A máscara rasgada
O agora apenas advogado Sérgio Moro, desmascarado, devia enfiar a cara num buraco e esconder-se para a eternidade
Desde a queda de Dilma Rousseff o nível da política brasileira vem baixando de padrão assustadoramente. Se não houver uma reviravolta em 2022, seguiremos ladeira abaixo sem perspectiva de nos reerguer. O Presidente Jair Bolsonaro, em tal panorama, possui em seu favor a coragem de não mentir. Desde o início de sua trajetória, com as teses mais estapafúrdias, ele as apresentou como se estivesse acima do bem e do mal, escancarando quase ao cinismo a má qualidade das suas ideias. Nem todo mundo segue o seu modelo. Na atual corrida eleitoral, atrás de uma “terceira via” setores do quadro partidário e seus adeptos se esforçam para valorizar um nome com o qual acham ter condições de enfrentar o favorito nas pesquisas, o ex-Presidente Lula. Este se apresenta com moral e currículo. Saiu incólume das acusações forjadas contra o seu passado e oferece a seu favor os antecedentes de um ótimo governo, com números expressivos nos mais diversos setores.
Não seria improvável improvisar uma terceira via, nem Bolsonaro, nem Lula. No entanto, o que dá a impressão de se consolidar aos poucos traz contra a sua possibilidade as atuações de um juiz parcial e manipulador, desmoralizado depois de perder em instâncias superiores cada uma de suas decisões. O tempo lhe rasgou a máscara. Sobre a toga, já nem se fala, uma vez que a deixou mofando tão logo assumiu o cargo de Ministro da Justiça do governo empossado, função na qual, aliás, não se saiu com o brilho de uma boa performance. Ninguém duvida, a esta altura, que Sérgio Moro, como o Deltan Dallagnol das apresentações em power point à conclusão final das duras sentenças proferidas, tinham fortes e disfarçadas ambições políticas. Os papéis (ou as máscaras) caíram. Um na corrida para a presidência da República e o segundo aparentemente atrás de um mandato de deputado federal. No filme de Hitchcock, Cortina rasgada, de 1966, no auge da Guerra Fria, contava-se a história de um físico norte-americano em visita à Leipzig, na Alemanha Oriental. Tudo girava em torno da disputa de segredos envolvendo destruição e hegemonias. E o titulo fazia referência à “cortina de ferro”, como os americanos gostavam de designar o bloco comunista. Aqui, a máscara, em plena epidemia da Covid-19, dizia respeito a sistemas de proteção contra o contágio. Em Sérgio Moro, enquanto juiz em Curitiba, protegido pela austeridade das funções que exercia, a cara dura em favor do bom comportamento contra a corrupção, valeu-se dos mais diversos artifícios mais tarde contestados pelo Supremo Tribunal Federal. Tratava-se de clara fragilidade das argumentações e parti pris contra os réus, em esforços para conduzi-los à cadeia e removê-los da cena política. Graças a isso, Lula ficou impedido de concorrer ao pleito de 2018, no qual surgia como favorito. Deu no que deu. Na primeira oportunidade, com uma aura de honestidade e correção, o antigo juiz alçou-se à pasta de Ministro da Justiça de Bolsonaro a quem ajudara nas eleições, riscando do mapa o seu principal adversário.
Impossível imaginar maior desfaçatez no quadro das ambições pessoais. Uma vez denunciada aos olhos da população, o agora apenas advogado Sérgio Moro, desmascarado, devia enfiar a cara num buraco e esconder-se para a eternidade. Mas estamos no Brasil, um país de padrões morais ainda em busca de afirmação, no qual gritantes aventuras parecem permitidas. Nem primeira, nem segunda, nem terceira via, deviam ser permitidas a um indivíduo com o seu currículo. Mesmo assim, aí está: sem máscara e com a maior cara de pau. Se o povo for bobo, a estratégia dará certo. No entanto, nós nos deixamos enganar uma vez; a segunda já é difícil; a terceira, promete se mostrar impossível.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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