e determinada dos palestinos, combinada com um alto nível de prontidão para o confronto. Além disso, será essencial um apoio real e significativo da Jordânia e do Egito, incluindo a garantia de que seus povos tenham liberdade para expressar publicamente sua rejeição a esse plano nefasto. Se a oposição se limitar a declarações formais do Departamento de Estado, Trump e os sionistas da Casa Branca não levarão essas manifestações a sério.

    A guerra da entidade sionista na Cisjordânia

    As forças do exército sionista, que continuam promovendo ataques e matanças, lançaram a Operação "Muro de Ferro" com o objetivo de eliminar a resistência na Cisjordânia, no dia seguinte ao fim das operações em Gaza. Essa operação foi resultado de um acordo entre Netanyahu e Smotrich, garantindo que este último não se retirasse do governo, como fez Ben Gvir.

    O exército sionista assumiu a missão anteriormente desempenhada pelas forças de segurança da Autoridade Palestina, que tentaram, sem sucesso, enfraquecer a resistência palestina. Desde então, as forças israelenses têm promovido mortes em massa, destruído infraestruturas, arrasado estradas e expandido suas operações para diversas regiões, como Tulkarm, Tubas, Tammun e Qalqilya oriental. Para isso, utilizam forças aéreas, drones e mísseis, e não há um único dia sem um número significativo de mortos.

    Essas operações representam atos de vingança cega pelo fracasso das forças de extermínio israelenses em Gaza. Elas não conseguiram erradicar a resistência nem libertar prisioneiros, exceto por meio de negociações. Essa guerra, que deve continuar por semanas ou até meses, tem como objetivo eliminar os combatentes da resistência, em cooperação com os serviços de segurança palestinos.

    No entanto, o que Israel não compreende é que, para cada mártir que cai, dezenas de novos combatentes surgem para ocupar seu lugar. Como afirmou o ex-secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, o Hamas conseguiu recompor todas as suas perdas humanas, e novos combatentes aderiram ao grupo em número equivalente aos que foram mortos.

    Proibição da UNRWA no território palestino ocupado

    Outra frente de guerra iniciada por Israel, com total apoio dos Estados Unidos, é a tentativa de impedir a atuação da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA) em Jerusalém e nos territórios ocupados. Essa proibição inclui a restrição de qualquer contato entre a agência e autoridades israelenses, além do fechamento de seus escritórios em Sheikh Jarrah, transformando essa área em mais um assentamento israelense.

    Essa medida faz parte de uma estratégia mais ampla de guerra contra os refugiados palestinos, visando desmantelar o direito de retorno e fechar escolas, clínicas e institutos de treinamento mantidos pela UNRWA. Israel tentou repetidamente eliminar essa agência porque ela representa uma testemunha viva da Nakba de 1948, do deslocamento forçado dos palestinos de suas cidades e vilas e de sua transformação em refugiados. No entanto, foi surpreendido pelo fato de que esses refugiados se tornaram os portadores da tocha da resistência, seu combustível e sua força motriz, capazes de desafiar e enfraquecer a arrogância sionista em todos os confrontos.

    Os palestinos, as Nações Unidas e os países que hospedam a UNRWA devem se preparar para as graves consequências dessa decisão, que pode ter impactos profundos sobre a situação humanitária e política da região.

    Investimentos árabes na economia sionista

    A Operação Dilúvio de Al-Aqsa teve repercussões severas na economia israelense. Segundo estimativas de economistas israelenses, o custo financeiro já chega a aproximadamente 50 bilhões de dólares. Além disso, há efeitos prolongados e sucessivos que poderão desestabilizar a economia israelense por muito tempo.

    O setor do turismo entrou em colapso total, a construção civil foi severamente afetada, centenas de empresas de tecnologia fecharam, e o investimento e o crescimento econômico caíram 4%. O mais surpreendente, no entanto, é que os países árabes que normalizaram relações com Israel estão sustentando a economia da entidade sionista.

    A Third Eye Systems, uma fornecedora israelense de equipamentos de defesa, anunciou a venda de 30% de suas ações para a empresa de defesa EDGE, dos Emirados Árabes Unidos, por 10 milhões de dólares. Esse foi um dos raros investimentos públicos dos Emirados desde o início da guerra em Gaza há 15 meses. Além disso, a EDGE anunciou um investimento adicional de 12 milhões de dólares em uma nova joint venture com a mesma empresa israelense.

    O comércio entre Egito e Israel, Jordânia e Israel, Marrocos e Israel não foi interrompido em nenhum momento durante a guerra de extermínio contra os palestinos. Diante disso, surge a questão: qualquer um que fortaleça a economia israelense não estaria, no fim das contas, contribuindo para suas contínuas guerras contra o povo palestino?

    A verdade é que Gaza foi alvo de uma guerra global e não levantou a bandeira branca. Sua dignidade permaneceu intacta, desafiando o terror e a destruição. A segunda verdade é que os palestinos continuarão resistindo e vencendo seus inimigos, independentemente de quem os decepcione. Afinal, não são eles o povo de Jerusalém e dos arredores de Jerusalém?

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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