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    Guilherme Scalzilli

    Historiador e escritor

    62 artigos

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    Alckmin de vice é autossabotagem

    Nem as melhores intenções do mundo justificam a proposta de tornar Geraldo Alckmin candidato a vice na chapa de Lula. O arranjo é duplamente desnecessário. Além de não fortalecer as supostas prioridades da campanha e do país, gera problemas evitáveis que só atrapalham o favoritismo e o eventual governo do petista.

    Alckmin desagrega. Desde que foi aventado, seu nome causa discussões entre militantes de esquerda nas redes digitais. Conflitos minoritários, talvez, mas precoces, inflamados e potencialmente corrosivos. Nesse ritmo, em semanas de campanha oficial os debates internos ficariam tomados por agressões, “cancelamentos” e cizânias rancorosas.

    Seria difícil abafar a memória de lutas da esquerda contra o tucanato paulista, inclusive pela óbvia conveniência dessa propaganda negativa para os adversários. E não podemos desprezar o estrago eleitoral de uma avalanche de registros sobre escândalos impunes dos governos Alckmin, ataques a professores e estudantes, amizades nefastas, etc.

    O esforço dos defensores da ideia para torná-la menos indigesta agrava a discordância. Afinal, se até o rótulo “conservador” parece lisonjeiro em Alckmin, situá-lo no centro político beira mesmo o escárnio. Sua simpatia pela Opus Dei, que abriga também parte do fascismo judicial, denota valores incompatíveis com qualquer agenda progressista.

    Nunca haverá plena harmonia ideológica numa coligação, mas além de certo limite a diferença vira mau agouro. Ao contrário de José Alencar, Alckmin nutre ambições presidenciais. Embora isso não o torne conspirador, tampouco o sintoniza com os planos lulistas. Aliado relutante, inamovível, tratado pela mídia como sucessor natural de Lula, o vice representaria uma contínua ameaça de ruptura na cúpula do governo.

    Ao mesmo tempo, os benefícios prometidos são duvidosos. As pesquisas apontam que Alckmin levaria ganho minúsculo de votos à chapa, decerto incapaz de compensar a dissidência de esquerda no primeiro turno e irrelevante para a adesão inercial dos oposicionistas no segundo. A expectativa de reforço à governabilidade não considera o ressentimento da antiga base partidária do ex-tucano pela derrota em São Paulo.

    É desonesto chamar os críticos a Alckmin de sectários. A rejeição a ele vai muito além de purismos esquerdistas ou de horror a pactos moderados. Trata-se de formular estratégias aglutinadoras que não recorram a pragmatismos capengas, nem desperdicem a enorme vantagem de Lula adotando uma das piores soluções possíveis.

    Por que rachar a militância faltando pouquíssimo para o triunfo imediato? O comando da campanha não vê os benefícios que essa perspectiva daria ao futuro governo e às candidaturas da aliança? Que simbologia conciliadora já não foi transmitida pelos amorosos diálogos com Alckmin, com os órfãos da terceira via e até com golpistas?

    A obsessão em tratar a disputa eleitoral como sacrifício expiatório sugere que parte do lulismo internalizou a culpa alheia pela tragédia fascista. Vendo na escolha do vice um fardo necessário para “salvar a democracia”, o PT responde por erros que não cometeu em 2018 e assume responsabilidades que não lhe cabem agora. Essa autocrítica solidária desrespeita o próprio espírito do voto popular em Lula. É o famoso medo de ser feliz.

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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