A transição para o capitalismo na Europa
Osvaldo Coggiola tece considerações sobre a revolução comercial e a revolução agrária na gênese do mundo moderno
Por Osvaldo Coggiola
(Publicado no site A Terra é Redonda)
A revolução na esfera da produção que originou o capitalismo (que, como Adam Smith notou, foi antes do mais uma revolução na divisão de trabalho, base, por sua vez, da revolução técnica com a qual foi costumeiramente identificada) foi preparada por uma revolução comercial e uma revolução agrária, que se desenvolveram ao longo dos séculos anteriores à “Revolução Industrial”.
Foi na Europa ocidental, a partir do século XII, que se originou o processo que deu lugar a um sistema social e econômico novo, orientado para a acumulação de riqueza baseado no crescimento permanente da capacidade produtiva como condição de existência e reprodução. A produção capitalista, como foi notado pelos seus primeiros analistas, é uma produção ad infinitum, em que o capitalista recupera o capital investido durante os ciclos de produção obtendo um lucro, não entesourado, mas reinvestido na produção. Antes que esses processos se tornassem dominantes não se poderia falar em capitalismo. Houve elementos específicos da história europeia que favoreceram a emergência do capitalismo primeiramente nesse continente (ou, melhor, subcontinente)? Quais foram eles?
Podemos encontrar um deles na Idade Média, quando o crescimento populacional, a acumulação de capitais nas mãos dos comerciantes e a abertura dos mercados proporcionada pela expansão marítima estimularam o crescimento da produção, exigindo mais mercadorias e preços menores: “Um dos primeiros atos da revolução comercial teve lugar no Mediterrâneo, onde Genova e Pisa tomaram iniciativas agressivas para promover o comércio marítimo na área, implicando também outros atores, como Barcelona, Marselha e Palma de Mallorca.
A participação florentina nesse comércio está documentada pelas comunicações com Messina em 1193 e com Genova em 1213. A primeira motivação foi provavelmente a busca dos grãos nas ilhas do sul da Itália, para sustentar uma população crescente, e também da lã rústica, também nessas ilhas e na África setentrional, para fornecer matéria prima para a incipiente indústria têxtil. Exportavam para esses lugares qualquer artigo que tivesse um mercado, e se lançaram ainda mais na direção do Oriente.
No final do século XIII, com bases sólidas no reino napolitano e estreitos vínculos financeiros com o papado, os florentinos (os Bardi, Peruzzi, Acciaiuoli e outros) estavam presentes em todos os maiores centros comerciais. Desde o início, portanto, a revolução comercial ficou marcada por um desenvolvimento contínuo do tráfico na área ocidental do Mediterrâneo”.[i] Com base nisso, Karl Marx identificou no desenvolvimento econômico das cidades-estado italianas, no fim do século XIII, os elementos iniciais do capitalismo moderno.[ii]
A circulação monetária na Europa começou a se desenvolver nos séculos XII e XIII, quando as cidades e o comércio cresceram: a distinção social, porém, se dava ainda entre “poderosos e fracos”, não entre “ricos e pobres”.[iii] As mudanças econômicas da Baixa Idade Média ensejaram o surgimento de uma classe de comerciantes e artesãos que vivia à margem da unidade feudal, habitando uma região externa, o burgo (do latim burgus, “pequena fortaleza” ou “povoado”; no dialeto latino-germânico, burgs tinha o significado de cidadela fortificada).
Graças à sua atividade, comércio, moeda, busca sistemática do lucro e formas primitivas do salário se desenvolveram; assim, aspectos iniciais do capitalismo mercantil floresceram durante a Baixa Idade Média. A burguesia medieval implantou paulatinamente uma nova configuração na economia, com seu motor dinâmico na busca pelo lucro e a circulação de bens a serem comercializados em diferentes regiões. As feiras urbanas, primeiro sazonais, depois permanentes, aumentaram a circulação das mercadorias. A nova prática comercial determinou uma nova lógica: a “economia” começou a se basear em quantias que determinavam o valor de cada mercadoria, calculando-se a partir dele custos e lucros a serem convertidos em uma determinada quantidade monetária.
Os burgueses ainda compravam dos velhos senhores feudais os direitos para suas atividades; depois passaram a exigi-los: “Durante os séculos XI e XII, centenas de novas cidades, que se organizavam como comunas, alcançaram a proeminência na Itália, na Alemanha e em Flandres. Exigiram autonomia aos antigos senhores feudais e conquistaram-na. A burguesia não apenas criou nova riqueza com o comércio, também subsidiou as invenções de empreendedores engenhosos nos campos da alquimia (antepassada da moderna química), da conversão de energia, dos transportes e da metalurgia.
O uso de ferrou tornou-se comum, mesmo na casa dos pobres. Por todos os lugares construíram-se moinhos de vento e de água, para converter a energia das forças naturais em trabalho útil. Um novo tipo de arreio permitiu pela primeira vez que se utilizassem cavalos para puxar carroças e arados. Na Boêmia, na Suécia e na Cornualha, novas técnicas de mineração permitiram que se abrissem poços profundos até depósitos mais ricos de ferro, cobre, estanho e chumbo. A nova classe urbana tornou-se empregadora da mão de obra excedente que a crescente população agrícola produzia, enquanto os agricultores aumentavam a própria eficiência graças a novas invenções. Como resultado, os trabalhadores agrícolas viram os rendimentos crescerem, à medida que nova riqueza era criada nas cidades”.[iv]
Novas relações sociais penetravam todas as áreas da atividade econômica. Para proteger seus interesses, os comerciantes organizavam-se em associações, as guildas. Os artesãos urbanos, por sua vez, se organizavam em corporações, que os defendiam da concorrência e fiscalizavam a qualidade e o preço dos produtos. Nas cidades maiores, com indústria de seda ou lã, os mestres contratavam diaristas que recebiam pagamento por jornada de trabalho; esses jornaleiros foram os antecessores longínquos dos modernos operários assalariados. Para eles, a luta pela vida se confundia com a luta pelo tempo: “Para o trabalhador medieval, o relógio da torre distinguia de modo neto seu tempo do tempo do patrão”.[v]
A moderna burguesia capitalista, no entanto, não foi o produto do desenvolvimento linear da classe burguesa comercial surgida no Medievo. Ao contrário, o início da era capitalista, como veremos, coincidiu com o declínio das “cidades soberanas” da Idade Média, as comunas, declínio que precedeu o surgimento dos Estados modernos: “O capitalismo moderno tirou seu ímpeto inicial da indústria têxtil inglesa e não descende diretamente dos principais centros medievais. Suas bases foram lançadas na indústria rural doméstica que fugira dos centros urbanos tradicionais… As restrições impostas pelas guildas foram razões para a mudança do centro de gravidade da cidade para o campo”.[vi] O centro da dinâmica econômica deslocou-se inicialmente do feudo agrário para a cidade, para daí voltar ao campo, e só depois deslocar-se novamente para a cidade.
A partir do século XII, as cidades italianas quebraram o monopólio marítimo dos árabes no Mediterrâneo. O renascimento do comércio internacional afetou as relações econômicas do continente europeu, provocando o declínio do feudalismo e a tendência para a organização da economia em unidades amplas baseadas na economia monetária e mercantil. Uma série de violentos processos foram precipitando a formação de uma nova economia e uma nova sociedade: “Do século VII ao XI, o Ocidente se esvaziara de metais preciosos, mas o ouro e a prata retornaram com as Cruzadas. Os meios monetários cresceram, a moeda de ouro recomeçou sua circulação. São Luís a oficializou na França; o ducado de Veneza e o florim de Florença, moedas de ouro, jogavam um papel só comparável na história antiga ao dracma em Atenas”.[vii]
Nessa fase de transição para uma economia monetária dominada pela cidade, “o abastecimento do mercado urbano dependia menos do comércio do que dessa união íntima devida ao poder territorial que conservavam os senhores estabelecidos na cidade e às bases rurais da sociedade burguesa, situada entre a aglomeração urbana e as aldeias próximas. Porém, todos [os produtos] que os negociantes exportavam a longa distância, não procediam das terras dos habitantes da cidade, nem daquelas dos senhores cujas fortunas administravam. Deviam comprá-los aos produtores camponeses. Cresceu regularmente o volume dos negócios, ao mesmo tempo em que os homens da cidade se especializaram cada vez mais em suas funções específicas e se afastavam aos poucos da terra; observa-se também que se infiltravam cada vez mais profundamente no meio rural o instrumento monetário e o hábito de comerciar”.[viii]
As novas configurações nas relações campo/cidade não consistiam num retorno à “urbanidade perdida” dos tempos helenos e romanos, como pensaram alguns de seus contemporâneos (daí o termo “Renascimento”): “A história antiga e clássica é a história das cidades, porém cidades baseadas na propriedade da terra e na agricultura; a história asiática é uma espécie de unidade indiferenciada de cidade e campo (a grande cidade propriamente dita deve ser considerada como um acampamento dos príncipes superposto à verdadeira estrutura econômica); a Idade Média (período germânico) começa com o campo como cenário da história, cujo ulterior desenvolvimento ocorre através da oposição entre cidade e campo; a história moderna consiste na urbanização do campo e não, como entre os antigos, na ruralização da cidade”.[ix] O novo, porém, ainda era pensado com as categorias do passado.
As cidades passaram a ser divididas em paróquias, com um aparelho administrativo mais complexo do que a simples obediência a um capo ou ao bispo local; devido aos numerosos homônimos generalizou-se o uso de sobrenomes patronímicos (originados em ofícios ou ocupações, ou em locais de nascimento). Desse modo, as cidades-fortaleza medievais se transformaram paulatinamente em cidades-estados: “Com o crescimento das cidades, os impostos recaíram sobre outras formas de propriedade, dando assim a outras classes, além dos barões [nobreza] um interesse direto nos assuntos de Estado”.[x]
Seria melhor dizer “nos assuntos públicos”; o agrupamento dos cidadãos prefigurava o nascimento de um Estado “aberto”, oriundo dos setores sociais ainda alijados do poder político, que começavam a possuir poder econômico e social: “As cidades adquiriram poder e autonomia política como agregados formados e mantidos continuamente em ação pela fusão voluntária de vontades – e conjugação de recursos – de iguais igualmente desprovidos de poder”.[xi]
No século XIII, o renascimento/desenvolvimento do comércio de longa distância (implicando em contratos e regulações alfandegárias, com adequação das práticas do direito comercial e participação de advogados contratados pelos grupos comerciantes) alimentou também o renascimento das cidades e de sua independência administrativa: “A grande conquista da burguesia nesse período consistiu em arrancar dos senhores, em centenas de localidades separadas, o reconhecimento de um estatuto independente da hierarquia feudal. O movimento urbano iniciou-se nas camadas mais baixas da sociedade e muitos de seus membros eram servos da gleba. Exigiam uma única concessão do senhor: uma carta de autonomia, redigida de acordo com a lei local, reconhecendo que existia o status de bourgeois, de bürgher, ou burguês, e estabelecendo que esse status implicava direitos e deveres. A vida interna das cidades era regulada por colegiados de cidadãos, de acordo com cartas de autonomia redigidas por juristas a serviço do grupo burguês”.[xii]
O “movimento das cidades”, baseado em seu crescimento, mudança funcional, e na emergência social de seus habitantes mais aquinhoados e poderosos, começou a ganhar consciência de seu caráter diferenciado e oposto à ordem social existente: “Um elemento voltado a impedir a retomada imperial foi representado pelas Comunas, nascidas entre os séculos XI e XII, através das quais os representantes de muitas cidades estabeleceram um ‘pacto jurado’, constituindo um organismo apto ao exercício de funções políticas e administrativas, à organização do exército, à administração da justiça, à imposição de contribuições e taxas, à emissão de moeda e manutenção de estradas e canais e à indicação de feiras e mercados. As administrações comunais floresceram prevalentemente na Itália central e setentrional, na França, em Flandres, na Alemanha”:[xiii] as Comunas tiveram um crescente desenvolvimento econômico e social e, também, político (sobretudo na Itália) capaz de tirar súditos (e, portanto, recursos) ao imperador, aos reis e grandes senhores, e aos poderes eclesiásticos.
As novas cidades se inseriam em economias em que a produção mercantil começava a ganhar espaço, sustentada majoritariamente, porém, ainda sobre relações de produção servis ou corporativas. Ainda assim, a partir do século XII fizeram sua entrada em cena elementos econômicos e sociais que propiciariam a dissolução do feudalismo: “Os comerciantes, que eram inicialmente amiúde de origem estrangeira, começaram a provir de camadas camponesas assim como da nobreza.
Os filhos mais jovens dos nobres, sobretudo se tivessem trabalhado como ‘ajudantes comerciais’ dos grandes senhores, começaram a se dedicar a atividades comerciais por conta própria. Os mercadores surgiam também dos ambientes artesanais; o desenvolvimento do mercado, e sua extensão para além dos limites das cidades, fez nascer do setor artesanal comerciantes e açambarcadores. Os comerciantes proviam dos mais diversos estratos sociais, altos e baixos, fato que os punha fora da hierarquia feudal”. O desenvolvimento do comércio exigia a ampliação do mercado, não só em extensão, mas também em profundidade: “Os comerciantes acumulavam riquezas explorando todos os setores produtores. Compravam pelo preço mais conveniente e vendiam o mais caro que podiam. A diferença da primeira Idade Média, não só negociavam mercadorias de luxo, mas também artigos de primeira necessidade, destinados ao consumo de massa”.[xiv]
O renascimento urbano e comercial fez surgir assim uma nova classe, a burguesia, que buscava realizar seu lucro através de atividades exclusivamente comerciais. Seu desenvolvimento no interior da economia feudal foi impondo mudanças que foram o alicerce de sua futura dominação política: “O burguês sentia a necessidade de assegurar sua defesa sem recorrer à tradicional proteção do senhor. O comércio não se desenvolve sem segurança. Um dos primeiros direitos que os burgueses reclamaram foi o de construir muralhas e fortificações.
Todas as cidades ostentam nas suas armas uma coroa de muralhas, símbolo da paz urbana, garantida por uma verdadeira coligação de seus habitantes; a sua aliança, como a do senhor com seus vassalos, firma-se no juramento que implica a obrigação de se defenderem mutuamente recorrendo às armas se for o caso. Os comerciantes tinham também necessidade, para decidir seus litígios, de tribunais mais expeditos e mais integrados na vida dos negócios do que os tribunais eclesiásticos e as justiças feudais. Foi dessas diferentes aspirações que surgiu o movimento comunal”.[xv] Nesse processo, foi deitando raízes a noção de cidadania (ou seja, direitos da cidade e direitos dos membros da cidade) que seria a base jurídica das constituições das futuras nações modernas.
Para que o novo modo de produção vingasse, foi também necessário que houvesse uma transformação no caráter autossuficiente das propriedades feudais na Europa ocidental: as terras começaram a ser arrendadas e a mão de obra começou a ser remunerada com um salário. O dinheiro começou a circular e penetrar todas as relações econômicas: o homem medieval, antes disso, mal conhecia seu significado. Numa sociedade dominada pelo cristianismo, a Igreja se aggiornou doutrinando a atitude que um cristão deveria ter perante o dinheiro, tendo em vista as várias passagens bíblicas que o condenavam.
O processo foi acelerado pela crise do século XIV, que pôs em tensão o sistema feudal, obrigando às sociedades europeias a novos esforços de sobrevivência. Nessa crise, diversos processos deterioraram o crescimento e prosperidade que a Europa havia experimentado desde o começo da Baixa Idade Média. O colapso demográfico, a instabilidade política e as revoltas religiosas provocaram alterações profundas em todas as áreas. Não havia novas terras a serem ocupadas, fazendo com que a produção não crescesse; no sistema feudal maior produção significava anexar novas terras.
Com a produção estagnada e uma população maior, a fome se espalhou pela Europa. A destruição das florestas e do meio ambiente causou sérias mudanças climáticas, incluídas severas chuvas. A Europa devastada pela fome ficou mais vulnerável a doenças como a Peste Negra, a pandemia mais devastadora registada na história humana, tendo resultado na morte de entre 75 e 200 milhões de pessoas em toda a Eurásia, atingindo seu pico na Europa entre os anos de 1347 e 1351. Para agravar a situação existiam constantes guerras, com destaque para a “Guerra dos Cem Anos”.[xvi] Tudo isso causou uma grande queda demográfica. Como havia menos pessoas para trabalhar, os nobres impuseram uma maior carga de trabalho sobre os camponeses, o que gerou crescentes revoltas populares, por exemplo na França em 1381.
A difícil superação dessa crise abriu o caminho para a vitória do capital, em todas as esferas da vida social. Nos dois séculos seguintes à “grande crise”, uma série de transformações econômicas e políticas fez com que, na Inglaterra por exemplo, nos campos de atividade que adquiririam importância no capitalismo industrial – trabalhos em metal e tecelagem – já houvesse incentivos financeiros para a racionalização da produção e a eliminação de controles corporativos. Os pastos para as ovelhas substituíram as terras das lavouras, buscando fornecer insumos para a produção destinada ao comércio.
Além disso, a servidão tinha se alterado profundamente. Na Inglaterra, os camponeses haviam se tornado relativamente livres, trabalhando numa pequena faixa de terra, além de ter seu tradicional acesso às terras comunais, usadas indiscriminadamente por qualquer membro da comunidade desde tempos ancestrais. Algumas leis tentaram garantir aos camponeses um pedaço de terra junto à sua cabana, mas o interesse econômico prevalecente coibia a manutenção de uma classe social de camponeses autônomos. O processo, violento, de sua expropriação, constitui a pré-história da sociedade burguesa. Era preciso transformar os camponeses em produtores e consumidores da indústria que surgia nas cidades.
Uma nova ordem urbana foi sua consequência. Nas cidades renovadas, crescentes e estendidas, firmou-se a tradição de que os servos que conseguissem escapar ao feudo senhorial adquiririam sua liberdade se conseguissem sobreviver, sem serem apanhados e devolvidos ao senhor, durante um ano e um dia. Ao mesmo tempo, uma série de fatores (paz relativa, clima adequado) favoreceram o aumento da população. Na Itália, no Norte da Europa, muitos filhos de servos fugiram para as comunas urbanas (“o ar da cidade é livre”, dizia-se). Os mercadores citadinos costumavam empregá-los e protegê-los durante seu período de insegurança devida à fuga.
Foi esse talvez o período mais “combativo” da futura classe dominante, pois se ela surgiu apontando desde o início para sua dominação econômica, a hegemonia político-social da burguesia (entendida como capacidade de reunir, para lutar, um grande número de pessoas, suscitando sua adesão a uma grande empresa) era e continuou sendo muito baixa, à diferença da capacidade aglutinadora de guerreiros e sacerdotes, motivo pelo qual a nova classe tendia a agir politicamente através de agentes externos,[xvii] líderes político/militares ou religiosos. Os jovens “livres” das cidades, do seu lado, passavam a trabalhar em troca de um salário (monetário, pois os mercadores não conseguiam pagá-los de outro modo) e costumavam passar de um emprego para outro: eles inauguravam, simultaneamente, o moderno trabalho assalariado e a rotatividade trabalhista, duas características centrais do capitalismo industrial. Esse processo se acelerou com a abundância de servos libertos depois da população europeia ter sido dizimada pela Peste Negra.
O renascimento comercial dinamizou simultaneamente a economia monetária, a economia urbana e o sistema financeiro. Até o século XIII predominara na Europa a cunhagem de prata, dentro do sistema monetário criado por Carlo Magno. Somente com o crescimento das atividades comerciais se voltou aos poucos à cunhagem de ouro, com a introdução do florim florentino e do ducado veneziano, que no final do século XIV dominavam as transações comerciais em todo o continente europeu. Paralelamente à moeda, evoluíram as instituições de crédito, que na economia feudal haviam praticamente desaparecido, combatidas pela Igreja.
As letras de crédito haviam surgido no século X, alcançando grande uso na Itália dois séculos depois. A participação acionária, na forma de sociedades comanditas, era a forma usada pelos nobres para se associarem às empresas comerciais, como meio de adiantar dinheiro aos comerciantes. A partir do século XII surgiram também os primeiros banqueiros, substituindo os cambistas como fonte de crédito. Em vez de se limitarem a emprestar dinheiro, os banqueiros italianos passaram a aceitar depósitos, descontar títulos e manter correspondentes em outras praças.
“Até o século XV, esses empreendimentos foram principalmente familiares, ainda que existissem já sociedades para administração de fundos de terceiros. Somente com a evolução da contabilidade, com a introdução do método das partidas dobradas, em meados do século XIV, se tornou possível o surgimento de verdadeiras empresas. A primeira empresa bancária foi a Casa de San Giorgio, fundada em Gênova em 1407… A acumulação de dinheiro nas mãos de famílias de comerciantes e banqueiros ricos as levou a investir em terras. A negociabilidade da terra era um profundo golpe na estrutura feudal, em que a terra não era uma propriedade negociável, mas a base da estrutura do poder – ela não pertencia ao senhor, ambos se pertenciam mutuamente”.[xviii] A monetarização crescente das obrigações feudais, e o surgimento de uma crescente produção artesanal para o mercado, dinamizaram consideravelmente a economia urbana. As funções da cidade se desenvolveram em decorrência da circulação de mercadorias entre grandes mercados urbanos. Começava, na Europa, a era das cidades.
Com o crescimento da produtividade do trabalho, mudavam também as formas da apropriação do excedente econômico. O declínio do feudalismo, sistema que tendia para a autossuficiência de pequenas unidades econômicas, teve por base geral o fato de que, com o desenvolvimento da divisão social do trabalho e das trocas, os produtos do trabalho tenderam a se transformar em mercadorias. Com a expropriação dos meios de trabalho (terras comunais, instrumentos) das mãos dos produtores, a força de trabalho destes tendeu a se transformar em mercadoria. Já não era mais necessário que a apropriação do trabalho excedente se realizasse através da compulsão direta do trabalhador. Os empreendimentos nascentes exigiam trabalhadores destituídos de meios de trabalho, pessoas “livres” para trabalhar em troca de um salário e para comprar, com dinheiro, as mercadorias produzidas pelas empresas.
Para que essas condições aparecessem, foi preciso, em primeiro lugar, a expropriação dos camponeses, ou seja, a separação entre eles e as terras onde trabalhavam, em parte para si próprios. A forma compulsória de exploração do trabalho foi entrando em crise com o renascimento do comércio, o desenvolvimento das cidades, o aumento das trocas com o Oriente, em especial depois das Cruzadas, e a consequente expansão da economia monetária.
O capital comercial surgiu no interior do feudalismo pela expansão de mercados inicialmente locais. O comércio de longa distância com o Oriente foi uma primeira fase dessa expansão, na qual coube um papel central à Itália, onde as cidades – estado se caracterizaram mais pelo desenvolvimento das suas atividades mercantis do que pela sua indústria. A moderna empresa capitalista deu seus primeiros passos na Itália do século XIV. Em 1494, Luca Pacioli, autor da Summa Matematica, definiu o sistema contábil de dupla entrada (crédito/débito) sobre cuja base se desenvolveu a contabilidade empresarial.
Nesse contexto, surgiram também os banqueiros e cambistas modernos, cujos ganhos estavam relacionados ao dinheiro em circulação. O comércio punha em movimento novas potências da produção, provocando crescimento da produção, das trocas e da concentração populacional nas cidades. O entrelaçamento produtivo dos indivíduos (divisão social do trabalho) tornou-se maior, desaparecendo progressivamente as relações de dependência pessoal, e aparecendo em seu lugar a interdependência recíproca dos produtores, mediada pelo valor de troca dos produtos. As trocas eram crescentemente mediadas pelo dinheiro, que passou a subordinar a produção. Sem ele não se comprava nada e não se vendia nada: “À autonomização do valor de troca no dinheiro, desvinculado dos produtos, corresponde a autonomização do comércio como função desvinculada daqueles que trocam”.[xix]
Potencialmente, o comerciante, aproveitando-se de circunstâncias de mercado, do lucro comercial ou ainda do simples logro, podia apoderar-se, caso fosse bem-sucedido, da produção. O comércio desenvolvido em algumas regiões provocou o acúmulo de capitais nas mãos de grandes comerciantes, que foram aplicando seus lucros nas manufaturas. O capital forjado na circulação de mercadorias apoderou-se aos poucos da esfera produtiva. Nas cidades costeiras italianas e do Norte da Europa, primeiro, em Espanha e Portugal, depois; mais tarde nos Países Baixos e na Inglaterra, houve um grande acúmulo de capitais gerados no comércio. Em primeiro lugar, da comercialização das especiarias provenientes do Oriente (tecidos, pimenta, canela, cravo), depois da produção colonial americana (metais preciosos, madeira, tinta, açúcar, tabaco).
Com o estabelecimento de um fluxo regular de comunicação com a América, os centros do comércio europeu sem deslocaram para a costa atlântica. Surgiram centros para onde afluía a maior parte dos capitais acumulados, e periferias onde esses capitais se valorizavam, sem ainda quebrar as velhas relações econômicas. O comércio interno de Portugal, por exemplo, ainda que fosse um país pioneiro das expedições ultramarinas, era ainda superior ao comércio internacional das especiarias, e era basicamente feito com base em trocas diretas, não através da intervenção do dinheiro. A maior parte dos produtores peninsulares continuou por muito tempo consumindo parte de sua produção ou, no máximo, trocando mercadorias em mercados limitados. O desenvolvimento econômico era desigual, o escasso e desestruturado mercado interno de alguns países foi deixando-os na rabeira da corrida comercial.
O artesanato citadino se desenvolveu no fim da Idade Média com o renascimento comercial e urbano. A atividade produtiva era manual, com o emprego de algumas máquinas simples. O produtor possuía os meios de produção (ferramentas, instalações e matérias-primas) e conhecia todo o processo de fabricação. Dependendo da escala, grupos de artesãos podiam se organizar e dividir as etapas do processo, mas na maioria dos casos, um único artesão cuidava de todo o processo, desde a obtenção da matéria-prima até à comercialização do produto final. Esses trabalhos eram realizados em oficinas nas casas dos próprios artesãos, não havia especialização ou divisão do trabalho.
A produção artesanal estava sob controle das corporações de ofício; o comércio encontrava-se sob controle das guildas, corporações que reuniam pessoas que nas cidades ou vilas trabalhavam no mesmo ramo ou ofício, que limitavam o desenvolvimento da produção e do comércio. Elas possuíam suas próprias leis e regimentos, que todos os seus membros deveriam obedecer. Essas normas definiam a forma como as coisas deveriam ser feitas com preços vantajosos. As mercadorias eram sujeitas a um rigoroso controle de qualidade. As guildas desempenhavam um importante papel na vida política e econômica da maior parte das cidades: com o passar do tempo, surgiram conflitos quanto à sua influência sobre os assuntos públicos, quando impediam os não membros das guildas de exercerem sua atividade, de abrirem um negócio, e quando impossibilitavam a inovação tecnológica.
Esse panorama mudou com o maior desenvolvimento comercial. Graças à “revolução comercial” passou-se gradualmente do artesanato disperso para a produção em oficinas, destas para a as manufaturas e, finalmente, para a produção mecanizada na fábrica. Com a progressiva liberalização da indústria e do comércio ocorreu um enorme progresso tecnológico e um forte aumento da produtividade em um curto espaço de tempo. O mercado comandava ainda o ritmo da produção, ao contrário do que aconteceria depois, nos países industrializados, quando a produção passou a pressionar para a criação de seu próprio mercado. Cada vez mais fortalecida, a nova burguesia passou a investir também no campo, adquirindo grandes propriedades rurais, ao passo que setores da nobreza passavam a investir em atividades comerciais e até industriais.
Desse modo, a fase inicial do novo modo de produção situou-se na segunda metade do século XVI e no começo do século XVII, principalmente na Inglaterra e nos Países Baixos. Estes viraram um carrefour marítimo e comercial: com o saque do porto belga de Anvers pelos espanhóis, Amsterdã se transformou na “loja da Europa”, com a primeiras bolsas de mercadorias e de valores modernas. O capital começou a dominar a produção na forma de uma relação social entre capitalistas e operários assalariados, ou na forma menos desenvolvida da subordinação de artesãos domésticos, que trabalhavam em casa e com máquinas e matérias primas fornecidas pelo capitalista (sistema de encargos, ou putting-out system), que permitiu que o detentor do capital subordinasse formalmente aos seus interesses os produtores independentes, podendo obter ganhos de produtividade por meio da divisão técnica do trabalho, e pela crescente especialização dos produtores.
Paralelamente, a necessidade de se procurar dinheiro para adquirir novos produtos levou à velha nobreza feudal a uma exploração sem precedentes dos campesinos sob sua “proteção”. Quando isso não foi suficiente, passou simplesmente a expropriá-los, para converter-se ela própria em produtora de mercadorias, diretamente ou arrendando os campos para os novos ricos das cidades, os burgueses. Na Inglaterra, a necessidade de produzir lã para exportar para as nascentes e expansivas manufaturas de Flandres implicou a transformação dos territórios feudais em campos de criação de ovelhas, com a expulsão violenta de centenas de milhares de camponeses.
A isso se acrescentou o licenciamento dos exércitos feudais, inúteis depois de terem servido nas Cruzadas e nas guerras europeias. Isso deu lugar a uma enorme massa de desempregados, afugentada e desmantelada pelos novos corpos repressivos das cidades e pelos novos exércitos profissionais dos Estados, cujos soldados foram o primeiro contingente massivo das novas relações de produção, que cresceria com as massas humanas liberadas pelos cercamentos agrários e pela profissionalização dos exércitos.
A decomposição do feudalismo liberou, desse modo, os elementos para o surgimento do capital como relação social dominante. Marx o resumiu de modo contundente: “Os que se emanciparam só se tornaram vendedores de si mesmos depois que lhes roubaram todos os seus meios de produção e os privaram de todas as garantias que as velhas instituições feudais asseguravam à sua existência. A história da expropriação que sofreram foi inscrita a sangue e fogo nos anais da humanidade. Os capitalistas industriais tiveram que tirar o domínio que os mestres das corporações e os próprios senhores tinham dos mananciais das riquezas.
A ascensão do capitalista representa uma vitória contra os mestres e senhores, contra as corporações e os feudos. O homem agora poderia ser livremente explorado. O processo que produziu o assalariado e o capitalista tem suas raízes na sujeição do trabalhador. A expropriação do produtor rural, do camponês, que ficava assim privado de suas terras, constituiu a base de todo o processo. Em finais do século XIV, a servidão tinha desaparecido praticamente da Inglaterra”.[xx]
Preenchida essa condição, ficava aplainado o caminho para as outras. Os camponeses podiam desenvolver, paralelamente às suas atividades artesanais, atividades agrícolas que contribuíam para a redução do custo de reprodução da força de trabalho. O crescimento de um grupo social que dependia inteiramente do seu salário, reduzido e miserável, provocou os primeiros enfrentamentos desse grupo com a burguesia industrial capitalista. A revolta dos explorados pelo novo sistema de produção, que se manifestou desde cedo (em espacial na Itália), não abriu uma perspectiva societal própria, segundo Marx, “não só por causa do estado embrionário do próprio proletariado, como também devido à ausência das condições materiais de sua emancipação, que apenas surgem como produto da época burguesa”.[xxi]
A manufatura – substituta crescente do artesanato –, por sua vez, resultou da ampliação do consumo, que levou o artesão a aumentar a produção, e o comerciante a dedicar-se também à produção industrial. Ela resultou também do aumento do comércio monetário. Com a manufatura houve aumento na produtividade do trabalho, devido à divisão técnica da produção no estabelecimento manufatureiro, onde cada trabalhador realizava uma etapa na confecção de um único produto. A ampliação do mercado consumidor relacionou-se diretamente ao alargamento do comércio, tanto interno como em direção do Oriente ou da América.
Outra característica foi o surgimento da interferência direta do capitalista no processo produtivo, passando a comprar a matéria prima e a determinar o ritmo de produção. O processo que criou o sistema capitalista consistiu no processo que transformou em capital os meios sociais de subsistência e os de produção, e converteu em assalariados os produtores diretos. Isto já acontecia, limitadamente, nas cidades costeiras italianas, em Flandres e na Inglaterra; no século XV, os benefícios do setor capitalista da economia, porém, ainda provinham majoritariamente do comércio e das finanças, não da manufatura ou da indústria.
A gênese do capitalista agrário passou por uma metamorfose que se iniciou no servo capataz e administrador, passando pelo “arrendatário livre” e pelo “meeiro”, até concluir no “arrendatário propriamente dito”, que já tinha capital próprio, contratava trabalhadores assalariados e pagava uma renda, em dinheiro ou em espécie, ao proprietário de terras. A gênese do arrendatário capitalista se desenvolveu na Inglaterra desde seu estágio primitivo no bailif, ainda servo, passando pela sua substituição durante a segunda metade do século XV pelo colono. O colono logo se tornou parceiro, que também desapareceu para dar lugar ao arrendatário, que procurava expandir seu capital empregando trabalhadores assalariados e entregava ao landlord uma parte do produto excedente, em dinheiro ou em produtos, como renda da terra.
O arrendatário capitalista surgiu, desse modo, das fileiras dos servos da Idade Média. Maurice Dobb acentuou esse aspecto, ao afirmar que os embriões do capital estavam na pequena produção mercantil existente ainda no feudalismo de base agrária, na economia de pequenos produtores separados e relativamente autônomos, submetidos por mecanismos extra econômicos (principalmente religiosos e militares) aos senhores feudais. Á medida em que os camponeses conseguiam a emancipação da exploração feudal, através de revoltas camponesas e de condições que lhes favoreciam (como as pestes que tornavam escassa, e por isso mais valorizada, a força de trabalho livre), eles podiam guardar para si parcelas maiores de sua produção, acumular um pequeno excedente, usar seus lucros para melhorar o cultivo e acumular algum capital.[xxii]
Alguns desses camponeses enriqueceram e passaram a usar o trabalho de outros para acumular capital e, progressivamente, a pagar suas obrigações servis aos senhores feudais em dinheiro, na forma de uma renda pelo uso da terra do senhor. Assim se consolidaram os arrendatários capitalistas (que arrendavam as terras da aristocracia rural, e lhes repassavam uma parte de seus lucros na forma de uma renda pelo seu uso) ao mesmo tempo em que a multiplicação de trabalhadores rurais assalariados, que compunham um mercado de força de trabalho e também um mercado consumidor em expansão, acelerando a passagem para uma economia monetária geral.
O século XVI inglês marcou a ascensão do arrendatário capitalista, que enriqueceu com a mesma rapidez com que a população rural empobreceu. A usurpação das pastagens, os contratos de arrendamento de longo prazo, a inflação e depreciação contínua dos metais preciosos (a “revolução dos preços” do século XVI), o rebaixamento dos salários, a elevação contínua dos preços dos produtos agrícolas, e a renda que tinha de se pagar ao landlord, fixada pelo valor monetário antigo, foram os fatores responsáveis pelo surgimento da classe de arrendatários capitalistas, que se fortaleceu pelo aumento da circulação monetária.
A inflação monetária favoreceu as novas relações econômicas e sociais: “No século XVI, o ouro e a prata circulantes na Europa aumentaram em consequência da descoberta na América de minas mais ricas e fáceis de explorar. O valor do ouro e da prata caiu em relação às outras mercadorias. Os operários continuaram recebendo a mesma soma de dinheiro em metálico como pagamento pela sua força de trabalho; o preço de seu trabalho em dinheiro permaneceu estável, mas seu salário caiu, pois em troca do mesmo dinheiro recebiam uma soma menor de mercadorias.
Essa foi uma das circunstâncias que favoreceram o aumento do capital e a ascensão da burguesia no século XVI”.[xxiii] A moeda virou campo de disputa entre os setores econômicos concorrentes. Em 1558, Thomas Gresham, agente financeiro da rainha Elizabeth 1ª, escreveu que o “dinheiro ruim expulsa o bom”, e observou que, se duas moedas tinham valor legal idêntico, mas conteúdo metálico diferente, aquelas com maior densidade de metal nobre seriam entesouradas, o que prejudicaria a circulação comercial.
A nova burguesia comercial e os cambistas e banqueiros foram elementos embrionários do sistema econômico simultaneamente baseado no lucro, no acúmulo de riquezas, no controle dos sistemas de produção e na expansão permanente dos negócios. Paralelamente, violentos conflitos eliminavam os elementos comunitários da vida rural europeia: “A implantação da ‘sociedade do mercado’ surgiu como uma confrontação entre classes, entre aquelas cujos interesses se expressavam na nova economia política do mercado e aquelas que a contestavam, colocando o direito à subsistência acima dos imperativos do lucro”.[xxiv]
A expropriação dos camponeses de seus meios de subsistência promoveu a ruína da indústria doméstica rural, fazendo surgir a indústria e consigo o capitalista industrial. Surgiu um mercado interno originado pela ruína da indústria doméstica, atrelada à produção rural. Desse modo, com o processo de dissociação dos trabalhadores de seus meios de produção, o capitalismo garantiu também a existência da indústria.
A “revolução capitalista”, que obteria sua vitória definitiva com a indústria capitalista urbana, assim, teve sua origem no campo: “Um aumento geral das rendas [monetárias] agrícolas representa uma elevação nas rendas da maioria da população; a mudança tecnológica na agricultura afeta a maioria dos produtores; uma baixa no preço dos produtos agrícolas tende a baixar o custo das matérias primas para os setores fora da agricultura e dos gêneros alimentícios para os assalariados em geral”.[xxv] A “revolução agrícola” acompanhada do crescimento da indústria capitalista trouxe consigo o aumento na exploração do trabalho e a elevação do número de excluídos da propriedade, proporcionando a reserva de mão de obra de que a indústria moderna necessitava para sua existência e expansão.
Dessa maneira, a origem do capitalista industrial não se restringiu somente aos mestres de corporações, artesãos e assalariados que se transformaram em capitalistas através da exploração ampliada do trabalho assalariado: ela abrangeu também o capitalista rural e o comerciante transformado em empresário industrial. O centro de estruturação do polo burguês da nova sociedade em gestação constituiu a gênese do capitalista industrial.
A transformação gradual e progressiva dos mestres, artesãos independentes, antigos servos da gleba, em capitalistas, no entanto, era um método demasiadamente lento para a acumulação de capital. Os métodos usados nessa acumulação originária pularam etapas, impulsionados pelo caráter abrangente do processo econômico. Os comerciantes ingleses investiram capital nas Companhias das Índias Orientais outras semelhantes, impulsionadas e protegidas pelo Estado.
Os primeiros capitalistas ajudaram também a transformar a terra em artigo de comércio: “A violência que se assenhoreia das terras comuns, seguida em regra pela transformação das lavouras em pastagens, começa no fim do século XV e prossegue no século XVI. O progresso do século XVIII consiste em ter tornado lei o veículo do roubo das terras pertencentes ao povo. O roubo assume a forma parlamentar que lhe dão as leis relativas ao cerco das terras comuns, que são decretos de expropriação do povo”. A terra deixava de ser condição natural de produção para se tornar mercadoria.
Na Inglaterra, foi necessário um golpe parlamentar para tornar as terras comuns em propriedades privadas: “O roubo sistemático das terras comuns, aliado ao furto das terras da Coroa, contribuiu para aumentar aqueles grandes arrendamentos, chamados, no século XVIII, de fazendas de capital ou fazendas comerciais”. Os trabalhadores eram expulsos de suas terras e obrigados a procurar empregos nas cidades. Como lembrou Marx: “No século XIX, perdeu-se naturalmente a lembrança da conexão que existia entre agricultura e terra comunal. O último grande processo de expropriação dos camponeses é finalmente a chamada limpeza das propriedades, que consiste em varrer destas os seres humanos. Todos os métodos ingleses culminaram nessa limpeza”.
A terra antes povoada por trabalhadores agora era pasto para ovelhas: “O ser humano vale menos que uma pele de carneiro”, dizia-se à época. A “limpeza das propriedades” se alastrou por toda Europa: “O roubo dos bens da igreja, a alienação fraudulenta dos domínios do Estado, a ladroeira das terras comuns e a transformação da propriedade feudal e do clã em propriedade privada moderna, levada a cabo com terrorismo implacável, figuram entre os métodos idílicos da acumulação primitiva”.[xxvi] Esses métodos incorporaram as terras ao capital e proporcionaram à indústria das cidades a oferta necessária de proletários despossuídos de qualquer propriedade. O processo de formação das classes despossuídas, futuramente proletárias da indústria, foi violento e compulsório, para nada “natural”.
Os homens que foram expulsos das terras com a dissolução das vassalagens feudais não foram absorvidos, na mesma proporção e com a mesma velocidade, pelo trabalho industrial, doméstico ou comercial. Nesse processo e nas lutas entre os artesãos e suas corporações, alguns artesãos se enriqueceram à custa de outros que perdiam seus meios de trabalho. Os que “perdiam” ficavam apenas com sua força de trabalho e viravam proletários, os que ganhavam conseguiam acumular recursos para novos investimentos, podendo também perder seus negócios para outros competidores.
Nesse marco social violento, na Inglaterra do século XVI, a técnica produtiva evoluiu, a produção de lã se expandiu e a nação preparou-se para o processo que, dois séculos mais tarde, culminaria na Revolução Industrial. O comércio internacional induziu a expansão da criação de ovelhas e, com a expropriação das terras, os senhores ampliaram em grande escala sua criação, que só necessitava de poucas pessoas empregadas nas vastas pastagens das grandes propriedades. As lãs eram usadas nas manufaturas, na fabricação de tecidos e de outros produtos têxteis. Com o crescimento do mercado de lã, cresceram também os rebanhos de ovelhas, limitados inicialmente pelas autoridades reais, que determinavam um máximo de duas mil cabeças por criador.
Com a expulsão dos servos-camponeses, estes se dirigiram para as cidades em busca de trabalho: as cidades não tinham como empregar todos os novos desempregados, que foram assim empurrados ao roubo e à mendicância. Foram então promulgadas as leis “dos pobres”, surgidas na Inglaterra no final do século XV e durante o século XVI, e depois nos outros países. Essas leis foram consequência direta das transformações sociais decorrentes da exploração dos recursos naturais do Novo Mundo e da abertura de novos mercados de consumo, que favoreceram a expansão do comércio e da indústria manufatureira.
O florescimento da manufatura flamenga de lã, e a consequente alta dos preços, incentivou a transformação de lavouras em pastagem de ovelhas, criando a necessidade de expulsar de suas terras à maioria dos camponeses. A população rural inglesa, expropriada e expulsa de suas terras, compelida à vagabundagem, foi enquadrada na disciplina exigida pelo novo sistema de trabalho por meio de um terrorismo legalizado que empregava o açoite, o ferro em brasa e a tortura. Muitas áreas agrícolas, antes cultivadas e que garantiam a subsistência de inúmeras famílias de camponeses, foram cercadas e transformadas em pastagens. Sem condições de adaptar-se à rígida disciplina da manufatura ou mesmo à vida urbana, muitos camponeses se transformaram em mendigos; sucederam-se leis e decretos para diminuir essa categoria de habitantes das cidades.
As leis proibiam a existência de desempregados, punindo-os com severas penas. Henrique VIII estabeleceu em lei que “doentes e velhos incapacitados têm direito a uma licença para pedir esmolas, mas vagabundos sadios serão flagelados e encarcerados” (os reincidentes tinham, ademais, metade da orelha decepada). A primeira “lei dos pobres” inglesa, sob o reinado de Elizabeth I, preparou, sob o pretexto de ajuda obrigatória à pobreza, as futuras “casas de trabalho”, workhouses, onde o pobre foi colocado compulsoriamente à disposição do capitalista industrial.
Os mercados se expandiam, nacional e internacionalmente, pressionando um aumento constante e acelerado da produção. A estruturação de um mercado mundial, porém, não sobreveio de modo repentino. Ela representou um salto em relação a processos de “mundialização comercial” precedentes: a expansão das suseranias do Império chinês no Extremo Oriente, a expansão comercial da civilização islâmica na era de seu esplendor, a retomada das rotas comerciais internas e, sobretudo, externas, da Europa cristã a partir do século XII, que levou inúmeros comerciantes (italianos, em especial) a estabelecer conexões comerciais permanentes com os centros de produção de tecidos finos (seda) e especiarias de Oriente.
Ilustrando a abrangência geográfica desse processo, Janet Abu-Lughod postulou a existência, entre 1250 e 1350, de oito circuitos econômicos articulados, nos quais o comércio e a divisão do trabalho configuravam sistemas econômicos desenvolvidos autossuficientes.[xxvii] Desses oito circuitos, seis estavam localizados em áreas dominadas pelo Islã que era, à época, junto com a China imperial, a área econômica mais desenvolvida (Europa estava menos desenvolvida industrial e economicamente, seus contatos comerciais com o restante do mundo não eram contínuos). Com o advento das Cruzadas e da formação dos primeiros Estados europeus, como vimos acima, os árabes foram sendo expulsos de parte dos seus domínios, e iniciou-se a expansão europeia.
Por que os amplos circuitos econômicos não europeus não originaram um mercado mundial? Immanuel Wallerstein negou aos circuitos econômicos árabe-islâmicos dos séculos XIII e XIV o caráter de “economias-mundo”, categoria que, para esse autor, só seria atingida com a destruição desses circuitos pela expansão europeia. Os maiores circuitos econômicos, nesse período, se encontravam na China, até uma estagnação econômica, acompanhada de epidemias de fome recorrentes, serem sucedidas por uma destruição provocada por investidas externas, eventos que foram preparando o terreno para mudanças sociais no Celeste Império. Em contraste com o retrocesso árabe e a estagnação chinesa, a expansão do rádio das atividades europeias estava inscrita em motivos econômicos internos, na lógica que conduziu à paulatina dissolução dos vínculos senhoriais, à ampliação do rádio do comércio e à impulsão da produção mercantil, motivos acompanhados de uma renovação científica, técnica e ideológica.
É nesse contexto que os europeus venceram na “corrida [não declarada] para a América”. A partir de finais do século XV, as viagens interoceânicas europeias se produziram no contexto “da liberdade de ideias sobre o Atlântico que compartilhavam os cartógrafos, os cosmógrafos e os exploradores da cristandade latina durante o século XV. Contra esse pano de fundo, o projeto de Colombo de atravessar o oceano parece inteligível e até previsível. O espaço atlântico exercia uma poderosa atração sobre as imaginações da cristandade latina.
Os cartógrafos semeavam suas representações do oceano com massas de terra especulativas e, a partir de 1424, deixavam espaços vazios a serem preenchidos com novas descobertas. Na medida em que cresceu o interesse por esse espaço, também o fez a consciência da possibilidade de explorá-lo. As primeiras colônias europeias duradouras foram fundadas nas Ilhas Canárias em 1402 e nas Açores em 1439. O ritmo dos esforços se acelerou na segunda metade do século”.[xxviii] E concluíram como bem se sabe.
Com a expansão mundial da “Europa”, a crescente internacionalização da economia tornou-se fato a ser considerado nas políticas dos governos. A diminuição das distâncias fez-se acompanhar da especialização de países e regiões e da reordenação das economias locais, provocada pela abertura de novos mercados, que fizeram com que alguns setores da economia prosperassem e outros desfalecessem. No século XVI foi se verificando o impacto dos descobrimentos ultramarinos americanos e do novo caminho para Oriente na economia europeia.
Nesse quadro de transição, Fritz Rörig chegou a propor a existência de uma “economia medieval de alcance mundial”, incluindo nesse fenômeno as viagens intercontinentais realizadas por comerciantes europeus medievais, a partir do século XIII.[xxix] Para sua expansão externa, Europa aproveitou conhecimentos e rotas marítimas traçadas pelos chineses: o Ocidente europeu pós-medieval criou, com base nessas e outras apropriações, uma nova sociedade, baseada num sistema econômico-social em que as relações mercantis se apossaram da esfera produtiva, como não aconteceu em outras sociedades nas quais o comércio interno e externo chegara a atingir importantes dimensões, assim como o desenvolvimento científico e tecnológico. Em resumo, as raízes do capitalismo tiveram sua origem no renascimento do comércio interno, no auge do comércio internacional e na abertura de linhas de circulação de mercadorias de/para o Oriente e, finalmente, de/para a América.
Como resumiu Earl J. Hamilton: “Embora houvesse outras forças que contribuíram para o nascimento do capitalismo moderno, os fenômenos associados com a descoberta da América e a rota do Cabo foram os principais fatores desse desenvolvimento. As viagens de longo percurso aumentaram o tamanho dos navios e a técnica da navegação. A ampliação do mercado facilitou a divisão do trabalho, e conduziu a melhoras técnicas. A introdução de novas mercadorias agrícolas da América e de novos bens agrícolas e manufaturados, especialmente artigos de luxo orientais, estimulou a atividade industrial para se obter a contrapartida que os pagasse. A emigração às colônias do Novo Mundo e aos estabelecimentos do Leste diminuiu a pressão da população sobre o solo metropolitano e aumentou o excedente, o excesso da produção em relação à subsistência nacional, do qual pôde se obter a poupança. A abertura de mercados longínquos e de fontes de matérias primas foi um fator importante para que o controle da indústria e do comércio fosse transferida dos grêmios para os empresários capitalistas. A velha organização gremial, incapaz de lidar com os novos problemas da compra, produção e venda, começou a se desintegrar e cedeu, finalmente, seu lugar à empresa capitalista, meio mais eficiente de gestão”.[xxx]
As viagens de Cristóvão Colombo e Bartolomeu Dias foram o cume desse processo e, sobretudo, deram início a outro, de alcance mundial. A expedição de Fernando de Magalhães (1480–1521), navegador português a serviço da Espanha, realizou a primeira viagem ao redor do globo terráqueo, iniciada em 1519 e concluída em 1521. O mundo foi se unificando não só pelo estabelecimento de rotas marítimas mundiais, mas também ao compasso da empresa colonizadora, quer esta assumisse a forma do enclave comercial, da feitoria ou da ocupação territorial. Como se sabe, buscando uma rota alternativa para a China, os europeus “descobriram” um novo continente, a América, que conquistaram e colonizaram, inicialmente em função subsidiária de sua busca e penetração do mercado chinês e extremo-oriental. As primeiras cartografias do “novo” continente foram elaboradas para determinar o ponto de passagem mais adequado para o Extremo Oriente.
As viagens intercontinentais configuraram uma unidade com os processos que, na Europa, aceleravam as transformações sociais; aumento demográfico, superação das fomes e pestes do século XIV, retomada das guerras na segunda metade do século XV: “Essa impulsão interna foi finalmente sustentada, a partir do final do século XV, por uma injeção de riqueza externa devida à expansão marítima e colonial. A circunavegação da África, a descoberta da rota das Índias por Vasco da Gama, a da América por Colombo, e a viagem ao redor do mundo de Magalhães, elevaram o nível científico e ampliaram a concepção do mundo na Europa. Ao mesmo tempo, e esse era o verdadeiro objetivo dos ‘descobridores’, o grande comércio de produtos exóticos, de escravos e metais preciosos, tornava a abrir-se, extraordinariamente ampliado. Uma era nova se abria para o capital mercantil, mais fecunda que a das repúblicas mediterrâneas da Idade Média, porque se constituía um mercado mundial, cuja impulsão afetava todo o sistema produtivo europeu, ao mesmo tempo em que grandes Estados (não já simples cidades), ia aproveitá-la para se constituir”.[xxxi]
Assim, a partir de processos internos e externos, a expansão marítima europeia unificou geográfica e economicamente o planeta. Immanuel Wallerstein propôs, como base da origem do “sistema mundial moderno” no século XVI europeu, uma ligeira superioridade de acumulação de capital no Reino Unido e na França, devida a circunstâncias inerentes ao final do feudalismo nesses países, que desencadeou um processo de expansão econômico-militar culminando em um sistema global de trocas que, no século XIX, incorporou quase todos os territórios do planeta.
A afirmação de que se tratou de uma “europeização” do mundo esquece que foi esse processo que criou a “Europa” no sentido moderno: “Hoje, imaginamos que a África e a Europa são dois continentes completamente diferentes, separados por um abismo de civilização, mas até bem pouco tempo essa distinção não faria sentido. Por muitos séculos, bens e homens se moveram mais facilmente na água do que por terra, e o comércio e o império reuniram os povos do Mediterrâneo”.[xxxii] A Europa moderna surgiu, simultaneamente, de uma cisão, uma diferenciação e uma contraposição. Pois não foi, em definitiva, a Europa que criou a expansão mercantil mundial, mas essa expansão a que criou o conceito moderno de Europa; essa expansão, por outro lado, não foi puramente comercial: “A construção do sistema-mundo moderno envolveu uma expansão de Europa, que era simultaneamente militar, política, econômica e religiosa. Dentro deste contexto, missionários cristãos atravessaram o globo, mas eram notoriamente mais bem-sucedidos em partes do mundo que não foram dominadas através das denominadas religiões mundiais. O número de convertidos em países largamente islâmicos, budistas, hindus e zonas confuciano-taoístas, eram relativamente poucos, e particularmente poucos em zonas islâmicas”.[xxxiii]
A expansão europeia tinha por base a expansão da produção industrial, que exigia uma correspondente expansão constante do mercado; ela atingiu todas as regiões do planeta, criando condições para “o entrelaçamento do todos os povos na rede do mercado mundial e, com isso, o caráter internacional do regime capitalista”.[xxxiv] A expansão europeia não criou automaticamente, por outro lado, sua hegemonia econômica sobre o restante do mundo. Na China, ainda hegemônica no Extremo Oriente e resistente às investidas europeias, em 1645 houve a conquista do poder pela dinastia Manchu, que submeteu os povos tradicionais da China Central (os manchus provinham da região Norte da China, a Manchúria).
A máxima expansão da civilização chinesa foi atingida ainda no século XVIII, quando foram conquistadas as vastas regiões interiores da Mongólia, do Sinkiang e do Tibete. Na sequência, “Império do Meio” (Chi’In) foi perdendo seu lugar dominante: o PIB anual per capita chinês se manteve estável (600 dólares) entre 1280 e 1700, enquanto o europeu, no mesmo período, ascendeu de 500 até 870 dólares.[xxxv] No início do século XVII, no entanto, o PIB da economia chinesa ainda era o primeiro do mundo (96 bilhões de “dólares Geary Khamis”), seguido pelo da Índia (74,25 bilhões) e, em terceiro lugar, a França (15,6 bilhões).[xxxvi]
Inicialmente, sua expansão mundial teve fortes repercussões internas na Europa, acelerando as transformações econômicas e sociais. Um fator que aumentou os ganhos dos arrendatários capitalistas foi a “revolução dos preços” do século XVI, vinculada à expansão monetária derivada da exploração do Novo Mundo, um fenômeno inflacionário motivado pelo afluxo de metais preciosos, consecutivo à colonização e conquista da América. Como a economia não estivesse ainda preparada para ajustar todos os rendimentos em função da inflação, aqueles que vendiam suas mercadorias (trabalhadores assalariados e capitalistas) lucraram de maneira desigual; aqueles que compravam, perderam (os consumidores em geral, e em parte os mesmos assalariados e capitalistas, só que estes ganhavam muito mais e perdiam muito menos). Só os que viviam de rendas fixas e apenas compravam, arruinaram-se (basicamente a aristocracia).
O Estado foi obrigado a criar outras formas de arrecadação (venda de títulos da dívida pública, e a venda de cargos e títulos de nobreza, que antes eram monopolizados pela nobreza de nascimento). A entrada enorme de metais preciosos de origem americana na Europa constituiu um episódio maior de sua história econômica e social: “Foi esse fato que desencadeou a crise dos preços do século XVI, e salvou a Europa de uma nova Idade Média, permitindo a reconstituição de seu estoque metálico”.[xxxvii] Ele desencadeou bem mais do que isso, pois antecipou o “clima (des)umano” de uma nova sociedade, por meio do “espanto desses homens ao longo de um século que começa antes de 1500 e durante o qual os preços não param de subir. Tiveram a impressão de viver uma experiência sem precedente. Aos bons velhos tempos em que tudo se dava por nada, sucedeu o tempo desumano das carestias que não mais retrocediam”,[xxxviii] para os mais pobres, e dos lucros que não paravam de aumentar, para os novos ricos.
A crise suscitada pela “revolução dos preços” (que quadriplicaram na Europa, ao longo do século XVI) contribuiu, através da inflação, para a ruína de inúmeros artesãos ou pequenos proprietários, criando novas condições suscetíveis de facilitar a passagem para um novo sistema econômico: o aparecimento de trabalhadores livres, despossuídos de qualquer propriedade a não ser a sua força de trabalho. O total de ouro circulante na Europa entre 1500 e 1650 passou de cinco mil para 180 mil toneladas, e o de prata de 16 mil para 60 mil toneladas.[xxxix]
Parte importante desviou-se para importar mercadorias do Oriente, mas outra parte alimentou o orçamento dos Estados que o despenderam em exércitos e armadas, emprestando dos banqueiros e criando o déficit fiscal (dívida pública, que Marx chamou de “Credo do capital”) como regra, criando sua dependência crônica e histórica do capital financeiro. Na Europa ocidental, o preço médio do trigo quadruplicou na segunda metade do século XVI. Os preços quadruplicaram na Espanha nesse século; na Itália, o preço do trigo multiplicou-se por 3,3; por 2,6 na Inglaterra, e por 2,2 na França.[xl]
A rota da inflação acompanhou a rota de entrada e de transporte dos metais preciosos americanos na Europa: [xli] “A descoberta e a conquista puseram em movimento um enorme fluxo de metal precioso da América à Europa, e o resultado foi uma grande elevação de preços – uma inflação ocasionada por um aumento da oferta do melhor tipo de dinheiro de boa qualidade. Quase ninguém na Europa estava tão afastado das influências do mercado para não sentir algum efeito sobre o seu salário, sobre o que vendia, ou sobre qualquer pequeno objeto que quisesse comprar. Os aumentos de preços ocorreram inicialmente na Espanha, onde os metais chegaram em primeiro lugar; a seguir, à medida que eram carregados pelo comércio (ou, talvez em menor escala, pelo contrabando ou por conquista) à França, aos Países Baixos e à Inglaterra, a inflação os seguiu.
Na Andaluzia, entre 1500 e 1600, os preços subiram cinco vezes. Na Inglaterra, se tomássemos como 100 os preços da última metade do século XV, isto é, antes das viagens de Colombo, à altura da última década do século XVI estariam em 250; oitenta anos mais tarde, ou seja, na década de 1673 a 1682, estariam em 350, três vezes e meia acima do que haviam alcançado antes de Colombo, Cortez e Pizarro. Após 1680, estabilizaram-se e assim permaneceram, pois tinham caído muito antes na Espanha. Esses preços, não os relatos dos conquistadores, representaram a notícia de que a América tinha sido descoberta, para a grande maioria dos europeus”.[xlii]
Se a importância da revolução dos preços do século XVI estão fora de discussão, não acontece o mesmo com suas causas. O surto inflacionário deveu-se ao aumento de circulação de metais preciosos, ou também tiveram peso outros fatores? Para Licher Van Bath, alta geral dos preços teria sido anterior à vinda e fluxo americano de metais preciosos na Europa. Os preços dos produtos agrícolas aumentaram antes disso mais do que os bens manufaturados e, também, mais do que os salários.[xliii]
O fator desencadeante da “revolução dos preços” teria sido, para esse autor, a explosão demográfica: o aumento da população teria levado ao aumento da procura por produtos de subsistência e, consequentemente, a um aumento nos preços. Com o crescimento da população houve uma maior oferta de mão de obra, o que levou a uma depreciação dos salários. Teria havido, também, um forte estímulo à produção agrícola de subsistência, evidenciado pelo aumento da área cultivada, e também pelo aumento do conhecimento agronômico.
O aumento dos preços se verificava diretamente no comércio urbano e no crescimento das cidades. Para Pierre Vilar, do seu lado, a revolução dos preços não foi causada exclusivamente pelo aumento da circulação de metais provenientes da América: desde meados do século XV uma tendência ao aumento dos preços se configurava através da expansão demográfica e agrícola, dos avanços técnicos da extração de prata na Europa, das inovações financeiras, monetárias, comerciais e, finalmente, políticas. A teoria de Van Bath foi proposta como alternativa à explicação da origem do capitalismo pela acumulação originária de capital, através da violência social/estatal, fundamentando o desenvolvimento da troca comercial e da acumulação de capital como uma tendência “natural e espontânea” da sociedade humana para superar o estágio selvagem.[xliv] Como seja, a inflação do século XVI foi uma reviravolta crucial da economia europeia.
A crise europeia do século XVII, a crise da agricultura, o estancamento populacional, ensejaram o declínio final do feudalismo no continente, o auge do capital comercial e a protoindustrialização, que foram os sintomas anunciadores do domínio econômico de um novo modo de produção.[xlv] Os senhores feudais já recebiam as contribuições anuais dos servos em moeda, uma taxa fixa por pessoa. Ao dobrar a quantidade de ouro, permanecendo pouco alterada a produção, os preços duplicaram reduzindo pela metade os rendimentos dos senhores feudais: “A crise econômica da nobreza feudal deu início a uma grande transferência de riqueza, cujo exemplo macroscópico foi a venda dos feudos. Para piorar a condição econômica da aristocracia e aumentar os ganhos especulativos da burguesia comercial surgira uma circunstância muito particular: o rápido aumento da massa de capital circulante, que se seguiu à importação massiva de metais preciosos, determinando um amplo fenômeno de inflação dos preços que se repercutiu negativamente nos valores fundiários feudais”.[xlvi]
O aumento geral dos preços produziu uma transferência de renda dos senhores feudais para a classe comercial emergente, que não deixou de advertir o potencial político da simultânea rebelião popular contra os senhores, que já parecia o sinal anunciador de um novo regime social: “No início do século XVI a ordem estabelecida parecia ameaçada na Europa. A velha pressão da nobreza e a pressão renovada de alguns soberanos que reclamavam mais impostos e mais soldados, pesavam duramente sobre as camadas populares, especialmente sobre os camponeses. Seu mal-estar se expressava em revoltas cada vez mais frequentes, quase uma por ano. Essas revoltas eram cada vez mais conscientes e radicais, com frequência delineavam exigências de reforma social. Não importa que reivindicassem uma ‘economia moral’ ilusória que supunham que os senhores tinham tornado vulnerável, ou que invocassem a lei divina e que fizessem uma leitura igualitária dos evangelhos, o que dava um caráter ‘tradicional’ a seu discurso. Por trás desses argumentos existia a esperança de uma nova sociedade na qual os homens seriam iguais em direitos, as autoridades eleitas, e a religião não seria um instrumento de controle social nas mãos dos clérigos”.[xlvii] Desse modo bem explícito, uma revolução social estava a caminho, alicerçada na rebelião no campo.
No terreno econômico, Paul Mantoux, especialmente,[xlviii] acentuou o papel do comércio e das cidades no surgimento do capitalismo. Os grandes mercados urbanos surgiam das rotas percorridas pelos mercadores. A transição para compras e vendas contínuas teve início nas cidades europeias em fins do século XVIII. Essa nova forma comercial sofreu influência e também propiciou o desenvolvimento das ferrovias e da navegação a vapor; o grande entrave que impedia a expansão da economia mercantil era a falta de comunicação. O fraco e lento fluxo do comércio exigia ser confinado e conduzido por canais melhor definidos. Com o desenvolvimento dos transportes, as feiras e mercados ocasionais e não permanentes se tornariam obsoletos na Europa ocidental (as feiras russas mantiveram sua importância por mais tempo). Os métodos comerciais mudaram. As bolsas de produtos aos poucos foram tomando lugar das feiras, funcionando diária e permanentemente. As compras se davam por amostras: o comércio era mais especulativo.
Surgiu a venda de títulos e termos ou transações de seguro, mediante as quais o produtor se garantia quanto a qualquer perda que pudesse sofrer através de flutuações no preço da matéria prima. Os seguros garantiam o pagamento de uma multa pré-estabelecida caso o preço caísse; o comprador, por sua vez, garantia uma cobertura no valor eventualmente alterado do produto que desejava comprar. Havia um crescimento da confiança nos compromissos comerciais e na honestidade dos negócios. O mercado se diversificava, havia uma maior quantidade de suprimentos. Com a modificação dos transportes a variedade de produtos provenientes de lugares diferentes era muito maior.
Os comerciantes começaram a se dedicar somente às vendas, se especializando em alguns setores. As bolsas de produtos utilizavam os telégrafos ou outros novos métodos de comunicação para se relacionar com outras bolsas: isso acarretou a criação de um preço único internacional, cuja oscilação era notificada a todos os mercados. Os viajantes comerciais usavam novos meios de transporte para buscar compradores. As lojas foram se tornando variadas, passaram a ser dirigidas por um comerciante de artigos especializado: se tornavam assim empresas comerciais. Inicialmente pequenas e especializadas, se tornariam ulteriormente grandes e múltiplas, com muitas filiais.
A circulação acelerada de mercadorias foi uma condição da valorização do capital na indústria e no comércio. Com a dissolução das vassalagens desmoronou progressivamente o sistema feudal e a organização corporativa na cidade: o capital dinheiro oriundo do comércio instalou-se nas manufaturas aproveitando-se do sistema urbano e da organização corporativa, buscando economias de escala mediante a centralização dos recursos produtivos. Marx resumiu o processo: “A transformação dos meios de produção individualmente dispersos em meios socialmente concentrados, da propriedade minúscula de muitos na propriedade gigantesca de poucos; a expropriação da grande massa da população, despojada de suas terras, de seus meios de subsistência e de seus instrumentos de trabalho, essa terrível e difícil expropriação, constituiu a pré-história do capital”.[xlix] Esse processo ganhou fôlego graças à impulsão que recebeu por parte do Estado absolutista, em primeiro lugar na Inglaterra, onde houve uma paulatina transformação do papel da aristocracia no século XVII, transformando-se cada vez mais em uma classe ocupada em atividades comerciais.
O capital comercial se expandia internacionalmente; também esteve presente no tráfico de escravos negros da África e nas relações comerciais entre as colônias e as metrópoles. O comércio de escravos e a sede por metais preciosos proporcionavam grandes lucros: foi um período de acumulação acelerada, baseada na alta de preços das mercadorias, nos lucros elevados e nos salários muito baixos. O comércio triangular Europa-África-América proporcionou uma grande acumulação de dinheiro, que estabeleceu as bases, bem pouco “liberais”, para o financiamento ulterior do capitalismo propriamente industrial: “Conquista, pilhagem, exterminação; esta é a realidade de onde vem o afluxo de metais preciosos para a Europa no século XVI. Através dos tesouros reais da Espanha e de Portugal, das caixas dos mercadores, das contas dos banqueiros, esse ouro estava totalmente ‘lavado’ quando chegava aos cofres dos financistas de Gênova, de Antuérpia ou de Amsterdã”.[l]
Nesses primeiros grandes centros financeiros da Europa, especialmente em Amsterdã, os inícios da acumulação capitalista vieram acompanhados de crises de um novo tipo. Inicialmente, elas foram atribuídas a fenômenos aleatórios, como foi o caso da “crise das tulipas”, a primeira crise econômica moderna registrada, que transcorreu entre 1636 e 1637, provocada pela especulação sobre o aumento de preços, e posterior desmoronamento dos mesmos, dessa flor exótica usada na decoração de jardins e também na medicina.
Foi a primeira “crise de sobreprodução” a ser registrada nos anais históricos: os comerciantes estavam abarrotados de bulbos de tulipas comprados antes da quebra, e quebraram, pois, a Corte holandesa não obrigava a execução do pagamento desses contratos. Versões menores e semelhantes da “tulipamania” também ocorreram em outras partes da Europa. Um dos seus efeitos foi a sofisticação do sistema financeiro (através dos contratos de seguro) e a criação de mecanismos como o mercado de opções.[li] Assim, foi tendo como centro inicial a Europa do Mar do Norte, mas num processo de abrangência mundial, que se gestaram, na Europa ocidental, as condições que possibilitaram o nascimento do capitalismo e de suas instituições. Suas bases de lançamento foram a violência social e política na Europa, e a violência geral, como veremos, na América e na África – as crises de sobre acumulação de mercadorias, por sua vez, foram o sinal anunciador de seu doloroso parto.
*Osvaldo Coggiola é professor titular no Departamento de História da USP. Autor, entre outros livros, de Teoria econômica marxista: uma introdução (Boitempo).
Notas
[i] Richard A. Goldthwaite. L’Economia della Firenze Rinascimentale. Bolonha, Il Mulino, 2013.
[ii] Michel Krätke. Marx und die Weltgescichte. Zu den Studienmaterialien von Marx und Engels. Beiträge zur Marx-Engels-Forschung, Neue Folge 2014/15.
[iii] Jacques Le Goff. A Idade Média e o Dinheiro. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1993.
[iv] Charles Van Doren. Uma Breve História do Conhecimento. Rio de Janeiro, Casa da Palavra, 2012.
[v] David S. Landes. Prometeu Desacorrentado. Transformação tecnológica e desenvolvimento industrial na Europa ocidental, desde 1750 até nossa época. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1994.
[vi] Rodney Hilton. Op. Cit.
[vii] Albert Dauphin-Menier. Histoire de la Banque. Paris, PUF, 1968.
[viii] Georges Duby. Guerreros y Campesinos. Desarrollo inicial de la economia europea (500-1200). Madri, Siglo XXI, 1976.
[ix] Karl Marx. Formações Econômicas Pré-Capitalistas. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1991.
[x] A.L. Morton. A História do Povo Inglês. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1970.
[xi] Gianfranco Poggi. A Evolução do Estado Moderno. Rio de Janeiro, Zahar, 1981.
[xii] Michael E. Tigar e Madeleine R. Levy. O Direito e a Ascensão do Capitalismo. Rio de Janeiro, Zahar, 1978.
[xiii] Ludovico Gatto. Il Medioevo. Roma, Newton & Compton, 1994.
[xiv] Jürgen Kuczynski. Breve Historia de la Economia. México, Cartago, 1984.
[xv] Régine Pernoud. Les Origines de la Bourgeoisie. Paris, Presses Universitaires de France, 1947.
[xvi] Essa guerra não foi um conflito único e continuado, mas uma série de conflitos travados entre 1337 e 1453 pelos Plantagenet, casa governante da Inglaterra, contra a Casa de Valois, governantes da França, e aliados respectivos (numerosos), sobre a sucessão do trono francês. Cinco gerações de reis das dinastias rivais lutaram pelo trono do maior reino da Europa Ocidental. A guerra marcou tanto o auge da cavalaria medieval quanto seu subsequente declínio, e o desenvolvimento de fortes “identidades nacionais”. Depois da conquista normanda, os reis da Inglaterra eram vassalos dos reis da França para suas posses em solo francês. Os reis franceses se esforçaram, ao longo dos séculos, para reduzir essas posses, que apenas a Gasconha fosse deixada para os ingleses. A confiscação ou a ameaça de confisco deste ducado faziam parte da política francesa para controlar o crescimento do poder inglês, particularmente quando os ingleses estavam em guerra com o Reino da Escócia, aliado da França (Cf. Michel Balard, Jean-Philippe Genet e Michel Rouche. Le Moyen Âge en Occident. Paris, Hachette, 2003).
[xvii] Luciano Pellicani. La Genesi del Capitalismo e le Origini della Modernità. Soveria Mennelli, Rubbettino, 2013.
[xviii] Francisco Magalhães Filho. História Econômica. São Paulo, Sugestões Literárias, sdp.
[xix] Karl Marx. O Capital, Livro I, vol. 1 (São Paulo, Nova Cultural, 1986 [1867]).
[xx] Karl Marx. O Capital, Livro I, vol. 1.
[xxi] Karl Marx e Friedrich Engels. Manifesto Comunista. São Paulo, Cidade do Homem, 1980 [1848].
[xxii] Maurice Dobb. A Evolução do Capitalismo. Rio de Janeiro, Guanabara, 1987 [1947].
[xxiii] Karl Marx. Trabajo Asalariado y Capital. Pequim, Ediciones en Lenguas Extranjeras, 1976.
[xxiv] Ellen Meiskins Wood. The Origins of Capitalism. A longer view. Londres, Verso Books, 2002.
[xxv] Phyllis Deane. A Revolução Industrial. Rio de Janeiro, Zahar, 1982.
[xxvi] Karl Marx. O Capital, Livro I, vol. 1, assim como as citações precedentes.
[xxvii] Janet L. Abu-Lughod. Before European Hegemony. The world system 1250-1350. Nova York, Oxford University Press, 1989.
[xxviii] Felipe Fernández-Armesto. Cristóbal Colón. Barcelona, Folio, 2004.
[xxix] Fritz Rörig. The Medieval Town. Batsford, University of California Press, 1967 [1932].
[xxx] Earl J. Hamilton. El Florecimiento del Capitalismo. Madri, Alianza Universidad, 1984.
[xxxi] Pierre Vilar. La transition du féodalisme au capitalisme. In: CERM (Centre d’Études et Recherches Marxistes). Sur le Féodalisme. Paris, Éditions Sociales, 1971.
[xxxii] Nigel Cliff. Guerra Santa. Como as viagens de Vasco da Gama transformaram o mundo. São Paulo, Globo, 2012.
[xxxiii] Immanuel Wallerstein. Islam, the West, and the World. Lecture in series “Islam and World System,” Oxford Centre for Islamic Studies, outubro de 1998.
[xxxiv] Karl Marx. O Capital. Livro I, vol. 1, cit.
[xxxv] Angus Maddison. Chinese Economic Performance in the Long Run. Paris, OCDE, 1998.
[xxxvi] O dólar Geary-Khamis é uma unidade de conta fictícia, que tem o mesmo poder aquisitivo em um dado país que o dólar americano nos Estados Unidos em um determinado momento.
[xxxvii] Pierre Chaunu. História da América Latina. São Paulo, Difusão Europeia do Livro, 1981.
[xxxviii] Fernand Braudel. O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na Época de Filipe II. São Paulo, Edusp, 2016, vol. 1.
[xxxix] Earl J. Hamilton. El Tesoro Americano y la Revolución de los Precios en España 1501-1650. Barcelona, Crítica, 2000.
[xl] John H. Munro. Money, prices wages and profit inflation in Spain, the Southern Netherlans and England during the price revolution: 1520-1650. História e Economia vol. 4 nº 1, São Paulo, 1º semestre de 2008.
[xli] Fernand Braudel. Il tesoro americano e la rivoluzione dei prezzi. In: Ciro Manca (ed.). Formazione e Trasformazione dei Sistemi Economici in Europa dal Feudalesimo al Capitalismo. Padua, CEDAM, 1995.
[xlii] John K. Galbraith. Moeda. De onde veio, para onde foi. São Paulo, Pioneira, 1977.
[xliii] H. Licher Van Bath. História Agrária da Europa Ocidental (500-1850). Lisboa, Presença, 1984.
[xliv] Murray N. Rothard. Down with primitivism: a thorough critique of Polanyi. Mises Daily, Londres, setembro de 2004; W. H. B. Court. A Concise Economic History of Britain. Londres, Cambridge University Press, 1954. Segundo Friedrich Hayek o mercado seria uma tendência espontânea das sociedades para sair do estado tribal
[xlv] Eric J. Hobsbawm. A crise geral da economia europeia no século XVII. In: Charles Parain et al. Op. Cit.
[xlvi] Giuliano Conte. Da Crise do Feudalismo ao Nascimento do Capitalismo. Lisboa, Presença, 1979.
[xlvii] Josep Fontana. A Europa diante do Espelho. Bauru, Edusc, 2005.
[xlviii] Paul Mantoux. A Revolução Industrial no Século XVIII. São Paulo, Hucitec, 1988.
[xlix] Karl Marx. O Capital. Livro I, vol. 1.
[l] Michel Beaud. Histoire du Capitalisme. Paris, Seuil, 1981.
[li] Osvaldo Coggiola. No século XVII: a crise das tulipas. História Viva nº 62, São Paulo, novembro de 2008.
* Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.
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