A Revolução dos Cravos e a "semente em algum canto do jardim"
"O legado de 25 de abril de 1974 serve como salvaguarda contra aventuras antidemocráticas", diz Bepe Damasco
Não consigo pensar no dia 25 de abril de 1974 e nos episódios da Revolução dos Cravos sem lembrar que "certamente esqueceram uma semente em algum canto do jardim", conforme o genial Chico Buarque de Holanda.
Chico reclamava que a festa fora murchada pelo avanço pós-revolução das forças conservadoras, mas fazia questão de ressaltar a existência da semente. E, 50 anos depois, vemos que a semente deu muitos frutos.
Quando os soldados portugueses, há meio século, decidiram aceitar os cravos vermelhos ofertados pela população e colocá-los em seus fuzis, talvez, no calor da refrega, não tivessem a dimensão da beleza revolucionária e histórica desse gesto.
Do momento em que as Forças Armadas de Portugal se negaram a reprimir o povo e aderiram à revolução que pôs fim a 41 anos de opressão do regime de Antônio Oliveira Salazar, restituindo a liberdade e a democracia, até hoje salta aos olhos os avanços sociais, econômicos e políticos do país, verificados em meio século, algo que seria impossível almejar sob uma ditadura.
Com alternância de poder entre esquerda, direita e centro nos últimos 50 anos, mas com uma sociedade fortemente influenciada pelo valores das forças progressistas, Portugal deixou de ser um país com altos índices de pobreza e uma economia basicamente agrícola, para se tornar um país emergente na Europa.
Depois de entrar na Comunidade Econômica Europeia e aderir ao euro, o país, embora conviva ainda com problemas sociais e vulnerabilidades econômicas, conseguiu melhorar de forma significativa o padrão de vida dos mais de 10 milhões de portugueses.
Se é verdade que Portugal não conseguiu passar imune à praga que assola o mundo, que é o avanço da extrema direita e a ameaça que isso representa para a democracia, também cabe destacar que uma providencial articulação entre os partidos com compromissos democráticos levou recentemente o Chega, versão partidária lusa da extrema direita, ao isolamento, em que pese tenha registrado grande crescimento em eleição recente.
É que o legado de 25 de abril de 1974 serve como salvaguarda contra aventuras antidemocráticas.
Que a semente no canto do jardim cantada pelo Chico sirva de inspiração para os lutadores e lutadoras de todos os países que sonham com um mundo de justiça, fraternidade, liberdade, paz e igualdade.
Viva a Revolução dos Cravos!
Viva o povo português!
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.




