Blecaute na taxação das grandes fortunas
Os votos dos parlamentares da direita liberal e da extrema direita, fatalmente, atendem a mão invisível do mercado
Na semana passada, a inclusão da proposta de taxação das grandes fortunas no conjunto da Reforma Tributária foi sepultada na câmara federal por 262 votos dos deputados da direita liberal fisiológica e da extrema direita fascista. Somente 136 parlamentares da esquerda, integrantes do Partido dos Trabalhadores (PT), do Partido Socialista Brasileiro (PSOL), do Partido Verde (PV) e do Partido Rede Sustentabilidade (REDE) votaram a favor da proposta. Para ser aprovada necessitaria angariar 257 votos.
A taxação sobre a totalidade de bens e direitos de qualquer natureza no Brasil e no exterior de pessoas físicas e, no caso de pessoas jurídicas sobre os bens e direitos mantidos no Brasil, significaria um passo alentador na diminuição da desigualdade social.
Além dos parlamentares progressistas constituírem a menor representação na câmara federal, boa parte dos que oscilam em suas pseudo convicções discursivas em defesa dos hipossuficientes, não compareceu no dia da votação, como a deputada Tábata Amaral do Partido Socialista Brasileiro (PSB), cujo discurso não corresponde a sua prática política, dita de centro esquerda. A falta de comprometimento desses políticos demonstra o quanto o povo tem sido refém das más escolhas de seus representantes.
De acordo com a teoria da progressividade tributária, sempre que a renda do contribuinte crescer, a alíquota tributária devida, acompanhará esse crescimento. Contudo, conforme nos exemplifica o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) “quem ganha acima de um milhão de reais por ano paga uma alíquota tributária de 13,6%, todavia os que ganham em torno de 450 mil reais ao ano, a alíquota devida é de 14,2%”. Portanto, no Brasil, o princípio do Direito Tributário referente à progressividade tributária tem sua aplicação afastada em favor dos mais ricos.
De modo reiterado, quando as determinações do texto constitucional incidem sobre algum prejuízo dirigido à privilegiada elite financeira, essas raramente se concretizam em leis complementares.
Os votos dos parlamentares da direita liberal e da extrema direita, fatalmente, atendem a mão invisível do mercado. Nesse panorama, cada vez mais o acúmulo de capital se perpetua entre uma minoria fartamente rica, em detrimento das camadas sociais menos favorecidas.
O aumento na arrecadação de impostos sobre as grandes fortunas poderia aliviar as atuais limitações impostas pelo arcabouço fiscal evitando, em certa medida, cortes em áreas sensíveis de interesse público, que respondem em longo e médio prazo ao desenvolvimento orgânico e sustentável do país. Pressões do mercado financeiro tem aumentado as tensões no campo econômico do governo, por meio de seus nefastos e insistentes mecanismos insurgentes.
Assim, o contínuo aprofundamento da disparidade entre os possuidores e os despossuídos marcha a passos largos, enquanto a virada para direita liberal e extrema direita persistir, tanto âmbito nacional, como internacional.
A onda de retrocesso nos costumes; a ênfase no conservadorismo; o negacionismo climático e ambiental; o uso da fé como sinônimo de prosperidade; a redução dos direitos sociais pelo culto ao estado mínimo; o recrudescimento das reações do povo, conformado aos discursos antissistema têm orientado o curvamento do povo às mentiras que parecem verdades, tanto da direita fisiológica, como do fascismo tropical da extrema direita.
As inclinações pela escolha de representantes algozes, vestidos em peles de cordeiro, têm dominado os corpos e mentes de boa fração de homens e mulheres que não se reconhecem nos valores progressistas.
Nesse sentido, resta indagar acerca das razões dessa onda conservadora e o fato de a esquerda estar perecendo em argumentos convincentes capazes de derrotar as pautas falaciosas da direita.
Como referi em meu artigo anterior, “Estar onde o povo está”, a esquerda precisa refletir com urgência as suas práticas políticas, a fim de brecar a vinculação do povo à mágica enganosa das alas da direita e da extrema direita, que a têm seduzido.
Com a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos, é ligado um sinal de alerta nos países submetidos à hegemonia americana, não que os rumos entre um possível governo Kamala fosse diferente em relação a Trump. No entanto, este representa a força exacerbada e autoritária do exercício imperialismo no mundo.
A vitória de Trump fortalece a extrema direita no mundo. A partir dos resultados das eleições americanas, vários políticos brasileiros da direita e extrema direita comemoraram eufóricos, na perspectiva de auferir vantagens em seus movimentos radicais amparados na influência do presidente eleito. Outra consequência ruim do futuro governo trumpista é quanto ao negacionismo sobre a crise climática. Durante o governo Biden, foram assinados acordos com o governo brasileiro com doação de recursos para o Fundo da Amazonia. Certamente Trump irá rechaça-los. No campo comercial, Trump prometeu aumentar em 10 pontos percentuais as tarifas de importação. Como os EUA recebem o maior fluxo das exportações brasileiras, consequentemente essas transações comerciais sofrerão impactos.
Os reflexos deletérios da eleição americana não podem ser desconsiderados. No Brasil, o Copom acaba de anunciar a alta de 0,5 pontos percentuais na taxa Selic, com juros 11,25% ao ano, um dos maiores índices de juros escorchantes do mundo. Roberto Campos Neto, nomeado pelo inelegível, age de modo político partidário no comando do Banco Central, frontalmente contra o governo Lula asfixiando, sobremaneira, o desenvolvimento econômico do país.
Nesse horizonte coberto por densas nuvens cinzentas e por fortes descargas elétricas emitidas por perigosos raios, o Brasil e seu povo precisarão de muita proteção frente às tempestades que estão por vir.
A derrota da taxação das grandes fortunas é somente uma, entre tantas decepções ardilosamente preparadas pela bancada majoritária de oposição ao ideário progressista, que trabalha contra o povo que a elegeu.
É hora de a esquerda brasileira agir sem copiar o estilo da direita fisiológica, ou da lacradora extrema direita. Nessa perspectiva, caberá ao campo progressista revitalizar suas origens na escuta ativa da concretude da vida do povo, a fim de que na próxima eleição presidencial, em 2026, não legitime a vitória de um candidato à imagem e semelhança de Trump e todas as adjetivações que o caracterizam como negacionista, reacionário, xenófobo, racista, misógino e sexista.
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