A teologia da libertação não morreu
Wojtyla temia as CEBs nas Américas, pois via essas comunidades como os “sovietes” de Lênin
No cochilo da lua em 1978, depois de uma xícara de chá, num cenário incomum e de pijamas, Albino Luciane sorria para a morte, após poucos dias de papa e algumas bênçãos de janela. Foi trocado por um eminente cardeal dos países da Cortina de Ferro, da Polônia. A Casa Branca urgia pela derrubada do sistema socialista no leste europeu! Não somente, mas também para destituir a Igreja Popular nas Américas, as CEBs, cuja Teologia da Libertação e senso comunitário inseria-se na política como dever cristão.
No século IV, as comunidades perseguidas de cristãos enfraqueciam o moral e o domínio de Roma sob suas províncias. Então o imperador Constantino apoiou o Concílio de Nicéia em 325 d.C, o qual proclama o credo da Igreja Una, Santa, Católica e Apostólica, como religião Imperial. Entretanto, essa Igreja Oficial se distancia das comunidades cristãs originárias.
Recentemente falecido aos 96 anos, o padre Gustavo Gutiérrez Merino pôde fazer teologia a partir da realidade das CEBs, comunidades eclesiais de base. A Teologia da Libertação pauta a “opção preferencial pelos pobres”, mas evidencia a originalidade da Igreja e a luta por justiça. Para os teólogos libertários, as CEBs são a fonte geradora da juventude cristã, de sua renovação espiritual. Segundo Dom Lorscheider, papável que recebeu votos de Albino Luciane: “A CEB no Brasil é Igreja — um novo modo de ser Igreja”.
João Paulo II agia em nome de uma Igreja de sua cabeça, a da Polônia, onde ser católico significava a coragem destemida contra o sistema soviético. Wojtyla temia as CEBs nas Américas, pois via essas comunidades como os “sovietes” de Lênin. Esse papa desencadeou uma limpeza doutrinária, de fechamento e de regressão pastoral aos bispos chamados progressistas, dividiu dioceses e impôs modos de disciplina, inclusive uma padronização das vestes cotidianas do clero e ordens de retorno à sacristia e conventos.
Em 1980, o arcebispo Romero de El Salvador foi alvejado e caiu sobre o altar no qual celebrava. Na véspera de sua morte, fizera um pronunciamento duro aos soldados, a de que não cumprissem ordens de atirar contra o próprio povo. A perseguição nas Américas são evidentes em todos os jornais dos anos oitenta do século passado, mas Romero tivera de entrar na fila de confissão para apresentar o problema ao papa, pois não obtinha audiência com sua santidade. Mesmo assim, foi recebido nos cascos, com ironias de que os padres, freiras e catequistas mortos fossem mesmo terroristas.
No Brasil, documentos e publicações da Igreja dão notícia de que as CEBs estão ativas nacionalmente e as pastorais cumprindo suas missões, na fé de um Jesus que se consubstancia na partilha comunitária e na construção de um reino sem tirano, na fraternidade universal. Então, se diz, a Teologia da Libertação não morreu.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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