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    Rodrigo Lamore

    Rodrigo Lamore é cantor, músico e compositor. Possui trabalho autoral e atualmente vive de shows voz e violão em barzinhos do Rio de Janeiro. É oriundo da cidade de Guanambi - BA e tem quase trinta anos de carreira musical.

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    Cantor voz e violão, o camelô da música

    Bares, casas noturnas e restaurantes são os locais de trabalho dos artistas

    Que mal faz um violão?

    O que há de diferente entre o camelô que passa de mesa em mesa tentando vender os seus produtos para conseguir um mínimo de dinheiro para se sustentar, e o cantor que toca na noite em barzinhos esperando que o público pague o couvert artístico, que será, ao final do show o seu cachê? Provavelmente apenas o que é oferecido aos clientes. No final das contas, ambos estão em processo de vendas e ganhando pouco, mas na esperança de que, vendendo muito, poderá ganhar “muito” dinheiro, no fim do mês. Caso algum curioso quisesse saber o que poderia ser usado como exemplo de um profissional liberal, da livre iniciativa, sem qualquer tipo de apoio do Estado e sem direitos trabalhistas (o mundo maravilhoso do anarcocapitalismo), esses seriam os casos perfeitos para análise. Então, vamos abordar sobre esse trabalhador guerreiro, injustiçado e pouco falado que é, o conhecido cantor de barzinho, voz e violão.

    Bares, casas noturnas, restaurantes, todos eles, que oferecem para a sua clientela os shows voz e violão, ou mesmo aqueles lugares que abrem espaços pra bandas, são os locais de trabalho dos artistas da música, seus empregos, seus trabalhos liberais, a salvação para se sustentarem. Há aqueles músicos que se apresentam na rua, apenas dependendo de algum transeunte de bom coração lhe deixar alguma moeda no seu chapéu (esses sim muito mais parecidos com os típicos camelôs). Mas usar os artistas que se apresentam em locais fechados já serve para análise.

    Conseguir tocar o repertório de acordo com o público presente é a meta para ser aceito, ganhar a admiração dos que lhe assistem, assim como, agradar o dono do local para que ele seja chamado para outras ocasiões, e quem sabe, se tornar o artista fixo dos dias de música ao vivo. Nessa última etapa é como um clímax para os cantores voz e violão, pois tocar toda a semana, e ainda mais se for em vários locais diferentes, é quase como arranjar um emprego (porém sem CLT). Finalmente, para se ter realmente lucro nesse tipo de trabalho, é necessário que haja bastante shows no mês, e ele é quantificado e qualificado ao término dos 30 dias, e aí sim, o artista irá saber se houve benefícios ou perdas.

    Quanto aos problemas enfrentados pelos camelôs, como as tentativas de criminalização do seu trabalho, alegando coisas do tipo “eles não pagam impostos”, como se isso fosse uma prerrogativa apenas deles (sabemos dos privilégios dos milionários e das igrejas nas isenções fiscais). Sendo alvos fáceis e sem qualquer tipo de auxílio por parte do poder público e da mídia tradicional, é comum ver a polícia e a guarda municipal perseguindo e agredindo, a ponto de levarem sua mercadoria, dando mais prejuízo a uma classe que é naturalmente pobre ao extremo.

    Mas isso não acontece com os cantores de voz e violão, certo? Mais ou menos. Se não tomar cuidado, isso pode se expandir a ponto de chegar nos artistas da música. Há casos menores que poderiam servir de estopim para uma possível crise maior no futuro. Um exemplo, são as proibições de shows ao vivo em quiosques, em cidades praianas, como Rio de Janeiro, capital ou em João Pessoa, na Paraíba. Moradores desgostosos com a vida, mas que possuem vínculos com autoridades judiciais na cidade que conseguem juridicamente embargar os eventos, com a desculpa de que “há poluição sonora”. A ironia é que, essas ações arbitrárias partem de setores que vivem reclamando da economia, mas não percebem que, impedindo o trabalho dos músicos, eles estão diretamente afetando a economia negativamente, gerando a desocupação dos trabalhadores da música, além de esmorecer os turistas que tem nas apresentações, mais uma forma de distração e entretenimento ao visitar a cidade. E mais um ponto importante a ser dito, é que, para que o ato da proibição dos shows voz e violão seja legítimo, é necessária uma consulta pública, um plebiscito, ou algo do tipo; ou seja, essas ações que vemos são típicas de ditaduras locais, onde meia dúzia decide o que é certo e errado, em detrimento da maioria.

    Em vista disso, é significativo considerar a relevância dessa comparação por alguns motivos, desde uma simples análise socioeconômica, relacionado a política nacional, a forma como a arte é vista pela população, etc, além de ver que, existe uma divisão conveniente na visão dos trabalhadores liberais, jogando os camelôs na marginalidade, e enaltecendo a classe média como “livre iniciativa”, mas ao mesmo tempo, mostrando e alertando aos cantores e instrumentistas, que em pleno 2023, ainda têm em mente preconceitos sociais, de que, por serem artistas, eles estão acima dos demais trabalhadores, no sentido intelectual, estético, subjetivo, e descobrindo que, temos que nos acostumar a enxergar as coisas enquanto classe, pois, para as elites, cantor voz e violão e camelô são a mesma coisa.  

     

    * Este é um artigo de opinião, de responsabilidade do autor, e não reflete a opinião do Brasil 247.

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