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    José Álvaro de Lima Cardoso

    Economista

    213 artigos

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    A veloz “desconstrução” dos serviços públicos no Brasil

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     No debate sobre as contrarreformas em geral, o primeiro aspecto que jamais deveria ser esquecido, é que todas elas (previdenciária, trabalhista, Estado), incluindo a PEC 32/2020, vieram na esteira de um crime de grandes proporções contra o Brasil, que foi o golpe de Estado, em curso. Esse golpe teve como momento crucial o impeachment da presidente Dilma Roussef em 2016, mas não se limita a ele. O resgate do golpe não é nenhum capricho ou questão moral: é que o golpe está transformando profundamente a sociedade brasileira - para pior - por isso deve ser resgatado. Resgatar o fato é fundamental para a precisão da análise e, consequentemente, para as ações a serem encaminhadas.   

     A PEC 32/2020 vem num conjunto de medidas encaminhadas pelo menos desde o golpe de 2016. O aspecto central da referida PEC é que ela revê uma concepção de Estado, mais ou menos aceita, de que alguns direitos são constitucionais e devem ser providos pelo Estado de qualquer maneira. A partir das medidas da reforma administrativa, aquilo que a gente conhece como direito constitucional desde, pelo menos 1988, a reforma administrativa quer transformar, na prática, em mera “prestação de serviços”. Como outra face da mesma moeda, esta concepção classifica os direitos do servidor, como “privilégios”. Nesse contexto, a estabilidade no emprego é “o cúmulo da regalia”, “servidores não fazem nada e recebem salários milionários”, etc. Segundo essa concepção de Estado, é necessário esmagar salários e direitos para melhorar a eficiência do Estado.

     A operação de rápido desmonte dos serviços públicos, como os golpistas vêm fazendo, requer total ausência de transparência e debate. Se as medidas são aprovadas a toque de caixa no Congresso Nacional, sem aprofundamento do debate e sem a população saber direito o que está acontecendo, o lado mais poderoso aprova a versão que quer. Por isso o governo federal, no intuito de aprovar a reforma administrativa, mente muito, mente descaradamente. Mentir, aliás, parece ser uma especialidade dos promotores do golpe.  

     Como uma grande parte da população vive na miséria, e a classe média está empobrecendo rapidamente, qualquer comparação com o setor privado, torna os direitos do funcionalismo público, um rosário de “privilégios”. Um professor que ganha R$ 4.500,00 passa a ter seu salário considerado verdadeira “fortuna”. Um gari de empresa pública, com 15 anos de casa, que ganha R$ 4.000,00 é um autêntico “marajá”. A mídia que divulga essas coisas não menciona, claro, que o salário mínimo necessário para uma família de 4 pessoas, calculado pelo DIEESE é R$ 5.315,74, valor correspondente a 4,83 vezes o mínimo vigente no país.  

     Dentre as várias mentiras que se conta, no debate sobre Estado nacional, uma é de que a privatização irá resolver o problema fiscal do governo. Mas o fato é que não há saída para o problema financeiro no Brasil, se não se resolve o problema da dívida pública. O governo arrecadou com privatizações no ano passado, menos de R$ 100 bilhões, torrando ativos fundamentais para a população brasileira. Mas só os gastos com o pagamento de juros e amortizações da dívida pública chegaram à cifra impressionante de R$ 1.381 trilhão.  

     O conjunto das medidas a partir do golpe, desmonta o Estado tal qual hoje o conhecemos. As medidas principais são:

     1.PEC do teto ainda em 2016 (EC 95), que congelou gastos primários do governo federal. Só se pode corrigir os gastos pela inflação do ano anterior;

     2. Continuou com a terceirização ilimitada, aprovada no governo Temer (março de 2017). Medida que acabou com a terceirização apenas nas atividades meio e abriu a possibilidade de terceirizar tudo. Uma escola, portanto, passou a poder terceirizar professores, ao invés de contratar diretamente;

     3.Passa pela contrarreforma trabalhista (aprovada em julho de 2017) que, além de rebaixar os direitos de toda a classe, estavam preparando para medidas específicas no setor público);  

     4.Segue com a contrarreforma da previdência (aprovada em novembro de 2019) que dificultou o acesso ao direito e diminuiu o valor das aposentadorias;

     5.Continua com as privatizações, alimentada pela mesma concepção de Estado mínimo. Por exemplo, o Banco do Brasil, que estão preparando para privatizar, irá fechar neste ano, 361 unidades e demitir 5 mil funcionários;

     6.Segue com a PEC 32/2020 e outras medidas.  

     Na lista acima foram lembradas algumas das medidas principais. Mas há muitas pequenas medidas complementares, com menor visibilidade, que a sociedade não consegue nem acompanhar. Com esse conjunto de medidas principais, e outras complementares, a intenção é mudar radicalmente a relação do Estado com a sociedade. Acabar com o pouco que tem de Estado de bem-estar social no país.  

     Exemplo de medida aparentemente sem importância para o setor público é o fim da política de ganhos reais do salário mínimo. O servidor público pode pensar “isso nada tem a ver comigo”. Mas essa medida afeta toda as relações econômicas. O salário mínimo é referência de toda a economia, inclusive para o setor público, especialmente prefeituras. O salário mínimo é um preço que influencia a distribuição de renda como um todo, exercendo o papel de alicerce salarial da economia.  

     Bolsonaro estava falando sério, quando afirmou, em março de 2019, numa reunião na sede da CIA: (...). O Brasil não é um terreno aberto onde nós pretendemos construir coisas para o nosso povo. Nós temos é que desconstruir muita coisa. Desfazer muita coisa. Para depois nós começarmos a fazer”.  

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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