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    Nilto Tatto

    Nilto Tatto é deputado federal pelo PT de São Paulo. É presidente da Frente Parlamentar Mista Ambientalista do Congresso Nacional e desempenhou o papel de coordenador da bancada de esquerda na CPI do MST.

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    Alerta contra o pacote de veneno

    O Projeto de Lei 6299/2002, um “liberou geral” para registro, liberação, fabricação, comercialização e uso de agrotóxicos na agricultura expõe visões opostas entre os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente de um lado e o da Agricultura de outro, diante da ação do lobby ruralista e da indústria química que produz esses venenos

    O Projeto de Lei 6299/2002, um “liberou geral” para registro, liberação, fabricação, comercialização e uso de agrotóxicos na agricultura expõe visões opostas entre os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente de um lado e o da Agricultura de outro, diante da ação do lobby ruralista e da indústria química que produz esses venenos (Foto: Nilto Tatto)

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    Reflexo de um governo refém dos diversos segmentos que têm como preocupação seus interesses específicos, tivemos, recentemente, informações conflitantes entre si em torno de um mesmo tema. O Projeto de Lei 6299/2002, um “liberou geral” para registro, liberação, fabricação, comercialização e uso de agrotóxicos na agricultura expõe visões opostas entre os Ministérios da Saúde e do Meio Ambiente de um lado e o da Agricultura de outro, diante da ação do lobby ruralista e da indústria química que produz esses venenos.

    O Conselho Nacional de Saúde, órgão vinculado ao Ministério da Saúde, recomenda veto a este Projeto que, entre outras medidas, propõe a retirada do símbolo da caveira das embalagens, importante indicação universal em sinal de perigo. Busca, com eufemismo cínico, substituir o termo agrotóxico pela denominação “defensivo fitossanitário”. E, por fim, coloca a Anvisa e o Ibama, bem como o CNS em papel secundário sobre decisões que impactam a saúde da população e o meio ambiente.

    Como resposta à sugestão de veto que propõe o CNS ao assim chamado pacote do veneno, o subserviente governo Temer retira da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, também vinculada ao Ministério da Saúde, a incumbência de prestar esclarecimentos a respeito do uso de agrotóxicos. Essas informações passam a ser de competência do Ministério da Agricultura. Não por acaso, o “bunker” da bancada ruralista, interessada na aprovação deste PL de autoria do então deputado e hoje ministro desta pasta, Blairo Maggi (PP-Mato Grosso), com parecer favorável do deputado Luiz Nishimori (PR-Paraná), duas expressões do ruralismo mais retrógrado.

    Em meio à polêmica entre ministérios de Temer, o Ministério Público Federal divulgou, neste início de maio, nota técnica em que considera inconstitucional este Projeto de Lei. Detalha nada menos que seis artigos da Constituição que serão violados com sua possível aprovação. O referido documento conclui, ainda, que o PL está na contramão da preocupação mundial com o meio ambiente e a saúde pública, além de retirar a responsabilização de quem faz uso de agrotóxicos, em caso de descumprimento às exigências definidas em lei.

    Trabalho inédito da pesquisadora Larissa Bombardi, do laboratório de geografia agrária da USP revela que, por dia, oito brasileiros são intoxicados pelo uso do agrotóxico que chega à sua mesa sem o seu conhecimento ou pelo manuseio desses venenos – isso em dados oficiais, sem contar os casos não registrados diariamente. Com a nova lei pretendida pelos ruralistas, que abranda e relaxa exigências para seu uso, esse número tende a aumentar de maneira expressiva. Movimentos sociais, ONGs e parlamentares progressistas constituíram ampla frente de luta para tentar impedir a aprovação desse absurdo. Será, com certeza, uma árdua batalha.

    O “alerta à sociedade sobre o pacote do veneno” elaborado por Organizações que também se mobilizam para impedir que este Projeto seja aprovado, sob a falsa justificativa de diminuir os preços dos agrotóxicos, observa que a intenção é somente ampliar a utilização desses venenos na agricultura por meio de medidas como retirar de estados e municípios a competência de elaborar leis específicas e restritivas e definir que o Ministério da Agricultura será o único agente de Estado responsável pelo registro dos produtos. Com isso, a ANVISA (Ministério da Saúde) e o IBAMA (Ministério do Meio Ambiente) deixam de ter poder de veto sobre eventuais novos registros e teriam mero papel auxiliar. 

    Verdadeiro atentado à saúde pública e ao meio ambiente, este PL 6299/2002, que a bancada ruralista e indústria química querem aprovar, prevê a criação do RET (Registro Especial Temporário) e a AT (Autorização Temporária) para produtos agrotóxicos aprovados em países da OCDE. Desprezo total a autonomia e soberania do Brasil, desqualificação ao trabalho de pesquisa e a ciência do nosso país, além de desconsiderar nossa biodiversidade, bem como características alimentares da população. E mais: retira de órgãos de saúde, como ANVISA, autonomia para publicar dados sobre análises de agrotóxicos em alimentos.

    De volta ao trabalho da pesquisadora Larissa Bombardi, atualmente o Brasil permite o uso de 504 tipos de agrotóxicos. Desse total 30% proibidos na União Europeia, alguns há mais de uma década. Ao mesmo tempo, mais que dobrou o uso desses venenos na agricultura brasileira, saltando de 3,1 Kg/há, em 2001 para 6,8 Kg/há, em 2013. Para a saúde pública e o meio ambiente o cenário que se desenha diante da possível aprovação deste Projeto de Lei 6299/2002 é ainda mais drástico, diante do potencial aumento dos danos que serão causados.

    Os Ministérios da Saúde através de nota técnica da ANVISA e do Meio Ambiente por recomendação do IBAMA apontaram restrições e sugeriram veto a este Projeto. O Ministério da Agricultura, no entanto, aparelhada pela bancada ruralista já adota pontos deste PL, mesmo antes de sua aprovação. Nessa queda de braço no interior de um governo desgovernado só mesmo a força da mobilização popular para impedir o “liberou geral” do agrotóxico em nosso país.

     

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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