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Milton Blay

Formado em Direito e Jornalismo, já passou por veículos como Jovem Pan, Jornal da Tarde, revista Visão, Folha de S.Paulo, rádios Capital, Excelsior (futura CBN), Eldorado, Bandeirantes e TV Democracia, além da Radio France Internationale

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"A invasão russa da Ucrânia é um crime de guerra maior, ao mesmo título que a invasão americana do Iraque". Noam Chomsky

"Não há nenhuma justificativa, nenhuma circunstância atenuante", diz Chomsky, em fala destacada pelas Judias e Judeus Sionistas de Esquerda

REUTERS/Serhii Nuzhnenko (Foto: REUTERS/Serhii Nuzhnenko)

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Por Mauro Nadvorny, Tânia Bilbich, Milton Blay, Pietro Nardella, Nelson Nisenbaum, Jean Goldenbaum e Michel Gherman, do grupo Judias e Judeus Sionistas de Esquerda

Alguns comentaristas de "esquerda", que se outorgam o pomposo título de analistas internacionais, têm a ousadia de se lançar em explicações e apreciações sobre a guerra na Ucrânia, afirmando peremptoriamente que a responsabilidade é toda do ocidente, ou seja, dos Estados Unidos, da Europa e da Otan. O avanço do imperialismo americano e de seus asseclas europeus teriam obrigado, sim, obrigado Vladimir Putin a agir militarmente e invadir o país vizinho. O argumento é de que o autocrata russo não tinha outra saída. Como se Moscou não tivesse nenhuma responsabilidade na guerra.

Contudo outros analistas internacionais conhecidos e reconhecidos, como o filósofo esloveno Slavoj Zizek, comunista, não fazem exatamente a mesma leitura. Reconhecem, como nós, Judias e Judeus Sionistas de Esquerda, que a Aliança Atlântica estava lentamente  "cercando" a Rússia e ignorando os justos receios do maior país do mundo, potência da Guerra Fria, atacado pelo ocidente no século passado. 

Isso é verdade, mas como argumenta Zizek, dizer que a culpa do que acontece hoje é exclusiva do imperialismo americano "equivale a justificar Hitler culpando o injusto Tratado de Versalhes ». 

Pior, prossegue o filósofo marxista, desta maneira alguns que se dizem esquerdistas admitem que as grandes potências têm direito a esferas de influência, às quais todas as outras se devem submeter em prol da estabilidade global. «  A suposição de Putin de que as relações internacionais são uma disputa de grandes potências reflete-se na sua repetida afirmação de que não tinha escolha a não ser intervir militarmente na Ucrânia ».

Cabe aqui a nossa indignação, expressa no texto  "Às favas os ideais" publicado dia 26 de março de 2022, na página de Mauro Nadvorny do Brasil 247. "Não há como ser de esquerda e desconhecer o princípio da Autodeterminação dos Povos ».

Em um artigo publicado no Le Monde em 2014, no momento da crise ucraniana sobre a anexação das províncias russófonas da Crimeia, o sociólogo de esquerda Edgar Morin advertia: - Atenção, é um foco de infecção que pode ter consequências desastrosas. E durante anos, fechamos os olhos para esta infecção. 

«  Havia uma guerra permanente na Ucrânia, mas no fundo o verdadeiro problema era o destino do país, que se por um lado queria se tornar democrático e integrar a União Europeia,  de outro é uma presa entre duas superpotências: a Rússia putinista, que aspira construir a Novorossiya, a Grande Rússia, e os Estados Unidos, que sonham em integrá-la ao ocidente. 

É justo apoiar a resistência ucraniana, mas ao mesmo tempo não podemos entrar no conflito, sob pena de um « tsunami mundial » como disse o ex-chanceler francês Dominique de Villepin. 

Para mim, os ucranianos que lutam são verdadeiros resistentes que combatem numa guerra patriótica. » 

Ao contrário do que afirma Morin, os generais russos seguem dizendo que os principais objetivos da tal "operação especial » seriam obter a neutralidade da Ucrânia, através da desmilitarização do país, e a desnazificação. Embora já tenhamos provado por A mais B que o argumento da desnazificação é falacioso, pois a Ucrânia não é um imenso batalhão Azov, que a Rússia de Putin também tem os seus neonazistas como o batalhão Sparta, que luta no Donbass, que Putin é de extrema-direita, muito, muito próximo das lideranças do nazifascismo mundial, ainda há quem prefira criar narrativas fantasiosas. Então, vamos uma vez mais tentar voltar à realidade na companhia de Zizek: «  O problema é mesmo o fascismo ucraniano? A pergunta é mais bem dirigida à Rússia de Putin. A estrela-guia intelectual de Putin é Ivan Ilyin, cujas obras voltaram a ser impressas e entregues a apparatchiks estatais e recrutas militares. Após ser expulso da União Soviética no início da década de 1920, Ilyin defendeu uma versão russa do fascismo: o Estado como uma comunidade orgânica liderada por um monarca paterno, na qual a liberdade é saber o seu lugar. O propósito de votar em Ilyin (e em Putin) é expressar apoio coletivo ao líder, não legitimá-lo ou escolhê-lo. » 

Aleksandr Dugin, filósofo da corte de Putin, segue de perto os passos de Ilyin, acrescentando um adorno pós-moderno de relativismo historicista:

«  Toda a assim chamada verdade é uma questão de crença. Assim, acreditamos no que fazemos, acreditamos no que dizemos. E essa é a única maneira de definir a verdade. Portanto, temos a nossa verdade russa especial que é preciso aceitar. Se os Estados Unidos não querem iniciar uma guerra, deve-se reconhecer que [os] Estados Unidos não são mais um mestre único. E [com] a situação na Síria e na Ucrânia, a Rússia diz: - Não, vocês já não são quem manda.   

Essa é a questão de quem governa o mundo. Só a guerra pode realmente decidir."

Com relação à afirmação infame de Dugin, pergunta-se: - O povo da Síria e da Ucrânia? Eles também podem escolher a sua verdade ou são apenas um campo de batalha para pretensos governantes mundiais?

Ao que poderíamos acrescentar: E os povos do Iraque e do Kosovo não têm o direito de escolher?

Passemos a outro ícone da esquerda, o linguista Noam Chonsky. Ao analisar a guerra, na mídia californiana Truthout, ele denuncia a intervenção militar pelo regime nacionalista russo, saúda a resistência ucraniana e o pacifismo dos cidadãos russos detidos, refere-se às ambições atlantistas na região e examina as possibilidades de saída diplomática da crise, que considera tragicamente reduzidas.

« O mais importante » , escreve o pensador anarquista, «  é que a invasão russa da Ucrânia é um crime de guerra maior, ao mesmo título que a invasão americana do Iraque e a invasão da Polônia por Hitler e Stalin em setembro de 1939. É sempre judicioso procurar explicações, mas não há nenhuma justificativa, nenhuma circunstância atenuante. »  

Voltemos à Zizek: «  A ideia de que cada "modo de vida" tem a sua própria verdade é o que torna Putin querido por populistas de direita como o ex-presidente dos Estados Unidos Donald Trump, que elogiou a invasão da Ucrânia pela Rússia como um ato de "gênio". E o sentimento é mútuo: quando Putin fala sobre "desnazificação" na Ucrânia, devemos ter em mente o seu apoio à Frente Nacional de Marine le Pen na França, à Liga de Matteo Salvini na Itália, ao Chega em Portugal e a outros movimentos neofascistas reais.

A "verdade russa" é apenas um mito conveniente para justificar a visão imperial de Putin, e a melhor maneira de a Europa a combater é construir pontes para países em desenvolvimento e emergentes, muitos dos quais têm uma longa lista de queixas justificadas contra a colonização e exploração ocidentais. Não basta "defender a Europa". A verdadeira tarefa é persuadir outros países de que o Ocidente lhes pode oferecer escolhas melhores do que a Rússia ou a China. » 

Zizek, Morin e Chomsky são três dos maiores pensadores de esquerda da atualidade; estamos com eles.

* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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