A tirania de Eduardo Paes a serviço do partido dos grandes
O prefeito do Rio tem criado um caos na cidade, com diversas obras que não guardam qualquer relação com os interesses da população
O prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, é notoriamente conhecido pelo destempero. Dotado de um comportamento similar ao de uma criança mimada e "umbigocêntrica" – lançando cinzeiro em assessores, insultando correligionários e envolvendo-se até em briga na rua –, Paes não sabe lidar com o contraditório e os questionamentos às suas decisões.
Com grupos e opiniões divergentes não dialoga, não negocia. Impõe seus pontos de vista à força. Professores entraram em greve? De imediato corta integralmente os salários e depois aplica descontos por meses, como tem feito desde o fim da greve do professorado da rede municipal, em junho deste ano. Garis em greve, em pleno carnaval? Demissões são realizadas, como, ainda hoje, têm denunciado os funcionários da empresa municipal de limpeza urbana, a Comlurb (saiba mais).
Negociar uma pauta de reivindicações, ouvir as queixas e os problemas que os trabalhadores municipais indicam é pedir muito ao prefeito. Paes toma imediatamente essa ordem de atitudes naturais na administração pública como desfeita pessoal. Por isso, o seu negócio é entrar em queda de braço para demonstrar quem manda. Não pode ser contrariado. Aplica punições arbitrárias, ao arrepio da lei, visando acabar com qualquer capacidade crítica.
O leitor, sobretudo de outro estado, pode imaginar que se trata apenas de um comportamento "ríspido", mas restrito aos funcionários públicos e aos correligionários. Portanto, seria apenas um problema de estilo, envolvendo questões administrativas e corporativas, que não interessariam à população carioca, menos ainda a coletividades de outros lugares.
Ao contrário, interessa tanto aos cariocas, quanto aos leitores de outros estados. Integrante do PMDB, contando com o suporte sistemático das Organizações Globo, que só apresentam notícias positivas do seu governo, Paes tem seu nome ventilado para postular voos mais altos na cena política nacional. As Olimpíadas de 2016, a serem realizadas no Rio, consistirão em vitrine das suas pretensões.
Eduardo Paes tem adotado múltiplas medidas que afetam seriamente aos interesses e à qualidade de vida da população carioca. Em nenhum momento consultou a opinião dos "impactados" por suas ações. Dialogar e ouvir não é com o prefeito, também em relação à população.
Tem privilegiado a construção de corredores exclusivos de ônibus articulados (BRT) como solução para o transporte público. A experiência na zona oeste da cidade, com a Transoeste, tem sido amarga. Retirou linhas tradicionais de ônibus e concentrou os usuários no BRT. Sem criar alternativas de transportes realmente de massas, a superlotação é o resultado óbvio e visível.
A demora nos deslocamentos, que consegue ser maior do que antes, além do desconforto, afeta a qualidade de vida das pessoas. São mais horas perdidas no trânsito e na espera pela viagem, com inúmeras baldeações. Menos tempo de lazer, estudo, descanso e convivência familiar. Por outro lado, a "redução da capacidade ociosa dos ônibus", como dizem as empresas, e a diminuição de empregos no setor, ampliam a margem de lucros dos empresários.
Nada disso interessa ao prefeito. Um outro corredor exclusivo do BRT, mais recentemente posto em operação (Transcarioca), ainda não fez os usuários se depararem abertamente com o problema da superlotação, por conta da manutenção das linhas convencionais. Ainda há opção. Por enquanto.
Nesse sentido, cabe indagar: o prefeito conversou com alguém? Deu-se ao trabalho de consultar a população e aos usuários? Bobagem. Paes não dá satisfação pública. Ademais, outra consequência social, que tem chamado a atenção com as obras associadas à criação dos BRTs, é a remoção de casas populares. Somente com a Transcarioca, cerca de 2000 famílias foram desalojadas, de acordo com dados oficiais. Há pouco (04/12), 9 famílias perderam suas casas devido às obras do BRT (saiba mais). Mais outras tantas, pertencentes a tradicionais comunidades pesqueiras, correm o risco de serem removidas, na região de Jacarepaguá, por conta das obras voltadas às Olimpíadas e à especulação imobiliária, como tem questionado o vereador Renato Cinco (PSOL).
O meio ambiente também é submetido à lógica especulativa do lucro e à inexistência de diálogo com a população. Área de proteção ambiental no bairro da Barra da Tijuca foi destinada à construção de um golfe clube para as Olimpíadas. Por isso, nesse final de semana, sob o lema "Golfe não! Reserva sim!", ativistas estiveram em frente à área para protestar.
Por conseguinte, Eduardo Paes tem criado um caos na cidade, com diversas obras que não guardam qualquer relação com os interesses da população. O que tem feito no centro da cidade é um verdadeiro descalabro. Fechou vias importantes, tornando uma via crúcis chegar ao centro e fazer a ligação entre as zonas norte e sul da cidade. Lotar ruas estreitas do século XIX, com ônibus e carros, tem sido a "solução". Evidentemente, um problema que afeta a circulação em toda a cidade.
Notabilizado por declarações bombásticas, mas igualmente infelizes, a última do prefeito foi: "A perimetral era como o Muro de Berlim, que separava a cidade da sua razão de existir que é a Baía de Guanabara" (O Dia, 05/12/2014). A perimetral foi um longo viaduto que passava à margem do centro da cidade e que ligava as zonas norte e sul. Foi demolida sob a alegação de que "enfeava a região portuária". Agora a região está reservada a empreendimentos imobiliários.
Houve alguma consulta à população? A demolição da perimetral suscitou expressiva controvérsia entre os cariocas. Mas o prefeito dignou-se a ouvir as pessoas? Não. "Nada pessoal, são apenas negócios", diria o célebre personagem do cinema, Dom Corleone.
A comparação com o muro de Berlim, parcialmente, foi infeliz. Infeliz devido a inexistência de qualquer relação entre os contextos históricos, as realidades em questão. Mas, digo parcialmente porque, vindo de Eduardo Paes, a comparação não deixa de ser um ato falho. Possui um interessante significado: expressa sua concepção sobre a cidade.
Como sabemos, o muro de Berlim correspondeu a uma divisão territorial, cultural, econômica e política entre blocos de países. Um símbolo da guerra fria. Contudo, no caso de Paes, a demolição da perimetral corresponde não ao fim de um "muro" que dividisse a cidade, como pretende sugerir. Pelo contrário. Invertendo os termos do que disse o prefeito, dá para entender o seu balbucio de analogia histórica. Na verdade, traduz a destruição da mais importante via que ligava as zonas norte e sul.
Limitar os fluxos de circulação entre as duas áreas – a suburbana e a nobre – reflete um velho anseio das forças sociais retrógradas do Rio de Janeiro. Brizola, em seu primeiro governo no estado (1983-1987), gerou uma grande polêmica quando introduziu linhas de ônibus que faziam tal ligação, facilitando o acesso dos moradores da zona norte às praias. Na contramão, um novo muro social na geografia da cidade é o que tem sido criado por Paes. Acabar com a perimetral, sem a criação de opções, é introduzir barreiras à circulação no espaço urbano carioca.
O Rio, marcado por um potencial libertário de interlocução entre as diferenças culturais e sociais, vê-se, cada dia mais, defrontando-se com uma lógica autoritária que inibe a circulação das pessoas na cidade. Uma lógica que cria obstáculos para os fluxos de trocas culturais, simbólicas e o acesso às áreas que praticamente concentram os bens culturais e de entretenimento dos cariocas. A privatização do espaço público e a gentrificação têm sido intensificadas.
Não há qualquer diálogo com a sociedade. O modelo de cidade instaurado é definido com os interlocutores que interessam: os agentes da especulação imobiliária, as empreiteiras, os donos de empresas de ônibus e a Globo, ou seja, o Partido dos Grandes. Mas, quem paga a sofrida fatura é a maioria da população.
A estreita relação da Globo com Paes atinge, inclusive, o sistema educacional, com contratos sem licitação de mais de R$ 100 milhões com a Fundação Roberto Marinho. É o que denunciou recentemente o vereador Leonel Brizola Neto (PDT) ao Ministério Público.
O Partido dos Grandes possui o domínio exclusivo e está desenhando a cidade como bem entende. Tem o seu chefe, a cuja soberba e autoritarismo dá amplo apoio: Eduardo Paes. Como lembrava o velho Maquiavel, onde os grandes mandam, não há liberdade, apenas tirania. Uma tirania que faz a alegria de alguns e tem prejudicado o bem-estar da maioria. Adepto da concepção da "cidade-negócio", da "cidade-espetáculo", ouvir e dialogar com a população são itens desprezados na agenda de Paes.
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